«O
contacto português com a Argentina inicia-se nos alvores do século XVI. Em 1514 parece haver chegado ao Prata uma
expedição de que se presume fosse piloto-mor João Lisboa. Segundo Damião
Peres, baseado na obra de Toribio Medina El descubrimiento del Oceano
Pacífico – Hernando de Magallanes, já em 1501-150 o navegador Nuno
Manuel teria procurado a passagem inter-oceãnica, antepondo-se catorze anos ao
comummente aceite descobrimento do La
Plata por João Dias Solis, também presumivelmente português, com quem o rei
de Castela fizera uma capitulação para contornar pelo sul o Novo Mundo e chegar
às Molucas. A ideia, de acordo com as instruções régias, seria levar tão longe
quanto possível o conhecimento da América e do seu contorno. Sabe-se que Solis
partiu em 8 de Outubro de 1515
de S. Lucar de Barrameda, com três navios; que chegou em Fevereiro de 1516 a um porto-Candelária, próximo da
actual Montevideu; que baptizou o grande rio com o nome de Mar Dulce;
que foi trucidado traiçoeiramente e devorado pelos guaranis antropófagos, bem
como os seus oito companheiros, na ilha a que chamara de Martin Garcia, nome do
despenseiro de bordo.
Todas
estas expedições e as que se lhes seguiram visavam fundamentalmente a
descoberta das regiões auríferas e argentárias, de cujas fabulosas riquezas
chegavam à Europa, através do Brasil, aliciantes e sugestivas lendas. Daí o
convencimento de que, atravessando-se o continente, se atingiriam esses
almejados territórios e daí também a errada identificação que dos mesmos se
fazia com Malaca. Outros navegadores portugueses estiveram no rio da Prata: Cristóvão
Jacques (1516-19 e 1526-29);
Pero Lopes, irmão de Martim Afonso Sousa, que percorreu o Paraná e o
Uruguai... Devem-se ao português Aleixo Garcia, um dos componentes da
armada de Solis, as descobertas do Paraguai e da Bolívia, partindo do porto
brasileiro de Santa Catarina (1524). Nuno Chaves, que se incorporara
na expedição de Irala, é o primeiro a cruzar o continente americano
e a estabelecer a comunicação entre as duas vertentes da América do Sul, pois
vai a Lima (Peru) de onde regressa a Assunción (Paraguai). É a época em
que portugueses e espanhóis, à compita, procuram assenhorear-se das terras
americanas, nem sempre respeitando os aliás mal definidos limites fixados pelo
tratado de Tordesilhas.
Se
nos descobridores encontramos tão valiosos artífices do desbravamento e da
colonização, também nos intérpretes se manifesta o espírito integrador e
assimilador característico do lusitano. Com efeito, não deixa de causar espanto
que, para tão difícil missão, fossem frequentemente escolhidos navegantes,
pilotos, guias portugueses. O intérprete não se limitava a ser um tradutor,
mero instrumento do pensamento alheio. Era o faraúte ou língua,
sinónimo de conselheiro ou mentor, homem esclarecido e experimentado, de cujas
capacidades dependia em grande parte o êxito das arriscadas empresas. A serviço
ou não da Espanha, a vida de cada um destes homens assume contornos de
autêntica epopeia. Gonçalo Costa, António Tomás e Enrique Montes, eis os
nomes mais destacados… A Gonçalo Costa chamaram os castelhanos El Caballero. E também por suas proezas
recebeu outro título que não necessita de adjectivações e o equipara às
legendárias figuras da Historia: El
del Rio de la Plata!
Uma
versão existe, bastante controvertida, segundo a qual teria habitado Gonçalo
Costa em S. Vicente, com seu sogro João Ramalho, no primeiro terço do século
XVI. Fora ao Brasil para ajudar a exportar, com destino à Europa, parte dos
escravos que o sogro largamente possuía... Passando a Armada de Diego Garcia
Moguer por S. Vicente, acordou com ele Gonçalo Costa o transporte para Espanha
de oitocentos dos seus escravos; comprometia-se em troca a acompanhar Garcia
Moguer na qualidade de intérprete. Seria esta a sua primeira viagem ao Prata». In Lemonde
Macedo, O Rio da Prata e o Famoso Intérprete Português Gonçalo Costa, a
Joaquim Veríssimo Serrão os Amigos, Fraternidade e Abnegação, Academia
Portuguesa da História, Lisboa, 1999, ISBN 972-624-126-X.
Cortesia
da APdaHistória/JDACT