«Margarida sente-se impelida a tentar mais uma vez a sorte das armas. Mas,
mais uma vez também, o azar a persegue, deixando-a em ultra precária posição O
antagonista derrotara-a copiosamente na batalha de Exham, em 1464, obrigando-a novamente à fuga,
esta agora acidentada e assinalada por inesperado episódio, digno de
emocionante romance de capa e espada. Reconhecendo-se batida, a destemida soberana
pensou imediatamente na sua salvação. Lançando a montada a toda a brida,
afastou-se do campo de combate o mais depressa que lhe foi possível, sem que o
seu afastamento fosse logo notado. Caminhou para o sul, a marchas forçadas, sempre
a temer que a estivessem perseguindo e lograssem alcançá-la.
Em determinada altura, já tinha perdido o conto das horas que levava de
marcha e se convencia do bom êxito da sua evasão, eis que, de súbito, imprevistamente,
deu por si rodeada de cavaleiros, de aspecto suspeito e ameaçador. Horrorizada,
em breve adquiriu a certeza de que estava em poder de uma quadrilha de
bandoleiros, desses que devastaram as aldeias do reino e assaltavam pacíficos
caminhantes nas estradas. A rainha esforçou-se por se manter senhora dos
nervos, conseguindo em tão singular conjuntura, não se mostrar abatida ou
atemorizada.
Os bandidos preparavam-se para a despojar inteiramente dos valores que
levava, mas Margarida, boa fisionomista, escolheu, entre os larápios, aquele que
se lhe afigurou mais susceptível de se deixar manejar pela sua inteligência, e
deu-se-lhe a conhecer. O homem, que nunca tinha visto uma rainha em carne e
osso, ficou estarrecido de assombro e imediatamente se dispôs a salvá-la,
conduzindo-a a França.
Nesse meio tempo, o rei vitorioso, Eduardo de York, atrai Henrique VI à
capital da Inglaterra para o encerrar na prisão da Torre de Londres. Com o encarceramento
do infeliz Lancastre e a expatriação de Margarida de Anjou, dir-se-ia que não
havia motivos para continuar a Guerra das Duas Rosas. No entanto,
não levaria muito tempo que o conflito não recrudescesse uma vez mais, furiosamente,
devendo prolongar-se pelo século dentro, quase até ao seu final, mesmo para
além da vida dos principais protagonistas.
Eduardo IV, com o seu adversário aferrolhado e, ao que julgava, nada
mais tendo a temer, dá-se pressa em normalizar a situação oficial e consolidar
a sua posição, subtraindo o país às difíceis condições em que a dualidade de
poderes reais o havia colocado. Henrique VI foi pura e simplesmente destronado.
O novo monarca pôde finalmente, reinar sozinho, mas por pouco tempo.
Desavindo-se irreconciliavelmente com o seu valido, o conde de Warwick, este
volta-se com armas e bagagens para o campo oposto, a cujas fileiras destroçadas,
mas não extintas, a sua presença dá notável estímulo». In
Américo Faria, Dez Monarcas Infelizes, Livraria Clássica Editora, colecção 10,
Lisboa, s/d.
Cortesia de L. Clássica
Editora/JDACT