“… mas também uma súmula de
façanhas individuais, de aventuras colectivas e de dramas quase única na
história da humanidade”
Cem anos gloriosos
Um século de navegações e de descobertas. Cronologia da expansão portuguesa
«A 21 de Agosto de 1415,
João I, rei de Portugal, à cabeça de uma poderosa armada, apodera-se de Ceuta,
cidade marroquina localizada na margem sul do estreito de Gibraltar. Esta conquista
abre, na história portuguesa, o período das navegações e das descobertas. Ao
atravessar o estreito para tomar Ceuta, este monarca desencadeia uma expansão
que vai, em pouco mais de um século, levar os navegadores, comerciantes,
administradores e missionários portugueses até imensas extensões do globo.
O principal artífice desta expansão foi o infante Henrique (1394-1460),
terceiro filho de João I. Durante muito tempo, idealizou-se a sua figura,
celebrando tanto as suas virtudes e o seu espírito piedoso como o seu génio
político e os seus conhecimentos científicos. Os historiadores
contemporâneos reconduziram a dimensões mais humanas esta personalidade quase
mítica. Subsiste, porém, o facto de o Infante ter sido, até à sua morte, o
principal motor dos empreendimentos de descoberta. Era ele que tomava as iniciativas,
que assegurava a organização das expedições e que, da sua residência de Lagos,
no Algarve, vigiava a respectiva evolução.
Confiava a direcção de tais empreendimentos a homens que estavam ao seu
serviço. Graças à sua imensa fortuna e aos bens da Ordem de Cristo, de que se
tornou governador, podia subsidiar as enormes despesas que tal exigia. Foi,
portanto, a justo título que, embora, em pessoa, jamais tenha navegado, excepto
para ir a Ceuta, lhe chamaram Henrique,
o Navegador.
Madeira e Açores
Os Portugueses começaram por ocupar as ilhas adjacentes, Madeira
e Açores, que então estevam desabitadas. Coberta de grandes florestas, donde o
nome de Madeira, fora visitada a partir do século XIV. Foi redescoberta após a tomada de Ceuta, sem dúvida na Primavera de 1419. Mas apenas por volta de 1425 é que foi empreendida a sua
colonização, sob a direcção de João Gonçalves Zarco, escudeiro do infante
Henrique. Quanto ao arquipélago dos Açores, do nome de uma espécie de aves de
rapina, foi descoberto ou redescoberto, se, como alguns sustentam, também já havia
sido visitado no século XIV, à volta de 1427,
por Diogo de Silves, da casa do infante, com excepção das ilhas das Flores e do
Corvo, as mais ocidentais, que só foram reconhecidas cerca de 1452. O povoamento das primeiras ilhas
começou em 1439, sob a direcção de frei
Gonçalo Velho.
Exploração da costa de Africa até 1460
Por que razão o Infante empreendeu a exploração da costa africana? Não se poderia atribuir-lhe, nessa época
longínqua, o grande desígnio de
contornar e África para chegar à Índia. O mais provável é que, navegando o mais
longe possível para Sul, o Infante tenha querido, de algum modo, tomar Marrocos
pelo lado contrário. As primeiras expedições formavam, com a conquista de
certas praças marroquinas, uma única política.
Quando iniciou, em 1415, a
exploração sistemática da costa africana, o limite dos mares navegáveis era o
cabo Bojador, que faz bojo ou barriga.
O cabo que ainda hoje tem este nome situa-se a 26º 6' de latitude norte.
Mas, segundo alguns investigadores, o Bojador dos navegadores portugueses
era, em rigor, o actual cabo Juby,
que se encontra na costa marroquina, duzentos quilómetros mais ao norte.
Seja como for, o cabo Bojador era, para os marinheiros daquele tempo, um lugar
aterrador. Rodeado de vagas alterosas, frequentemente mergulhado nas brumas,
assinalava a entrada no Mar Tenebroso.
O alísio de nordeste sopra aí todo o ano, o que fazia pensar que quem se
aventurasse para além do Bojador jamais poderia voltar». In Lisboa e os Descobrimentos.
1415-1580. A invenção do Mundo pelos Navegadores Portugueses. Coordenação de Carlos
Araújo, Paul Teyssier, Terramar, Memórias, Lisboa, 1992, ISBN 972-710-063-5.
Cortesia de Terramar/JDACT