domingo, 13 de outubro de 2013

A Insurreição Miguelista nas Resistências a Costa Cabral (1842-1847). José Brissos. «… no sentido de promover contactos epistolares com os seus habituais correspondentes no reino, informando das disposições e objectivos do plano de Restauração que se estava a definir em Londres e Roma»

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A Montagem de uma Conspiração. Debates de Comando e Direcção
«(…) No mesmo sentido Ribeiro Saraiva propõe ao revoltoso Miguel um quadro de actuação que, perante a opinião pública portuguesa e as potências estrangeiras, fosse tomado como independente. Em caso de sucesso da Restauração uma Regência Legal assumiria o poder num primeiro momento. Ou seja, estamos perante um expediente institucional para promover o regresso de Miguel, com certas garantias.
De facto, a ideia da restauração de Miguel nunca tinha desaparecido do cenário político Português desde o seu exílio, em 1834, na sequência da Convenção de Évora Monte. A conspiração das Marnotas (1837), o Remexido e a sua difícil repressão, os receios, por vezes exagerados, de focos de agitação miguelista nas províncias do Norte, uma certa obsessão pelo problema do desembarque de Miguel e as graves perturbações da ordem moral e política do Estado, oriundas do cisma religioso, tudo isto constituíam elementos de insegurança para o Estado liberal, numa altura em que ele estava longe de dispôr de estruturas que, com eficácia, unificassem o país sob o seu domínio.
Na verdade, os esforços de resistência anti-liberal tinham-se mantido, ainda que completamente atomizados e ineficazes. Os efeitos desarticuladores da política liberal nas formas tradicionais da sociedade portuguesa, a vigilância repressiva do Estado e a ausência de uma organização conspiratória capaz de dirigir e harmonizar os meios e objectivos, tornava o perigo miguelista (à excepção do Remexido) mais aparente do que real. Todavia, as correspondências de intenção sediciosa continuavam e eram, por vezes, apreendidas. São precisamente estes canais de comunicação já estabelecidos quer no interior do reino, quer a partir do exterior, que vão ser utilizados nesta fase da resistência miguelista, iniciada em 1842. O exemplo mais significativo desta continuidade experimental, digamos assim, com os elementos anteriores é a própria presença, de acordo com António Ribeiro Saraiva, do general Reginald Macdonell, antigo Comandante em Chefe do Exército miguelista em 1833, logo nesta fase inicial de estabelecimento das bases para um futuro movimento de Restauração.
Com efeito, Macdonell havia estado recentemente em Portugal, em 1839 e 1841, altura em que foi preso, respectivamente no Porto e em Lisboa, acusado de fomentar a rebelião miguelista. As autoridades portuguesas não se enganavam. Este general escocês de patente portuguesa tinha não só as suas ligações firmadas no reino, como também gozava de um certo prestígio que lhe advinha da sua competência militar e dos sacrifícios pessoais que já tinha feito pela causa de Miguel. Nestas condições compreende-se que os seus serviços fossem desde logo mobilizados, no sentido de promover contactos epistolares com os seus habituais correspondentes no reino, informando acerca das disposições e objectivos do plano de Restauração que se estava a definir em Londres e Roma. Assim, Macdonell é incumbido, por Ribeiro Saraiva, em Julho de 1842, de diligenciar a divulgação no meio miguelista em Portugal de uma Instrução, compreendendo o ordenamento geral da nova autoridade sediada em Londres, destinada a coordenar a conspiração realista. O Centro Director centralizaria as iniciativas e as decisões mais importantes, até porque ficava estabelecido como canal obrigatório de comunicação com a corte exilada. Nesta altura era composto por António Ribeiro Saraiva, responsável pela área política e pelo general Macdonell que tinha a seu cargo o planeamento militar.
O funcionamento desta estrutura de direcção em Londres, separada de Miguel, embora actuando em seu nome e com a sua anuência, trazia notórias vantagens políticas de distanciamento, proporcionando evidentes facilidades de ligação com o Reino, tendo em vista os trabalhos preparatórios em curso. O que está em causa é o conceito negativo acerca do governo de Miguel, existente em faixas significativas da sociedade portuguesa e os inconvenientes diplomáticos virtuais do envolvimento directo de Miguel (Tratado de Quadrupla Aliança)». In José Brissos, A Insurreição Miguelista nas Resistências a Costa Cabral (1842-1847), Faculdades de Letras de Lisboa, Edições Colibri, 1997, ISBN 972-8288-80-8.

Cortesia de Colibri/JDACT