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In Memoriam de MLAC e JLT
Ser
Cansada expectativa tão ansiosa
que ser só eu na minha vida espalha!
Na longa noite em que se tece a malha
do que não serei nunca, fervorosa.
Minha presença rútila e curiosa
arde sombria como um arder de palha,
curiosa apenas de saber se goza
o voar das cinzas quando o vento calha.
Lá onde o levantá-las é verdade.
Inutilmente se mistura tudo,
que a mesma ansiedade, já esquecida,
de novo recomeça. Mas quem há-de
contrariá-la? Eu não, que não me iludo:
viver é isto, quando se é só vida.
Jorge de Sena, in 'Post-Scriptum'
que ser só eu na minha vida espalha!
Na longa noite em que se tece a malha
do que não serei nunca, fervorosa.
Minha presença rútila e curiosa
arde sombria como um arder de palha,
curiosa apenas de saber se goza
o voar das cinzas quando o vento calha.
Lá onde o levantá-las é verdade.
Inutilmente se mistura tudo,
que a mesma ansiedade, já esquecida,
de novo recomeça. Mas quem há-de
contrariá-la? Eu não, que não me iludo:
viver é isto, quando se é só vida.
Jorge de Sena, in 'Post-Scriptum'
Bom e Expressivo
Acaba mal o teu verso,
mas fá-lo com um desígnio:
é um mal que não é mal,
é lutar contra o bonito.
Vai-me a essas rimas que
tão bem desfecham e que
são o pão de ló dos tolos
e torce-lhes o pescoço,
tal como o outro pedia
se fizesse à eloquência,
e se houver um vossa excelência
que grite: — Não é poesia!,
Diz-lhe que não, que não é,
que é topada, lixa três,
serração, vidro moído,
papel que se rasga ou pedra que rola na pedra...
Mas também da rima «em cheio»
poderás tirar partido,
que a regra é não haver regra,
a não ser a de cada um,
com sua rima, seu ritmo,
não fazer bom e bonito,
mas fazer bom e expressivo...
Alexandre O'Neill, in 'De Ombro na Ombreira'
mas fá-lo com um desígnio:
é um mal que não é mal,
é lutar contra o bonito.
Vai-me a essas rimas que
tão bem desfecham e que
são o pão de ló dos tolos
e torce-lhes o pescoço,
tal como o outro pedia
se fizesse à eloquência,
e se houver um vossa excelência
que grite: — Não é poesia!,
Diz-lhe que não, que não é,
que é topada, lixa três,
serração, vidro moído,
papel que se rasga ou pedra que rola na pedra...
Mas também da rima «em cheio»
poderás tirar partido,
que a regra é não haver regra,
a não ser a de cada um,
com sua rima, seu ritmo,
não fazer bom e bonito,
mas fazer bom e expressivo...
Alexandre O'Neill, in 'De Ombro na Ombreira'
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