«É possível imaginar hoje um encontro de culturas no século XVI? Talvez
esse exercício seja mais fácil de efectuar, depois da leitura atenta do
presente livro. O fascínio e o mistério devem ter sido elementos fundamentais
no contacto mantido entre os embaixadores Japoneses e o duque de Bragança,
Teodósio II. E desse encontro que iremos falar nas próximas linhas. A história
dos Quatro Legados da Era Tenshô
e a sua passagem por Vila Viçosa sempre exerceu um elevado fascínio. Os seus
nomes, os locais por onde passaram nesta localidade e relação que mantiveram
com Teodósio II despertaram, um grande interesse na recolha de informações mais
detalhadas que permitissem compreender as razões da presença na bela Callipole
dos jovens japoneses. O trabalho resulta dum conjunto de investigações
desenvolvidas no Museu-Biblioteca da Casa de Bragança sobre a visita dos embaixadores
Japoneses à corte do duque Teodósio II. Com este objectivo, foram analisadas
duas obras essenciais para a interpretação dos motivos que terão estado na
origem da visita a Vila Viçosa, nomeadamente o Diálogo sobre a missão dos embaixadores
japoneses à Cúria romana da autoria de Duarte Sande e o Tratado dos embaixadores japões que foram do
Japão a Roma no ano de 1582, de Luis
Frois.
Constituindo duas obras de referência sobre esta temática, o objectivo
definido na análise que foi desenvolvida baseou-se na identificação dos
possíveis motivos que estiveram na origem na deslocação a Vila Viçosa e na forma
como foram recebidos pelo duque de Bragança Teodósio II. O relato magistral da
viagem, escrito pelo padre Luís Frois e o diálogo composto em Macau pelo padre
Duarte Sande, sob inspiração de Alessandro Valignano, serviram de base a
inúmeros livros e artigos e inspiraram também estas linhas.
A investigação desenvolvida ao longo de quase dois anos de trabalho
tentou apurar os factos que terão estado na origem da visita dos embaixadores
Japoneses à corte sediada em Vila Viçosa. Terá
sido uma mera visita de cortesia? Terá havido objectivos políticos, religiosos ou económicos neste inusitado encontro
cultural? Que interesses poderão ter tido como consequência uma recepção digna de monarcas ou altos representantes
estatais?
A pesquisa que foi efectuada origina várias hipóteses, no sentido em
que a corte brigantina, fortemente influenciada por valores humanistas, teria
todo o interesse em promover e explorar este encontro cultural entre duas
civilizações distintas. O que é incontornável é o facto de que Vila Viçosa se encontra
em igualdade de circunstâncias com outras grandes capitais europeias, como
local escolhido pelos Jesuítas para enaltecer os valores cristãos e humanistas
do duque de Bragança e a sua importância no contexto ibérico. Entendemos que
não terá sido por mero acaso ou por razões de carácter logístico que a corte de
Teodósio II foi escolhida como ponto de passagem para a comitiva japonesa.
O facto dos duques de Bragança procurarem, nas suas estratégias, visar,
sobretudo, a consolidação e a manutenção das posições sociais e políticas
entretanto adquiridas no espaço nacional, também poderá justificar a vinda dos ilustres
visitantes japoneses a Vila Viçosa. Durante este período histórico em concreto,
são notórias as tentativas de D. Catarina, viúva do 6º duque, João I, em conseguir
obter, junto do seu primo Filipe II de Espanha, I de Portugal, direitos régios
juridicamente alienáveis, tais a perseguição de bens simbólicos, o jogo de
alianças matrimoniais e dos privilégios de tratamento, de modo a garantir um
estatuto social impar para a Casa, não só no contexto português, mas também no
ibérico.
Não é fácil encontrar uma resposta objectiva sobre este tema. O que é
um facto concreto é que os embaixadores japoneses ficaram, segundo todas as
crónicas, absolutamente surpreendidos pela riqueza e pela opulência da Casa de
Bragança, manifestada materialmente através do seu Paço Ducal e do seu conteúdo
decorativo. Na realidade, o Paço era um lugar institucional de promoção e
consolidação de poder. A importância de Vila Viçosa, com a presença dos duques
e da sua corte desde 1502, é
atestada pela nova carta de foral dada por Manuel I em 1512 e que classificava a Vila como um dos lugares principaes do
reino». In Tiago Salgueiro, Do Japão para o Alentejo, A Embaixada Tenshö em
Vila Viçosa no ano de 1584, A Jornada Espiritual dos 4 samurais japoneses na
Callipole de quinhentos…, Chiado Editora, 2012, ISBN 978-989-697-670-5.
Cortesia de Chiado E./JDACT