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Origens
«(…) Em oposição ao ponto de
entrada na Alcáçova, situava-se o ponto de entrada na cidade: a Porta do Sol
e o Castelo. E assim, a ligar a porta da Alcáçova à porta do Castelo
temos a via descrita por Afonso III. Um percurso com mais de 240 metros de comprimento,
subindo suavemente de oeste para este e depois descendo, que daqui para a
frente viria a sofrer maiores ou menores alterações, decorrentes da construção
e reconstrução dos edifícios que foram estabelecendo os seus limites. A Rua
Larga, situada na parte alta da cidade, a Almedina, foi ao longo
dos tempos, um dos eixos mais importantes e estruturadores deste espaço.
Todavia, esta área da cidade foi oscilando em termos de importância quanto às
actividades aí desenvolvidas pela população. À medida que as ameaças almóadas
deixavam de ser um problema para a cidade, esta, que já tinha galgado a
muralha, foi progressivamente escorregando em direcção ao rio. Assim se terá consolidado,
no arrabalde, o principal sistema urbanístico da cidade, a Praça Velha e a actual Rua
Ferreira Borges, que concentravam a maior parte da produção artesanal e
comércio da cidade. A parte baixa da cidade, animada pelo florescimento da
burguesia e pela dinâmica trans-urbana que a importante via Lisboa - Braga
proporcionava, contrastava com uma certa estagnação da parte alta, de difícil
acesso e cada vez mais despovoada.
Para contrariar esta tendência,
foram vários os reis portugueses que procuraram inverter a situação,
nomeadamente Dinis I e, mais tarde, outros monarcas como João III, que através da
instalação de edifícios de ensino universitário e habitações para os estudantes
foram dando nova vida à alta de Coimbra e consequentemente à Rua
Larga.
A Cidade
Medieval
Numa altura em que a via estudada
ainda não tinha a designação de Rua Larga, pois provavelmente a
largura ainda não seria um factor relevante de diferenciação das outras, o Castelo
e a Residência Real, dominavam pela sua escala o conjunto urbano da
parte alta da cidade. Nesta época, as últimas obras de carácter defensivo no
Castelo já teriam sido realizadas e este era o último ano em que a Universidade estaria em Coimbra, para
depois só regressar em 1537. Os Estudos
Gerais marcavam presença perto do Paço Real, mas apesar desta excepção,
o eixo seria estruturado pelo medieval aglomerado habitacional e talvez alguma
actividade comercial.
Parte do castelo foi edificada
por Afonso Henriques e Sancho I, nos séculos XI e XII. A Porta do Sol, voltada a
nascente, é referida em documentos do tempo do conde Sesnando, em 1087 /
88. Esta teria em 1176, dois
cubelos quadrados e foi refeita a mando da condessa-rainha D. Teresa, após o
ataque muçulmano de 1117. Do castelo
da cidade, não restam hoje senão memórias escritas ou desenhadas, pois os
poucos vestígios que se conservaram até meados do século XX, desapareceram com
as obras da Cidade Universitária. Do conjunto fortificado sobressaíam
duas torres: a torre quadrada, no centro do castelo é a mais antiga: a
torre de menagem de Afonso Henriques, que teria cerca de 22 metros de
altura. A torre pentagonal ou quinária, foi construída por Sancho I em 1198, sendo-lhe atribuída a altura de
cerca de 26,5 metros. A torre de menagem era feita de blocagem argamassada,
dura como ferro, apertada entre revestimentos, interno e externo, de silharia
gravada e siglada. Teria a sua entrada muito alta, servida por escadas de
madeira amovíveis, como era próprio destas torres. A estrutura defensiva possuiria
ainda, um fosso.
Todavia, no reinado de Fernando I,
o Castelo sofreu novas transformações. Além do adarve que ligaria as Torres
de Afonso Henriques e Sancho I, terão sido construídas duas novas torres: a torre
das Mulheres e a partir de 1374
começou a ser erigida a torre nova, que marcaria a entrada na cidade,
substituindo a antiga Porta do Sol. Fez-se, então, na secção de
documentos gráficos a reconstituição do castelo, tendo em conta o desenho de
Baldi de 1669, a planta do
século XVIII de Guilherme Elsden, aquando da demolição promovida pelo
Marquês de Pombal, e a reconstituição feita por Jorge Alarcão. Anteriormente às
obras do rei Fernando no Castelo, já no início do século XIV, os Estudos
Gerais se tinham implantado na Alta da cidade. Após a transferência da
Universidade de Lisboa para Coimbra em 1308,
a instituição verá construído um edifício digno. Intramuros, especialmente
na parte mais alta, havia muitas casas abandonadas, arruinadas, e de aluguer.
Era, pois, a ocasião, para no bairro alto, sítio sossegado, se construir os Estudos
Gerais, e para alugar ou construir habitações para albergar estudantes.
No local onde no século XVI se construiu o Colégio Real de S. Paulo, os
Estudos instalaram-se primeiro em casas, enquanto o edifício próprio não estava
concluído.
Sobre
o edifício em si, crê-se que terá tido um claustro, pois algumas das belas
colunas com as suas bases e capitéis do claustro do Convento de Celas
terão sido de lá trazidas. Com a informação do local, da organização funcional,
e de uma dimensão aproximada para a arcaria do claustro, tentou-se formular uma
hipótese de como os Estudos Velhos Dionisianos poderiam ter sido.
Sem certezas sobre a sua área de implantação e volumetria, propôs-se um
edifício com dois pisos e alguma escala no conjunto urbano. Por volta de 1340, também estaria concluída a reforma
do Paço Real por parte de Afonso IV. Contudo, desde as primeiras décadas do
século XIV, que se vinha assistindo à construção de estruturas utilitárias
palatinas que se acrescentaram à capela e aula do palatium primitivo sesnandino. Consumava-se, assim,
um Paço Real da Alcáçova, inquestionavelmente cabeça da urbe, pousado na
colina. Afastado, pouco a pouco, o perigo muçulmano e esbatida a importância militar
do recinto fortificado, a moradia régia inaugurava uma relação crescentemente
aberta com a cidade e as suas necessidades. A reconstituição do Palácio feita
por António Pimentel foi a base da sua representação nos documentos gráficos». In
Rúben Neves Silva Vilas Boas, A Rua Larga de Coimbra. Das Origens à
Actualidade, Mestrado em Arquitectura, Departamento de Arquitectura da FCTUC,
Coimbra, 2010.
Cortesia
da UCoimbra/JDACT