«O objectivismo
absorvente e a sujeição às regras do neoclassicismo serão postos de lado para
dar lugar a um espírito individualista, caracterizado pela exaltação da própria
personalidade do poeta romântico.
NOTA: A liberdade se
manifestou em todos os sentidos: liberdade política, a vontade do rei deixou de
ser soberana para o romântico; liberdade moral, a norma de moralidade não é
construída pelos ditames da razão, muito menos pelas crenças religiosas, apesar
de reconhecer a necessidade afectiva de Deus e da religião; liberdade nos
sentimentos, o romântico deixava-se arrastar pelas emoções violentas.
Um das formas mais
comuns do ponto de vista temático consiste em evadir-se no tempo e no espaço,
refugiando no sonho e na fantasia, na orgia
e na dissipação como forma de se evadir da sua angústia metafísica resultante
do choque com a realidade concreta, uma vez que o romântico não está isento de
espírito idealista. Por outro lado, a literatura romântica promove a exaltação
do que é nacional, mas de raiz popular, não aristocrática, adquirindo um
carácter cívico e patriótico, que tende a enveredar para o historicismo onde as
figuras nacionais são tratadas com muito carinho. A concepção propriamente
romântica, procura discernir as dissemelhanças entre os povos, destacando-as
mesmo como formas de expressão de qualidades intrínsecas e determinantes da
fisionomia de cada conjunto. Mas sem que de um modo geral e directo isso
implique num enfoque negativo, deformador ou preconceituoso em relação a outros
grupos, pois são justamente estas diferenças singulares que fazem da existência
e da contribuição de cada organismo nacional uma componente única e
complementar no processo humano.
E esse individualismo
que vai assim surgindo, e que daremos a devida atenção no nosso trabalho, é
muito importante porque leva, por um lado, a uma análise de tudo e, por outro
lado, a uma caracterização cada vez mais pormenorizada, deixando de sublinhar o
típico na arte para salientar o elemento característico, isto é, o que
qualifica o ser dentro do contexto social e nacional. Esse individualismo
constitui por certo uma grande mudança de enfoque no campo literário,
aproximando de certo maneira o gosto do Romantismo da perspectiva realista,
porque o romântico já se coloca numa óptica que divisa o indivíduo dentro de
seu habitat sócio-histórico.
Superar as dissociações
da cultura, transpor as divisões sociais, saltar por cima das particularizações
geo-históricas serão, na perspectiva romântica, as vias de acesso ao estado
natural do homem, à sua inocência idêntica. Procuraremos ver como a aspiração romântica,
na sua busca da unidade, elementar, não se detém nas projecções utópicas sobre
o plano do processo sócio-cultural e mesmo antropológico. No desenvolvimento que
prossegue, ela tende a chegar às alturas da comunhão cósmica. Unir-se e
fundir-se misticamente com o universo na sua ilimitação é o sentido pleno da
grande síntese. Como o objectivo mais geral da nossa dissertação é a análise do
romantismo como estética promotora da individualidade e da identidade nacional,
tentaremos demonstrar como o romantismo se manifesta na literatura são-tomense.
Evidenciaremos também as marcas que apontam que a literatura do país tem uma
história que já vem do séc. XIX.
Sendo que o autor em
estudo, Costa Alegre, foi um poeta
muito inspirado, de grande qualidade, e que representa muito bem o seu tempo
romântico e que explora também, e muito bem, o romantismo na afirmação de si,
da sua identidade negra sem complexos, bem como a crítica vigorosa das ideias
racistas nascentes, evidenciaremos nos poemas a serem analisados, as
características mais marcantes desse movimento literário presente na sua
poesia. Para a efectivação da nossa dissertação, começaremos pelo mais geral,
por fazer uma breve contextualização histórica das Ilhas Maravilhosas, desde
o descobrimento, o povoamento, o surgimento da burguesia local, a sua ascensão
e a decadência dessa sociedade no século XIX, o papel que desempenhava, a
introdução do ensino e o papel da missionação neste processo, etc.
Visão
Vi-te passar, longe de mim,
distante,
Como uma estátua de ébano
ambulante;
Ias de luto, doce, tutinegra,
E o teu aspecto pesaroso e triste
Prendeu minha alma, sedutora
negra;
Depois, cativa de invisível
laço,
(o teu encanto, a que ninguém
resiste)
Foi-te seguindo o pequenino
passo
Até que o vulto gracioso e lindo
Desapareceu, longe de mim,
distante,
Como uma estátua de ébano
ambulante.
In Caetano da Costa Alegre
A estagnação económica,
política, social e cultural a que São Tomé e Príncipe esteve sujeito até ao
século XIX será também revista, tendo sempre em conta o enfoque devido à
comunidade humana que representa a cultura das ilhas. Contextualizaremos ainda,
no Portugal no século XIX, as mutações sociais, económicas, políticas e
culturais, o liberalismo, que interessam para o melhor entendimento do contexto
cultural em que Caetano da Costa Alegre
viveu e escreveu a sua obra». In Instituto Camões.
Cortesia de I.
Camões/JDACT