Porto
(1918-2012)
Cortesia de wikipedia e jdact
«Autêntico mito vivo da filosofia portuguesa, autora de uma das mais
impressionantes obras emergidas a partir da década de 70, desenvolvendo uma
reflexão poético-filosófica de carácter intensamente lírico e espiritualizante,
numa linha de continuidade com as obras dos seus mestres portuenses Teixeira de
Pascoais e Leonardo Coimbra, criadora de um auréola de suspensivo enigma em
torno da sua escrita num barroquismo de linguagem que, habitualmente, envolve e
prende a consciência do leitor numa bruma conceptual misteriosa, elevando-o a
alturas celestiais, Dalila Pereira é, hoje, à entrada do século XXI, após a
morte de Agostinho da Silva, Natália Correia e António Quadros, e a deriva
radical de António Telmo para o esoterismo puro, a grande representante da
tradição espiritualista e providencialista do pensamento português. Estamos
certos de que a sua obra marcará abundantes investigações filosóficas ao longo
do século XXI como Sampaio Bruno tem marcado fortemente uma específica linha da
cultura portuguesa ao longo do século XX.
Possuindo traços teóricos comuns com a filosofia do último António
Quadros (das décadas de 80 e 90), a obra de Dalila Pereira distingue-se da
filosofia deste autor, não no fundo matricial de levantamento dos “arcânos” do pensamento português
(filiação mediterrânica e atlântica da herança religiosa e espiritual de povos
megalíticos, ‘franciscanismo’ espiritual da teoria ‘joaquimita’ da Terceira
Idade do Mundo, teses ‘templaristas’ da escolha divina de Portugal como país
eleito, teses proféticas de padre António Vieira, Bandarra e Pessoa sobre o V
Império, tese ‘pascoalina’ da saudade como máxima expressão do sentimento, da
história e do pensamento portugueses), mas na sua vivência e expressão
estilística, isto é, na expressão mística e espiritual subjacente ao conteúdo
dos seus livros, muito diferente dos parágrafos paciente e explicativamente
racionais de Portugal. Razão e Mistério. Diferentemente, os livros de
Dalila Pereira são intuitivamente sentidos e apreendidos através de uma
comunidade espiritual espontaneamente criada entre a autora e o leitor, que,
comungando do seu conteúdo, sente-se partilhar de uma vasta teia de conceitos
expressos poeticamente, ora em parágrafos densos e reflexivos, ora leves e
ascéticos. Assim, uns livros mais historicista, outros mais espiritualizante, a
verdade é que não existe evolução no pensamento de Dalila, que permanecerá fiel
às intuições expressas num dos seus primeiros livros, A Força do Mundo,
de 1972, com a autora perfazendo já 53 anos:
Para além de todos os sistemas filosóficos que se opõem, o saber
místico é, através das idades, um vasto e constante desenvolvimento duma só
verdade: a verdade que poderá ser atingida apenas ‘através duma experiência
imediata, como a que a mística concede’. Chegada tarde à autoria filosófica,
depois de uma prolongada paragem após a conclusão do curso de
Histórico-Filosóficas em Coimbra, e de uma permanência na Bélgica e no Brasil,
o seu primeiro texto é justamente publicado no estrangeiro, na revista Esprit,
em 1970. Porventura devido à sua ausência no estrangeiro, a autora escapou
tanto às inúmeras polémicas nacionalistas e políticas que envolveram o grupo da
“Filosofia Portuguesa” ao longo da década de 1960, como à padronização do
cânone poético erigido em torno da obra de Fernando Pessoa, permitindo-se,
depois de Agostinho da Silva, este segundo uma orientação mais mítica, desvelar
uma outra faceta de Pessoa, a esotérica. Deste modo, em A Força do Mundo
e, depois, em 1976, 1977 e 1978, datas das publicações dos seus textos sobre a
saudade, em Introdução à Saudade, antologia editada pelo autor em
colaboração com Pinharanda Gomes, A Nova Atlântida e A Nau e o Graal,
respectivamente, a autora desvela-nos a história mítica portuguesa num estilo
poético-profético fronteiro ao estilo das conferências de Teixeira de Pascoais
sobre a “raça lusíada” e a “saudade” publicadas na “Renascença Portuguesa”, sessenta anos
antes, intertextual e historicamente, o leitor sente-se projectado para a
segunda década do século XX, como se Pascoais tivesse ressuscitado e usasse
para efeitos de publicação o pseudónimo de “Dalila Pereira da Costa”.
Referimo-nos às conferências de Pascoais como O Espírito Lusitano ou o
Saudosismo (1912), A Era Lusíada (1913) e o Génio Português – Na
sua Expressão Filosófica, Poética e Religiosa (1913). Não apenas o estilo
poético-profético é o mesmo, como o envolvimento ideológico profundamente
patriótico é exactamente o mesmo, como, igualmente, a selecção temática e o
desenrolamento histórico são os mesmos, com o acrescentamento, por parte de
Dalila Pereira, da herança mitológica pré-ariana da cultura portuguesa, que
Pascoais não refere. Não admira, assim, que a autora tanto se considere
herdeira do espírito da Renascença Portuguesa quanto aceite a existência de um
fillum mental unindo os dois grandes autores do Porto da primeira metade do
século XX, Teixeira de Pascoais e Leonardo Coimbra, à sua própria obra enquanto
sintoma de renascimento espiritual de Portugal neste século, ainda que,
modestamente, não ser digna dessa herança». In Dalila Pereira da Costa,
A História Mítica da Cultura Portuguesa, Wikipedia.
continua
Cortesia de Wikipedia/JDACT