«(…) Depois destas expedições pioneiras é necessário avançar para a segunda
metade do século XI para voltarmos a ter notícia de incursões francesas em espaço ibérico. São elas
que mais nos interessam porque é nelas que se enquadra a vinda de Raimundo
e de Henrique de Borgonha para a Península. A primeira grande expedição
da segunda metade do século XI que é usualmente registada foi a de Barbastro, em 1063-1064. Jean Richard refere, no
entanto, uma outra, anterior, organizada pelo duque de Borgonha, Roberto I,
o Velho em socorro do conde de
Barcelona, Berenguer Raimundo Borel, na sequência da qual teria sido
acordado o casamento de seu filho Henrique, Le Damoiseau, com uma filha do conde de Barcelona.
A segunda expedição franca, ade Barbastro,
está melhor documentada. Na sequência da morte de Ramiro I de Aragão (1035-1063)
no cerco de Grados, o duque Guilherme VIII da Aquitânia organizou e
comandou uma grande expedição militar que penetrou no espaço ibérico e levantou
cerco a Barbastro. Nessa
expedição integraram-se outros grandes senhores como Thibaut de Semur,
conde de Chalon-sur-Saône, que veio a falecer em 1065 em Tolosa, no regresso de Barbastro,
e um contingente normando comandado por Guilherme Crespin, para além de
efetivos catalães conduzidos pelo conde de Urgel, Ermengol III. O cerco
de Barbastro, que durou
quarenta dias, foi coroado de êxito e quando o exército vitorioso se retirou a
tenência da cidade foi confiada ao conde de Urgel. A conquista de Barbastro teve uma enorme ressonância
no mundo muçulmano, tendo sido pormenorizadamente registada por Ibn Hayans.
Mas a resposta muçulmana não tardou. Logo em 1065, al-Muqtadir, rei da taifa de Saragoça, com o auxílio
de efectivos vindos de várias zonas do al-Andaluz,
conseguiu reconquistar Barbastro.
Na sua defesa viria, de resto, a falecer o conde Ermengol III.
O efémero sucesso da expedição levou vários nobres francos a permanecer
em território peninsular. Com efeito, a grande expedição de 1063-1064 ajudou a cimentar as relações
entre a Coroa de Aragão e algumas casas senhoriais de além-Pirenéus. É na sua
esteira que Félicie de Roucy, filha do conde Hildouin III de Roucy e
irmã de André de Ramerupt e de Eble de Roucy, dois nobres que participaram na
expedição de 1063-1064, acabaria por casar com o rei de Aragão, Sancho
Ramires (1063-1094), em 1071.
Depois do episódio de Barbastro,
as cruzadas transpirenaicas em solo ibérico conheceram um impulso decisivo dado
pelo papa Gregório VII (1073-1085). Em Maio de 1073, o pontífice enviou uma epístola
aos grandes senhores da cristandade,
exortando-os a participarem na cruzada
contra os sarracenos de Espanha ao lado do conde Eble de Roucy, que,
como Gregório VII esclarecia, planeava realizar uma grande expedição para
resgatar o reino de Hispânia que
pertenceu, antigamente, de direito a São Pedro.
O conde, que, como vimos já, participara na expedição de 1063-1064,
pretendia portanto regressar ao palco ibérico. O papa advertia, no entanto, que
aqueles que desejassem entrar na Península com as suas tropas, ao lado de Eble
de Roucy, deviam tomar a firme
resolução, de não abandonar as terras depois da sua conquista, numa
clara referência a situações que se tinham vivido num passado recente,
nomeadamente em Barbastro. E que apenas beneficiariam do apoio papal se tivessem
a intenção de voltar a devolver o reino aos direitos
de São Pedro. A epístola de Gregório VII ajudou a relançar as cruzadas
peninsulares, então ainda sem a concorrência,
das cruzadas do Próximo Oriente.
Em 1078, o duque de
Borgonha, Hugo I, filho de Henrique de Borgonha e de sua mulher, uma
filha do conde de Barcelona, Berenguer Raimundo I, o Curvo, organizou uma nova expedição militar francesa em apoio de
Sancho I de Aruagão (1063-1094). As fontes revelam que
terá sido conquistada uma importante cidade cujo topónimo, no entanto, foi
omitido:
O duque Hugo dos Borgonheses e muitos
outros grandes senhores da Gália prepararam uma segunda expedição à Hispânia.
[...] Chegados à Hispânia com aquele duque, tomada uma das nobres cidades da
Hispânia e devastada parte dessa região, carregaram o saque de grande valor e
regressaram a casa, levando consigo o maior número de prisioneiros. In
Petit, 1886.
». In Luís Amaral, Mário Barroca, A Condessa-rainha, Teresa, coordenação
de Ana Maria Rodrigues e Outras, Círculo de Leitores, 2012, ISBN
978-972-42-4702-1.
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