quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Devisme, Monserrate e o Romantismo. José Augusto França. «Estar nas boas graças de Pombal era evidentemente algo de importante e algo de rentável, o que explica a fortuna que ele fez, certamente também com outros negócios que se juntaram a esse, e a possibilidade de fazer duas grande casas nos arredores de Lisboa»


jdact e cortesia de wikipedia

Devisme, Monserrate e o Romantismo
«Se sabemos algo de Monserrate e muito do Romantismo, sobre Devisme pouco se sabe.
Uma coisa que se sabe, e é importante de certeza, é de que ele foi hóspede e locatário do Palácio do Marquês de Pombal na Rua Formosa, hoje Rua do Século, que ainda lá está, e onde ele se instalou com um sócio, David Pury, um marchante de Neuchâtel, um suíço portanto, e que com ele tinha a casa bancária Pury, Mellish & Devismes. Muito conhecido na Suiça, onde tem um monumento pedestre na sua cidade, da qual é considerado uma figura ilustre, Pury deve essa notoriedade ao facto de ter doado bastante bens a Neufchatel, bens esses ganhos em Portugal. Quando morreu, em 1786, foi sepultado no Cemitério Inglês, junto ao Jardim da Estrela, aqui em Lisboa, onde ainda se encontra a sua tumba. De resto, esta associação dos dois deixou um testemunho artístico no famoso quadro à glória de Pombal, encomendado em Paris a um dos principais retratistas das corte, Van Loo, em que se vê o Marquês com Lisboa ao fundo, alusão à reconstrução pós–terramoto e ao seu poder Devisme, que será de nome próprio Gerard à francesa ou Gerald à inglesa, tem um brasão que, tal como aparece quer na Enciclopédia Portuguesa-Brasileira quer a Enciclopédia Verbo, é tipicamente inglês, com uma asna, ou chevron, abundante na heráldica inglesa, raro na francesa e ausente da portuguesa. Este Devisme, com um nome de família todo junto mas que é de origem francesa concerteza, seja lido integralmente à inglesa ou ‘Devi’me’ à francesa, provém claramente de uma família huguenote, protestante, que se expatriou, como muitas outras, por razões religiosas, e é de origem nobre, como se adivinha na partícula, de Visme, que se manteve, como é hábito também e até por um certo preceito de uso francesa da sílaba tónica (razão pela qual não dizemos ‘de Montherlant’ mas apenas ‘Montherlant’, e não unicamente ‘Visme’ mas ‘de Visme’).
O que se sabe de positivo é que ele foi, (teve um monopólio de pau brasil), um riquíssimo monopólio de importação de madeiras exóticas vindas do Brasil e isso significa de certeza boas relações de apaniguado com o todo poderoso Marquês de Pombal e esse monopólio começa em 1760, logo a seguir ao terramoto, em plena Reconstrução de Lisboa. Estar nas boas graças de Pombal era evidentemente algo de importante e algo de rentável, o que explica a fortuna que ele fez, certamente também com outros negócios que se juntaram a esse, e a possibilidade de fazer duas grande casas nos arredores de Lisboa, esta de Monserrate (que não é esta!) e a de S. Domingos de Benfica que existe ainda, embora com certas transformações, e sobre a qual toda a história de arte se tem debruçado porque mais significativa do que esta outra desaparecida.
Mais significativa porque é um palácio de médio porte com três corpos, grandes jardins, grandes fábricas nos jardins, como se dizia então, de pequenas construções, fontes e de estatuária de chumbo que se importou de Inglaterra naquela altura, e esse palácio foi vendido, depois da sua morte, ao Marquês de Abrantes, e o Marquês de Abrantes que era senhor de uma casa muito poderosa nessa altura e que depois se arruinou, vendeu-o à Infanta Isabel Maria, regente de Portugal, irmã de Pedro I e Miguel, regente mais ligada ao mano Pedro do que ao mano Miguel, e que ali se instalou com uma pequena corte, dando-lhe um porte e um carácter aúlico, e temos a sorte de a posterior transformação em colégio de meninas o ter conservado, continuando assim em S. Domingos de Benfica, perto do célebre palácio dos Fronteiras e do convento do mesmo nome. Temos também a sorte de ter a imagem do edifício tal qual era na altura, uma excelente pintura que está no Museu das Artes Decorativas de Paris feita por Noël, pintor francês que viveu em Portugal e alguma coisa aqui trabalhou, e que fixou relações com a aristocracia ou a gente dinheirosa da época. É por tudo isto que é sobre ela que geralmente cai a atenção dos historiadores de arte. Sabemos que o seu arquitecto foi Inácio de Oliveira Bernardes, um homem que vem de uma família de azulejistas, mas que fez alguma arquitectura, de alguma qualidade média se bem que de qualquer maneira o modelo não é português, é de gosto inglês, um modelo para festas e jardins.
De resto, foi tal a fixação sobre esta casa que quem consultar uma enciclopédia como a Luso-brasileira, poderá aprender lá que o arquitecto de Monserrate foi Inácio Oliveira Bernardes, o que é um disparate. Também lá se diz outro, que foi em Monserrate que foi escrito o célebre romance Vathek de Beckford. Ora quando este viveu em Monserrate já tinha escrito o Vathek há meia dúzia de anos, em Inglaterra naturalmente, pelo que este é um disparate acronológico. Este erro pode vir de uma leitura errónea de um verso de Lord Byron, no qual ele saúda Beckford, em Monserrate, como pai do Vathek. Certo é que Devisme, Beckford e por arrastamento Lord Byron, são feitores do romantismo sintrense.



Quanto à casa, quanto a Monserrate, podemos dizer que as terras pertenciam ao Hospital Real de Todos os Santos, que elas foram parar, parte delas, às mãos da família Mello e Castro, mais tarde Nova Goa (condes), e foi a ela que o negociante Devisme de Lisboa, trazido aqui sabe-se lá porquê ou por quem, talvez por um outro negociante de Lisboa, também cônsul da Holanda, Daniel Guilmeester , que está ligado a uma outra casa perto daqui, Seteais, e que, beneficiário do contrato do monopólio de diamantes e fazendo parte da pequena elite da economia pombalina, manteria com ele relações próximas e foi certamente ele que mostrou então a Devisme a bela serra de Sintra». In José Augusto França, Wikipédia.

Cortesia de Wikipédia/JDACT