«E enquanto uma chora, outra ri; é a lei do mundo,
meu rico senhor; é a perfeição universal. Tudo chorando seria monótono, tudo
rindo, cansativo; mas uma boa distribuição de lágrimas e polcas, soluços e
sarabandas, acaba por trazer à alma do mundo a variedade necessária, e faz-se o
equilíbrio da vida».
«Os séculos desfilavam num turbilhão, e, não
obstante, porque os olhos do delírio são outros, eu via tudo o que passava
diante de mim, flagelos e delícias, desde essa cousa que se chama glória até
essa outra que se chama miséria, e via o amor multiplicando a miséria, e via a
miséria agravando a debilidade. Aí vinham a cobiça que devora, a cólera que
inflama, a inveja que baba, e a enxada e a pena, húmidas de suor, e a ambição,
a fome, a vaidade, a melancolia, a riqueza, o amor, e todos agitavam o homem,
como um chocalho, até destruí-lo, como um farrapo. Eram as formas várias de um
mal, que ora mordia a víscera, ora mordia o pensamento, e passeava eternamente
as suas vestes de arlequim, em derredor da espécie humana».