Isabel, a Católica/jdact
As Fontes. Vários cronistas espanhóis e também alguns italianos
«(…) Com Afonso Palencia (1423-1492) estamos perante um
humanista de grandes estudos, e uma longa permanência em Itália, Florença e
depois Roma. Como tantos outros homens de letras do seu tempo, era um converso,
ou seja, procedia de uma família judia
convertida ao cristianismo. Cresceu e foi educado em casa do antigo
rabi de Burgos, Pablo de Santa María, também converso, então bispo da cidade.
Foi secretário latinista de Henrique IV, mas em 1468 declarou-se a favor do rival deste, Afonso, irmão de Isabel, a Católica. Tornou-se cronista oficial
desta última, cargo que exerceu entre 1475
e 1480, ano em que, segundo o seu próprio testemunho, foi destituído
pela rainha. Ao contrário de quase todos os outros cronistas, não se coibia de
criticar Isabel, a Católica.
Continuou a trabalhar até à morte depois de ser exonerado na sua obra monumental,
as Décadas
em que narra os acontecimentos desde finais do reinado de João II de Castela
até ao ano de 1481. A sua crónica é
importante para a história de Portugal pelos episódios relativos à guerra de
sucessão espanhola, sobretudo as hostilidades compreendidas entre a Batalha
de Toro (1476) e os tratados de paz de Alcáçovas-Toledo (1479);
é também uma das raras vozes dissonantes em relação a Isabel I que podemos
encontrar na cronística do período.
Fernando del Pulgar (1436-c. 1492), por sua vez, é um dos
cronistas mais conhecidos do reinado de Isabel
e Fernando. Nascido em pleno coração de Castel a, na terra do mesmo
nome, perto de Toledo, foi conselheiro de Isabel, a Católica, e nomeado cronista real em 1482, em substituição de Afonso Palencia. A rainha tê-lo-ia visto
como um cronista mais adequado à nova etapa de consolidação do poder, em que
era preciso sanar as feridas da guerra e não continuar a denegrir Henrique IV e
os seus partidários, conforme Palencia vinha fazendo na sua crónica. Como este
último, Pulgar também tinha origem judaica, sendo um converso como
tantos outros altos funcionários da corte nesta época. Embora um autor de
propaganda régia, presenciou muitos dos acontecimentos narrados, e a sua
crónica é uma das mais citadas na historiografia. António Nebrija
traduziu para latim e publicou a primeira edição da Cronica de los Reys Católicos
em seu nome, tal como a versão em castelhano de 1565. Pulgar só surgiu como verdadeiro autor na edição de 1567. O lugar de Pulgar como
cronista oficial foi ocupado em seguida por Alonso Santa Cruz (c.
1505-1567).Cartógrafo, historiador e professor, escreveu uma obra com o
mesmo título do seu antecessor: Cronica de los Reys Catolicos. Fê-lo
muito depois de as suas principais personagens estarem mortas: Isabel morreu um ano antes de ele nascer
e Fernando faleceu em 1516.
Outro cronista importante é Andrés Bernáldez (c.
1450-1513), um homem da Igreja, também conhecido por cura de Los
Palacios, paróquia da região de Sevilha onde exercia o seu ministério. Ao
contrário de outros cronistas como Pulgar ou Palencia, era
cristão-velho e hostil aos conversos. Foi capelão de Diego Deza, o homem
que tinha a seu cargo a educação do príncipe Juan, herdeiro do trono espanhol; Deza
ficou conhecido também por ser amigo de Cristóvão Colombo, e um dos
intermediários deste junto dos Reis Católicos. Bernáldez escreveu uma
crónica do duplo reinado, de título idêntico às que já referi: Historia
de los Reys Católicos don Fernando y doña Isabel, sempre no tom
laudatório que se esperava de um cronista. Esta, no entanto, apesar de
algumas observações mordazes no que respeita a Portugal e aos seus protagonistas,
que podem ser verdadeiras, peca por trocar nomes e datas com demasiada
frequência. Tal como muitos dos seus congéneres, presenciou algumas das coisas
que relata, ou ouviu falar delas através de informações em primeira mão.
Lorenzo Galíndez Carvajal (1472-1525) era jurista, e foi
catedrático em Salamanca, tendo passado ao conselho dos Reis Católicos, que lhe
haveriam de encomendar uma compilação de leis e pragmáticas reais, hoje perdida.
A carreira deste homem ilustra muito bem o cuidado com que os Reis Católicos
orquestraram a escrita da história que lhes dizia respeito: foi encarregado
de emendar e corrigir as muitas e por vezes contraditórias crónicas do reinado
de Fernando, o Católico, e seus
antecessores, afirmando-se como censor
e juiz, da cronística referente à Casa de Trastâmara. Pelo lado aragonês, temos outro cronista
célebre, Jerónimo Zurita (1512-1580), nomeado cronista-mor de Aragão
em 1548.
Escreveu a Historia del Rey don Fernando el Católico. De las empresas y ligas de
Italia e os Anales de la Corona de Aragón, publicados entre 1562
e 1580. Embora não seja contemporâneo dos tempos que narramos, é um
historiador na acepção moderna do termo, porque conhecia bem os arquivos e as
obras dos outros cronistas». In Isabel Guimarães Sá, Rainhas Consortes de
D. Manuel I, Isabel de Castela, Maria de Castela e Leonor de Áustria, C. de Leitores,
2012, ISBN 978-972-42-4710-6.
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