domingo, 20 de janeiro de 2013

História das Nossas Avós. Retrato da Burguesa em Lisboa (1890-1930). Cecília Barreira. «Na “Ilustração Portuguesa” era usual fazerem-se descrições muito pormenorizadas das peças que com mais êxito se apresentavam em Paris. Em 1913 “Bagatelle“de Paul Hervieu fazia sensação com a análise de um triângulo amoroso…»


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«Para além de Teixeira Gomes e de Ferro, outras vozes falavam  da emancipação feminina se recolhermos os exemplos dos jornais e revistas que chegavam ao universo feminino burguês. Eram muitos os jornais e revistas que se dedicavam a um público feminino. Desde O Jornal da Mulher de Albertina Paraíso que saiu em 1910, com rubricas em francês, a subentender que as leitoras já saberiam na sua maioria ler a língua de Victor Hugo, em Choses et Autres e Paris-Nouvelles. Em 1910 como nos anos 20, em final do século como no princípio dos anos 30, as rúbricas em francês inseriam-se num certo gosto seleccionado de classe, de casta mesmo, que fazia parte do chic. A França era a pátria da moda e do bom gosto. O cinema, apesar de importado da América, não bastava para alterar os hábitos de consumo da cultura e dos costumes franceses.
Moda Elegante, Enciclopédia da Mulher em 1917, A Rainha da Moda em 1922-23, Eva a partir de 1925, esta revista com grande difusão, Revista Feminina em 1926, Vida Elegante em 1926, A Mulher em 1927, Voga a partir de 1927, também com uma larga difusão no universo feminino, Vida Mundana a partir de 1914 e, sobretudo, a Ilustração Portuguesa a partir de princípios do século, são as revistas que se detectaram com maior audiência.
Alguns exemplos antes de procedermos a uma análise detalhada das influências estrangeiras em a Voga, a Eva e a Ilustração Portuguesa. Por vezes a importância de um romance francês ia ao ponto de se recomendarem condutas, de se acertarem comportamentos. O livro de Marcel Prévost, Les anges gardiens, era encarado como a prova de que as preceptoras poderiam ter um efeito pernicioso nas jovens filhas de família, em O Jornal da Mulher. Também, no caso da educação feminina se citava Condorcet, teórico iluminista do século XVIII.
Na Ilustração Portuguesa era usual fazerem-se descrições muito pormenorizadas das peças que com mais êxito se apresentavam em Paris. Em 1913 Bagatelle de Paul Hervieu fazia sensação com a análise de um triângulo amoroso numa média-alta classe burguesa da sociedade francesa. As considerações da Ilustração Portuguesa não se fazem esperar. Na Bagatelle, o drama passa-se entre uma mulher superiormente honesta e uma outra amorosa e fraca, que sofrem durante três actos os apetites, as hipocrisias, a velhacaria de dois pulhas. A novidade, porventura, não estará na temática, que apesar de ousada para a época, não era alheia à ficção portuguesa, tendo em conta a obra de Abel Botelho, na sua enciclopédica Patologia Social. A novidade encontra-se no modo como se desculpabiliza a mulher, ou porque é fraca nas suas paixões terrenas ou porque é honesta. E este posicionamento francamente liberal denuncia uma visão mais progressiva do que aquela que os romances, também de origem francesa e de maior divulgação entre as senhoras, suporiam». In Cecília Barreira, História das Nossas Avós, Retrato da Burguesa em Lisboa (1890-1930), Edições Colibri, Colecção Sociedade & Quotidiano, 1994, ISBN 972-8047-63-0.

Cortesia de E. Colibri/JDACT