A “Sempre-Noiva”. Política matrimonial e Diplomacia paralela
«(…) Os cronistas e estudiosos (Carolina Michaëlis de
Vasconcelos, incluída) na sequência deste episódio falam de ume Infanta
sofredora e profundamente magoada, que se resigna em silêncio às adversidades
de ser apenas mais ume princesa casadoira. Não duvidamos do empenho pessoal de
D. Maria neste casamento. Filipe era senhor de Castela e herdeiro do império de
seu pai; não haveria, portanto, consórcio que a Infanta mais almejasse. Mas a
sua reacção à mudança de estratégia política de Carlos V se sentimental, foi
rapidamente ultrapassada por um sentido de Estado quase inato que sempre
caracterizou e, sua actuação. Veja-se como exemplo a carta que escreveu a Maria
Tudor, de Setembro de 1553 (as
negociações foram interrompidas em Julho), exprimindo a felicidade que sentia
pela conclusão favorável dos seus negócios. D. Leonor, mesmo contrariada, não
desiste de reaver a filha, e depois do desaire do casamento com Filipe II
pressiona o irmão para que reclame junto da coroa portuguesa a ida da Infanta
para Castela; será esta a razão porque Carlos V atrasou a sua entrada no
Mosteiro de Juste. D. Leonor envia logo a Portugal, para não perder tempo enquanto
fazia a fatigante viagem para Castela, o embaixador João Mendonça com cartas de
Carlos V, de Filipe I e suas para João III.
Carlos, Leonor e Maria da Hungria chegam a Castela, tendo as
duas últimas ficado em Valladolid, onde se juntaram à princesa D. Joana que para
aí voltara depois de ficar viúva de João de Portugal. É então que chega a
primeira negativa, pelo embaixador Duarte Almeida, de João III baseada na falta
de decoro que era a saída da Infanta de Portugal sem estar casada. A resposta
do rei português não agradou aos seus interlocutores e Carlos V envia a
Portugal Sancho de Córdova com a missão de levar consigo a Infanta, sem
qualquer hipóteses de desculpa. Escreve cartes a João III e a D. Catarina onde
dá conta da sua vontade, cuja base legal se encontra no contrato de casamento
de Manuel I com D. Leonor.
D. Leonor escreve também uma carta à irmã, a rainha D. Catarina,
na qual, junto com as palavras de reverência e afecto, encontramos outras de ressentimento
e diplomática dúvida quanto às intenções dos reis portugueses. Sancho de
Córdova chega a Lisboa e entrega as cartas, quando João III decide enviar
Lourenço Pires Távora ao imperador e às rainhas viúvas de França e Hungria.
Este embaixador levava novas propostas de casamento para a Infanta, desta vez
com o velho Imperador dos Romanos e seu tio, ou com o seu filho segundo também
de nome Fernando. Estávamos no ano de 1557;
a Infanta tinha 36 anos. É o próprio rei que faz e proposta do noivo à Infanta:
Y porque el rey Don Fernando se halla
viudo, y es la Magestad mas digna de vuestros meritos, que quantos principes ay
de presente en Europa, y que en breue serà Emperador por la renunciacion que
haze en el Carlos vuestro tio, parece que se deue tratar luego deste
casamiento, por los medios que sean mas efectiuos. Se nos alhearmos das
interpretações algo tendenciosas do biógrafo da Infanta e de Carolina Michaëlis,
nada na documentação de per si nos
permite concluir que João III utilizou esta proposta de casamento como forma de
dilatar as negociações para a saída da Infanta». In Carla Alferes
Pinto, A Infanta Dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma
Princesa Renascentista, Fundação Oriente, 1998, ISBN 972-9440-90-5.
Cortesia
da Fundação Oriente/JDACT