A Herança d’O Bolonhês
«(…) É provável que por essa altura também o infante tenha contraído matrimónio.
Autores como Fernando Félix Lopes, baseados na Crónica de D. Dinis, de
Rui de Pina, defendem, pelo contrário, que o enlace teria sido preparado ainda
antes de 1279 por Afonso III, quando
o infante teria apenas nove anos de idade. Contudo, como sustenta, por exemplo,
José Augusto Pizarro, tudo indica que terá ocorrido em altura próxima do
casamento do monarca Dinis e Isabel de Aragão, talvez em 1282-1283. A escolha de Afonso, a que muito provavelmente não
terá sido alheia a intervenção de sua mãe, D. Beatriz, recaiu sobre D. Violante
Manuel, nascida em 1265 e nem mais
nem menos que filha do infante Manuel, filho de Fernando III e irmão de Afonso
X de Leão e Castela, isto é, uma das mais poderosas figuras do reino vizinho.
Descendência de Fernando III
de Leão e Castela e de Afonso III de Portugal
Esta união conferia uma importância geo-estratégica ainda maior aos senhorios
de Afonso, convertidos agora num
poderoso núcleo de influência política, militar e territorial tanto em Portugal
quanto em Castela, em virtude da sua localização em plena região de fronteira. E
se em caso de confronto entre os dois reinos esta situação podia vir a ser
benéfica para um dos lados, poderia, pelo contrário, tornar-se extremamente
perigosa para o outro, o que passava a conferir ao infante e a esses domínios
um papel ainda mais destacado no quadro peninsular. E não tardou até que isso
se viesse a verificar na prática. É precisamente em 1282, no rescaldo do cerco a Castelo de Vide, que eclode a
Guerra Civil em Castela, com o infante Sancho a revoltar-se abertamente contra
seu pai, o rei Afonso X. Entre os rebeldes encontravam-se praticamente todas as
principais figuras da nobreza castelhana, entre as quais Manuel, sogro do
infante português, que pronunciara em Valladolid a sentença de deposição d’O Rei Sábio. Seria, pois, de esperar que
o
senhor de Portalegre, Castelo de Vide e Marvão se colocasse também ao lado
de Sancho, o que até teria agradado ao rei Dinis, que, embora de forma discreta,
apoiava igualmente o infante castelhano. No entanto, quando tudo apontava nesse
sentido, Afonso, tal como sua mãe e
outras figuras de topo da nobreza portuguesa, nomeadamente João Peres Aboim,
Martim Gil de Riba de Vizela, Vasco Martins Pimentel, Soeiro Peres Barbosa, Abril
Peres e Vasco Moniz Serra, colocam-se ao lado de Afonso X, a quem é mesmo
possível que o infante tenha dado algum apoio militar ou logístico, a partir
dos seus senhorios na raia alenteiana.
Mas mesmo que a apoiar facções opostas, nem assim isso parece ter trazido
qualquer desavença entre o rei Dinis e Afonso,
já que este continua a ser uma figura constante da corte dionisina,
acompanhando quase sempre o monarca nas suas deambulações pelo reino. Com
efeito, encontramo-los juntos, por exemplo, em Beja, logo no dia 2 de Março de 1282, e em Évora, entre Abril e Maio. É
possível, contudo, que se tenha deslocado a Castela em Novembro de 1283 para assistir às exéquias de
Manuel, seu sogro, que morrera no dia 8 desse mês, mas em Janeiro de 1284 está já de volta a Coimbra,
permanecendo junto do rei, pelo menos, até Julho. Por essa altura, Castela
tinha já, desde o início de Abril, um novo rei: Sancho IV.
Amizades perigosas
Contudo, em 1287, pouco
depois de receber as tenências de Viseu (1287) e de Trasserra ou Seia, os
atritos entre os dois irmãos reacendem-se de forma ainda mais violenta. O
problema é desencadeado pelo apoio político-militar prestado por Afonso ao senhor de Albarracin, Álvaro
Nuñez Lara, então em conflito aberto com o monarca castelhano. A revolta do
Lara surge, em grande medida, como uma reacção à ascensão meteórica de
Lope Diaz Haro como principal privado de Sancho IV e que este elevara
igualmente às dignidades de conde, de alferes e de mordomo-mor do rei, uma
promoção que provocou o descontentamento de inúmeros sectores da nobreza
castelhana». In Miguel Gomes Martins, Guerreiros Medievais Portugueses, A Esfera dos
Livros, Lisboa, 2013, ISBN 978-989-626-486-4.
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