Conceito de etnia macaense
«Não se foge à verdade quando se diz que macaense é aquele que é
natural de Macau. Porém, embora essa afirmação seja verdadeira, é incompleta, já
que não especifica a etnia da pessoa em causa. É esse pormenor que marca a
grande diferença e que o termo macaense por ser ambíguo, não especifica;
qualquer pessoa que nasça em Macau é macaense, independentemente de ser ou não
dessa etnia. Talvez por essa razão, os etnicamente macaenses, se considerassem
desde sempre um grupo diferente dos outros naturais de Macau e se auto
designassem os filhos da Terra ou filhos de Macau. Também os chineses de
Macau, o grupo etnicamente maioritário sente essa diferença, denominando os de
etnia macaense de Tou Sán que
significa nascidos na terra, enquanto
que se autodesigna por gente de Macau.
Perante esta realidade, pergunta-se: Quem
são afinal os filhos da terra? Que características os distinguem e os
fazem parecer duplamente macaenses: por
etnia e por naturalidade?
Várias têm sido as pesquisas feitas sobre o assunto, algumas as
opiniões emitidas e que por vezes são contraditórias. Senão vejamos: Relativamente
à origem dos macaenses, a opinião geral dos autores consultados, é que estes
resultaram do cruzamento entre homens portugueses que viajavam nas naus e
caravelas e mulheres asiáticas. Porém, as ideias no que respeita à etnia dessas
mulheres, já não são tão concordantes. Assim, para Bento da França (1897),
os macaenses têm traços mongólicos, europeus, malaios, canarins e são produto
de grande mistura de raças e sub-raças. Melo Machado (1913),
considera os macaenses fruto do cruzamento de portugueses com mulheres
japonesas e malaias primeiro e mais recentemente com mulheres chinesas. Carvalho
Rego (1950), é de opinião que os macaenses não são de ascendência
sino-portuguesa, mas sim do cruzamento de europeus com outras raças do oriente.
Já Eduardo Brazão (1957), expressa uma ideia diferente,
referindo terem os macaenses rara miscigenação com indianas e pelas
características físicas que apresentam, a maior parte deve descender do cruzamento
de portugueses com malaias e chinesas. Também Manuel Teixeira (1965),
refere serem os macaenses descendentes de portugueses e chinesas. Ana Maria
Amaro (1988), tem uma opinião diferente, afirmando que os macaenses
descendem de portugueses e mulheres malaias, luso-malaias, indianas,
luso-indianas, timorenses, japonesas e também chinesas. Opinião idêntica a esta
última, expressa António Carmo (1993).
Porém não basta ser natural de Macau e ter origem euro-asiática, para
se ser considerado etnicamente macaense. Existem dois outros vectores importantes,
que os autores consultados igualmente referenciam como característicos dessa
etnia. São eles a linguagem e a religião. Relativamente à linguagem, a que
foi utilizada até às primeiras décadas deste século, era para além do português,
o patuá ou falar da terra, uma mistura de português simplificado com malaio, a
que se foram agregando muitos vocábulos chineses. Sendo este modo de falar,
característico dos macaenses como grupo. Ao cair em desuso, a linguagem
utilizada continuou a ser o português com pronúncia regional própria e cada vez
mais o cantonense, a que não são alheias as transformações sociais e
políticas que se têm vivido em Macau, onde se sente cada vez mais a influência
chinesa. Seguindo a opinião de autores já referidos como Manuel Teixeira,
Ana Maria Amaro e António Carmo, estes factores fazem do macaense um
bilingue nas línguas portuguesa e no dialecto cantonense, podendo ainda na maior
parte dos casos, segundo Ana Maria Amaro, exprimir-se facilmente em
inglês.
Relativamente à religião,
todos os autores consultados são unânimes em referir que os macaenses são tradicionalmente
católicos. Ana Maria Amaro considera-os católicos muito conservadores. João
Pina Cabral e Nelson Lourenço falam igualmente nos três vectores principais
de auto-identificação, como sendo a mestiçagem euro-asiática, a língua portuguesa
e a religião católica, transcrevendo um conceito de macaense dado por um membro
dessa etnia: Ser Macaense é ser natural
de Macau, mas ter cultura portuguesa... é ser português do Oriente...é ter
certas maneiras de ser e estar, de pensar e falar que o identificam como
macaense. Poderíamos incluir nestas maneiras de ser e estar, certos hábitos
e tradições nomeadamente culinárias e que são também características dos
macaenses». In Isabel Maria R. Correia Pinto, O Comportamento Cultural dos
Macaenses perante o Nascimento, Imprensa Oficial de Macau, Fundação Oriente,
2001, ISBN 99937-603-1-5.
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