Convite
para ser rei. A escolha de Fernando Augusto de Coburgo
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Mas esta reunia tão poucas vezes que pouco tempo lhe iria tomar. O príncipe já
mostrara ser homem inteligente e ter as artes como a sua maior paixão. Era,
pois, uma vida agradável e sem preocupações que se previa para Fernando Coburgo-Koháry.
Mas eis que em Setembro de 1835 o
seu pai recebe uma proposta de tal forma inesperada e lisonjeira que se
assustou. Pediam-lhe o primogénito para marido da rainha de Portugal, D. Maria
II. Fernando Jorge Coburgo era um homem muito prudente e tinha razões para não
aceitar de imediato um pedido que, embora pudesse transformar o filho em rei,
também podia destruir-lhe o futuro. Portugal estava na penúria depois da guerra
civil só terminada no ano anterior em Maio de 1834, com e vitória dos partidários de uma monarquia constitucional.
Mas esta estava longe de se considerar estabelecida e o novo regime não fora
ainda reconhecido por muitas potências, nomeadamente a Áustria. Metternich, com
quem Fernando Jorge. Coburgo tinha de manter bom relacionamento, era um
adversário das ideias constitucionais, desejando ver o infante Miguel no trono
português, pouco se importando com o facto de D. Maria II ser neta do imperador
reinante. As simpatias pelo infante D. Miguel estendiam-se à Prússia, país
amigo do ducado de Coburgo.
Pedro
IV o rei de Portugal que abdicara na filha D. Maria e que se pusera à frente
das forças vitoriosas, assumindo depois a regência do reino em nome da pequena
rainha, morrera com apenas 35 anos, meses depois da vitória definitiva e do
exílio de Miguel. D. Maria fora declarada maior uns dias antes da morte
do pai, aos 15 anos, e, sendo vital assegurar a continuidade da dinastia,
rapidamente casada com um irmão da madrasta, Augusto de Beauharnais, duque Leuchtenberg,
noivo escolhido por Pedro. A escolha desagradou à corte francesa, que
não podia ver com bons olhos um neto de Napoleão no trono português. Mas, dois
meses após a sua chegada a Portugal, o príncipe Augusto faleceu, em Março de 1835. Levantaram-se distúrbios, houve
acusações de assassínio, rumores sobre pessoas interessadas no trono. Se uma
doença levasse a rainha, como sucedera ao pai e ao jovem marido, ninguém
duvidava de que haveria nova guerra civil. Esclareça-se que as irmãs inteiras
de D. Maria eram brasileiras e residiam no Brasil. A sua meia-irmã, D. Maria
Amélia (1831-1853), filha de Pedro IV e da segunda mulher, Amélia de
Beauharnais, tinha apenas 3 anos e vivia com a mãe em Lisboa, não tendo sido
ainda reconhecida como princesa do Brasil. Existiam também duas tias da rainha:
a infanta D. Isabel Maria (1801-1876), solteira, que fora regente
do reino à morte do pai (João VI), e a infanta D. Ana de Jesus (1806-1857),
que nesse ano se separou do marido, o então marquês de Loulé. Destes havia
filhos, mas como o casamento da infanta não fora permitido pelo rei, nem Loulé
nem os filhos eram considerados membros da família real. Nada disso obviava a
que qualquer um destes nomes viesse a ser apoiado na subida ao trono. Existia
também, é claro, o candidato mais temível: o infante Miguel, ex-soberano que
desde o ano anterior vivia no exílio. Era portanto uma situação muito perigosa.
Para complicar ainda mais o cenário, dizia-se ainda que o duque de Palmela
planeava casar um filho com a rainha, que pretendia controlar, e que por isso
teria envenenado Augusto de Beauharnais.
Preocupadas
com este problema dinástico, dez dias depois da morte do príncipe Augusto, e
sem contemplações pelos sentimentos da pequena viúva, as câmaras de deputados e
dos pares aprovaram uma petição à rainha para que se iniciassem diligências para
um novo casamento. A jovem, mal saída da adolescência, já se revelara
personalidade enérgica, corajosa e pragmática. Percebeu que não podia adiar
esse passo, que ter descendência era de absoluta necessidade e que, para evitar
dissensões, o noivo teria de ser estrangeiro. A busca começou de imediato.
Francisco Almeida Portugal, conde do Lavradio, foi encarregado de o encontrar e
conduzir as negociações, partindo para Londres a 26 de Maio de 1835. Foi ele, plenipotenciário da
rainha, que enviou a Fernando Jorge Coburgo a proposta de casamento. Ao sair de
Lisboa, Lavradio ia incumbido de negociar o casamento da rainha com o duque de
Nemours, segundo filho de Luís Filipe de Orleães, rei dos Franceses. Nemours
era de estirpe real, católico, filho de rei constitucional e de um país aliado.
D. Maria II, que era sobrinha-neta de Maria Amélia, rainha dos Franceses,
convivera com a família Orleães quando residira em Paris, primeiro com o pai e
depois ao tempo em que decorria a guerra civil portuguesa. Tornara-se até amiga
de Clementina, uma das filhas dos monarcas franceses, com quem manteve
correspondência. O duque de Nemours era, pois, o candidato ideal. Contudo,
tanto a rainha como o governo sabiam haver fortes possibilidades de um veto
inglês. Lavradio estava então incumbido de tentar o casamento com Luís, duque
de Nemours, ou com o irmão Francisco, príncipe de Joinville, mas no caso de se
revelarem inviáveis, deveria procurar outro noivo. Este teria de perfilhar
ideias constitucionais e merecer o aval da Inglaterra e da França, que eram as
potências dominantes da Quádrupla Aliança, assinada por esses dois
países e por Portugal e Espanha no ano anterior». In Maria Antónia Lopes, D.
Fernando II, Um Rei Avesso à Política, Círculo de Leitores, 2013, ISBN
978-972-42-4894-3.
Cortesia
de CL/JDACT