«(…) E é assim que a mulher moderna, aquela que faz a verdadeira vida mundana,
passa os dias, as semanas e os meses numa féerie
deslumbrante de trajes onde a arte feminina e subtil da mulher traçou requintes
de graça e beleza.
Mas é talvez o cabelo à garçonne
que detém mais carisma, nesses anos 20. Em 1927,
apesar dos cabelos à garçonne se
terem implantado ainda antes dos anos 20 em França, referia-se a nova moda,
como algo de profundamente revolucionário. Debatia-se, claro está, se eventualmente
em Espanha ou em Portugal a moda invadia os hábitos e os costumes femininos.
Negativa era a resposta da Voga.
Apesar de haver um grande número de mulheres que conduzia automóveis em
Paris, (cerca de 2000 em 1927); 675 inscritas nas Faculdades
de Ciências, bem como 897 em Medicina, isso não significava para o
caso português qualquer analogia. No entanto, estes exemplos que a todo o
momento se referiam, eram um claro incentivo a uma prática diferente por parte
das nossas compatriotas.
Na culinária as influências francesas eram imensas. Fialho de Almeida
em Os Gatos, em 1916, protesta: Actualmente entre nós a arte de cozinhar e comer, degrada-se, como tudo
o mais, por falta de coesão nos gostos do público e por culpa dos inovadores
acéfalos, para quem as coisas nacionais não valem a mais reles boutade anglo-gaulesa.
Bem se podia lamentar Fialho de Almeida das influências francesas e
inglesas na cozinha e nos menus
portugueses. Em 1926 na rubrica Culinária
da Eva as receitas eram na
base de Beignets de queijo, Biftecks au cresson e Abatises de peru de cabidela. A
cozinha, como aliás tudo o mais, era francesa.
Mas havia a excepção que, sem confirmar a regra, já surgia no horizonte
de influências. Referimo-nos às tendências americanas e inglesas denunciando
pela primeira vez um outro tipo de atitudes que não as gaulesas
A partir de 1911 começam a
surgir na revista Serões
artigos sobre a educação das americanas. Nomeadamente no que respeita a
coeducação, praticada nas escolas. A prática dos desportos em vários países europeus
é descrita com grande sentido do pormenor em a Ilustração Portuguesa, ABC, Voga e Eva, No ABC de 1923 fala-se concretamente da Mulher Moderna como sendo uma
condição adquirida pela norte-americana. Por sua vez, começam a surgir artigos
sobre a alemã, a sua preparação física e apetência para o desporto.
Em 1908 a Ilustração Portuguesa já
assinalava na mulher alemã uma forte inovação no que dizia respeito ao campo
profissional. Eram escritoras, pintoras, escultoras, doutoras nas mais variadas
áreas. A rapariga de hoje, o Backfisch,
como familiarmente é designada, entrega-se às diversões do sport o que
noutro tempo seria escandaloso; patina, joga o ténis, monta a cavalo, toma
parte em regatas e certames de natação.
Mas o que é curioso é o modo como se refere esta alteração de hábitos
nas raparigas alemãs. Era a influência norte-americana que se desenhava
num-retraimento da influência francesa. Outro aspecto que se assinalava era a
frequência por parte das mulheres alemãs, e aí era nítida a influência norte
americana dos cafés da época. No Sul da Europa só o sector masculino se
deslocava aos cafés». In Cecília Barreira, História das Nossas
Avós, Retrato da Burguesa em Lisboa (1890-1930), Edições Colibri, Colecção
Sociedade & Quotidiano, 1994, ISBN 972-8047-63-0.
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