sábado, 12 de janeiro de 2013

D. João II vs Colombo. José M. Garcia. Duas Estratégias divergentes na busca das Índias. «As informações de Conti sobre o Oriente foram também utilizadas no mapa-mundo começado em 1457 pelo cartógrafo veneziano Fra Mauro e concluído em 1459 com a colaboração de Andrea Bianco, obra que foi iluminada por Francesco de Cherso»

jdact

«Estes embaixadores do rei de Portugal que então tinham chegado a Florença vinham saudar o cardeal Jaime de Portugal, em cujo séquito se encontrava Fernando Martins, que está registado no testamento do mesmo cardeal Jaime, que ali veio a falecer a 27 de Agosto de 1459. Fernando Martins (de Reriz) nasceu em 1423,pois em 1483 tinha 60 anos, pelo que, nos momentos nevrálgicos da sua vida que aqui consideramos, tinha 36 anos em 1459 e 51 anos em 1474. Dele sabemos que foi mestre em Artes e Medicina, além de bacharel em Teologia, tendo vivido muitos anos em Itália onde foi familiar ou criado do cardeal Jaime, com quem estava em 1459, tendo ainda sido médico e familiar do cardeal, filósofo e cientista Nicolau de Cusa (1405-1464), de cuja renovação do testamento a 6 de Agosto de 1464 foi testemunha, juntamente com o seu amigo Toscanelli.
As indicações iniciais da carta escrita a 25 de Junho de 1474 por Toscanelli apontam para a realização do colóquio em Florença em Julho de 1459, no qual se trataram de assuntos relativos à via mais rápida para chegar às Índias das especiarias, constituindo-se assim um dos elos mais esclarecedores ligados aos embrionários projectos henriquinos para chegar a Índias que podiam ser não apenas as etiópicas mas também locais mais longínquas onde havia especiarias, as quais são apontadas por Toscanelli como sendo as procuradas pelos portugueses.
No sentido de equacionarmos de forma adequada a problemática aqui considerada é necessário atentar desde início e com todo o cuidado na valorização e esclarecimento da afirmação que motiva e introduz a matéria tratada na carta de Toscanelli:
  • Cum tecum allias locutus sum de breviori via ad loca aromatum per maritimam navigacionem quam sit ea quam facitis per guineam que traduzimos: Falei contigo em outras ocasiões acerca de um caminho mais rápido para chegar aos lugares da especiaria por navegação marítima do que aquele que fazeis pela Guiné.
Esta declaração revela-nos que estamos perante um assunto que não era novo em 1474, pois já havia sido abordado em outras ocasiões em que Fernando Martins e Toscanelli falaram acerca de um caminho mais rápido para chegar aos lugares da especiaria. É por isso que foi utilizado o recurso ao plural para se aludir a que tinham acontecido vários momentos em que esse debate surgira. Um desses momentos foi aquele que ocorrera quinze anos antes, em Julho de 1459.
As informações de Conti sobre o Oriente foram também utilizadas no mapa-mundo começado em 1457 pelo cartógrafo veneziano Fra Mauro e concluído em 1459 com a colaboração de Andrea Bianco, obra que foi iluminada por Francesco de Cherso. Este trabalho foi encomendado em 1456 através de João Fernandes Silveira, embaixador português que a 4 de Fevereiro deste ano esteve em Veneza a tratar da participação portuguesa na cruzada contra os turcos, que então se estava a organizar.
O mapa aqui em causa foi solicitado oficialmente por Afonso V mas certamente a pedido do infante Henrique, pois não há registo de que o rei se interessasse por problemas geográficos que ultrapassem os relacionados com o seu empenho em conquistar Marrocos, receber alguns proventos dos negócios da Guiné dirigidos pelo tio e participar na cruzada que chegou a ser prevista em 1456. A sugestão para a realização desta encomenda cartográfica a Fra Mauro poderia ter vindo de Cadamosto ou Patrizio di Conti que se encontravam próximo do infante, pois não seria natural que este conhecesse aquele cartógrafo, a quem não chegaria sem uma recomendação daqueles venezianos das suas relações entre 1454 e 1456». In José Manuel Garcia, D. João II vs Colombo, Duas Estratégias divergentes na busca das Índias, Quidnovi, 2012, Vila do Conde, ISBN 978-989-554-912-2.


continua
Cortesia de Quidnovi/JDACT