«(…)
Com fundamento no que havia já sido acertado, Pereira Mesquita chama a si a
elaboração de um projecto (… ainda com Bardaxi y Azara elaborara-se um plano
preliminar oportunamente remetido a Lisboa. Gizado sobre linhas gerais
contemplava cinco pontos fundamentais: pôr termo às questões de Olivença e
Montevideu; estabelecer circuitos comerciais; acertar acções comuns frente à
concorrência de terceiros; qualificar auxílios a prestarem-se mutuamente em
caso de ataque e, por fim, propor os princípios de uma Convenção para a entrega
recíproca de criminosos, desertores, etc). Consignado em nove artigos, aos três
primeiros dedicará a proposta da restituição de Montevideu. Os dois
seguintes tratam da devolução da Praça de Olivença, incluindo indemnizações,
delimitação fronteiriça e amnistias. Pelo artigo 6.º regulava-se terminantemente e definitivamente a mútua
entrega de criminosos, desertores, etc.. Segundo o 7.º, obrigavam-se as
partes a concluir, seis meses após a ratificação do Tratado, um outro de
Comércio. E, como constava no artigo 8.º, uma Aliança defensiva, logo que
possível, contra inimigos comuns, na Europa e nos domínios d’além-mar. Finalmente,
pelo último, estendia-se às respectivas possessões
em qualquer parte do Mundo a obrigatoriedade do acordado nos dois anteriores.
Como
é óbvio, o que mais ressalta do projecto é a sua desmedida amplitude. Sem
embargo, remetido para Lisboa, colhe pronta aprovação. Da parte de Pinheiro
Ferreira, a única preocupação residiu na forma do seu processamento. Quanto a
ele, haveria toda a vantagem em discutir o plano apenas entre os Governos,
subtraindo-se ao juízo das Cortes. Só assim se obviariam os habituais atrasos e
a desaconselhável publicidade. Tinham realmente larga justificação as
apreensões do titular dos Estrangeiros. Por essa altura entrava em agenda no
Soberano Congresso a questão de Montevideu. O debate suscitara imediata
controvérsia entre duas facções. Uma, defensora da permanência portuguesa
naquele território; outra, que frontalmente se lhe opunha. A discussão
prolongou-se sem acordo. À falta deste, resultavam bloqueadas as negociações do
projecto, a menos que dele fosse retirada a questão, como em despacho se
informava para Madrid: … já vê que
este assunto, por V. S. mui acertadamente posto no primeiro lugar no seu projecto
não pode entrar no Tratado, pois não nos convém conservarmo-nos mais tempo no
estado em que temos permanecido com tanta perda e nenhuma espécie de glória
naquela Província.
Por
seu turno Pereira Mesquita mantinha os contactos com o Gabinete espanhol, ao
qual também entregara cópia do projecto. Ali, porém, tudo parecia facilitado,
pois o monarca detinha suficientes poderes para concluir este tipo de tratado
sem a intervenção das Cortes. Na audiência com Mardnez de la Rosa mostrara-se
este compreensivo. Todavia, deixará bem claro o grande empenho espanhol em que
se não abandonasse Montevideu às forças insurgentes. Como em ofício observava o
nosso diplomata, invertiam-se as posições. O que seis anos antes originara viva
repulsa, era agora ardentemente desejado, a ponto de se considerar a evacuação
de Montevideu como um acto de hostilidade!... Para Madrid a presença portuguesa
representaria um mal menor. De facto, o statuquo alimentava uma remotíssima
esperança de recuperação daquele território. Caso retirássemos da área, seria
certa a sua imediata independência, ou isolada ou adstrita à Província de
Buenos Aires. Subjacente à atitude do Governo espanhol estaria o conhecimento
de que a Assembleia de Montevideu votara a incorporação ao Reino de Portugal,
Brasil e Algarves. Decisão aclamada no ano anterior, aguardava que o
Soberano Congresso em Lisboa a admitisse, como veio a acontecer em meados de 1822». In Fernando Castro Brandão, A Diplomacia Liberal em
Espanha através da Correspondência dos Representantes Portugueses, 1821-1823,
separata de A Diplomacia na História de Portugal, Academia Portuguesa da
História, Lisboa, 1991.
Cortesia
de APdaHistória/JDACT