«Para além de Teixeira Gomes e de Ferro, outras vozes falavam da emancipação feminina se recolhermos os
exemplos dos jornais e revistas que chegavam ao universo feminino burguês. Eram
muitos os jornais e revistas que se dedicavam a um público feminino. Desde O
Jornal da Mulher de Albertina Paraíso que saiu em 1910, com rubricas em
francês, a subentender que as leitoras já saberiam na sua maioria ler a língua
de Victor Hugo, em Choses et Autres e Paris-Nouvelles. Em 1910 como nos anos 20,
em final do século como no princípio dos anos 30, as rúbricas em francês
inseriam-se num certo gosto seleccionado de classe, de casta mesmo, que fazia parte
do chic.
A França era a pátria da moda e do bom gosto. O cinema, apesar de importado da
América, não bastava para alterar os hábitos de consumo da cultura e dos
costumes franceses.
Moda Elegante, Enciclopédia da Mulher em 1917, A
Rainha da Moda em 1922-23, Eva a partir de 1925, esta revista
com grande difusão, Revista Feminina em 1926, Vida Elegante em 1926, A
Mulher em 1927, Voga a partir de 1927, também com
uma larga difusão no universo feminino, Vida Mundana a partir de 1914 e, sobretudo,
a Ilustração
Portuguesa a partir de princípios do século, são as revistas que se detectaram
com maior audiência.
Alguns exemplos antes de procedermos a uma análise detalhada das
influências estrangeiras em a Voga, a Eva e a Ilustração
Portuguesa. Por vezes a importância de um romance francês ia ao ponto
de se recomendarem condutas, de se acertarem comportamentos. O livro de Marcel
Prévost, Les anges gardiens, era encarado como a prova de que as
preceptoras poderiam ter um efeito pernicioso nas jovens filhas de família, em O
Jornal da Mulher. Também, no caso da educação feminina se citava
Condorcet, teórico iluminista do século XVIII.
Na Ilustração Portuguesa era usual fazerem-se descrições muito
pormenorizadas das peças que com mais êxito se apresentavam em Paris. Em 1913 Bagatelle
de Paul Hervieu fazia sensação com a análise de um triângulo amoroso numa média-alta
classe burguesa da sociedade francesa. As considerações da Ilustração Portuguesa não
se fazem esperar. Na Bagatelle, o drama passa-se entre uma mulher superiormente
honesta e uma outra amorosa e fraca, que sofrem durante três actos os apetites,
as hipocrisias, a velhacaria de dois pulhas. A novidade, porventura, não
estará na temática, que apesar de ousada para a época, não era alheia à ficção
portuguesa, tendo em conta a obra de
Abel Botelho, na sua enciclopédica Patologia Social. A novidade
encontra-se no modo como se desculpabiliza a mulher, ou porque é fraca nas suas
paixões terrenas ou porque é honesta. E este posicionamento francamente liberal
denuncia uma visão mais progressiva do que aquela que os romances, também de
origem francesa e de maior divulgação entre as senhoras, suporiam». In
Cecília Barreira, História das Nossas Avós, Retrato da Burguesa em Lisboa
(1890-1930), Edições Colibri, Colecção Sociedade & Quotidiano, 1994, ISBN
972-8047-63-0.
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