Nas pisadas do pai
«(…) Depois de alguns atrasos, em Março de 1428 tem início a viagem de
regresso a Portugal, com a hoste, entretanto engrossada por alguns imperiais como o célebre Mateus da
Polónia, a passar pela Marca de Treviso, um território fronteiriço, que
o imperador havia atribuído ao infante Pedro ainda em 1418. Daí, o trajecto para sul faz-se por Veneza, Ferrara, Florença
e Roma, pretexto para Pedro se
encontrar em audiência com o papa Martinho V. Prosseguem de novo para norte,
rumo a Pisa, porto em que tem início a viagem marítima que os levará ao reino de
Aragão, onde devem ter chegado em Julho. Será este o ponto de partida para a
derradeira etapa com destino a Portugal. Porém, nem todos seguem viagem. Com
efeito, o infante, Álvaro Vaz Almada, Aires Gomes Silva e Estêvão Afonso optam
por permanecer mais umas semanas em Valencia, de modo a poderem ultimar as
negociações relativas ao enlace entre Pedro
e D. Isabel, filha do conde de Urgel, cujo contrato de casamento viria a ser
firmado em inícios de Agosto de 1428.
Concluído o acordo, a agora pequena comitiva portuguesa segue então viagem por
rotas terrestres através de Aranda, Valladolid e Zamora, cruzando a fronteira
luso-castelhana nos inícios de Setembro de 1428.
O Mediterrâneo e Ceuta
Ao longo dos cinco anos seguintes, voltamos a não ter qualquer notícia
do trajecto de Álvaro Vaz Almada, sendo provável que tenha permanecido a maior
parte do tempo em Portugal, certamente envolvido nas actividades inerentes ao
seu cargo de capitão-mor, no qual é confirmado por João I, através de carta
datada de 5 de Janeiro de 1433 e,
nos inícios de 1434, pelo novo rei, Duarte I. Será também este monarca que, por
essa mesma altura, lhe reitera a posse de diversos bens que haviam pertencido a
seu pai, designadamente um casal em Alconena, no reguengo de Algés; a coutada
de um pinhal e de um lugar no termo de Almada chamados, respectivamente, Cavala
e Vai-lhe-Bem; e ainda, embora já em 1436,
a renda da sisa dos judeus do reino. É por esta mesma altura, ou seja, em 1434
ou 1435, que Álvaro Vaz, ao comando de três embarcações, conduz uma
ofensiva contra os navios genoveses. Parece, no entanto, que não se tratou de
uma operação levada a cabo ao serviço da Coroa e, portanto, de acordo com
directivas do rei Duarte I. De facto, a Crónica
de D. Pedro de Meneses sugere ter-se tratado, isso sim, de uma
expedição punitiva e de retaliação pelos certos
danos, anteriormente provocados em alguns navios mercantes de Álvaro Vaz, que
provavelmente teriam sido abordados e pilhados por uma frota oriunda da cidade
de Génova. A isso o capitão-mor terá respondido da mesma forma, ou seja, com um
autêntico acto de pirataria, conduzido a título individual e, ao que parece,
exclusivamente com os seus próprios meios. E tudo indica que a expedição foi
bem sucedida, saldando-se na captura de uma carraca genovesa e ainda de algumas
embarcações muçulmanas, das muitas que cruzavam o Mediterrâneo.
É na fase final desta campanha naval, provavelmente no regresso a Portugal,
que os seus navios aportam na cidade de Ceuta, certamente para se reabastecerem
de água e de mantimentos. Álvaro Vaz é então recebido pelo capitão-mor, o conde
Pedro Meneses, um velho conhecido, que de imediato o desafiou a participar numa
cavalgada contra território muçulmano. Contudo, talvez devido à sua falta de
experiência nesse tipo de acções e, em particular, devido ao desconhecimento do
terreno e das tácticas habitualmente usadas pelo adversário, as forças que
comandava acabaram por ser atacadas por um contingente inimigo, tendo então
corrido mesmo o risco de ser morto, ferido ou capturado. Valeu-lhe a rápida
intervenção do conde e dos seus homens, que conseguem repelir o inimigo e infligir-lhe
um pesado número de baixas. Ao que se sabe, foi a única acção em que se
envolveu durante esta breve passagem por Ceuta, tendo regressado a Portugal
pouco tempo depois. Terá, sido por esta mesma altura que contraiu matrimónio
com a filha de Álvaro Cunha, D. Isabel Cunha, de quem teve dois filhos: João e
D. Isabel, encontrando-se já casado em inícios de Janeiro de 1436.
Tânger. A miragem e o desastre
O primeiro semestre de 1437 foi
todo ele marcado pelo planeamento e organização da expedição a Tânger, a
segunda investida portuguesa contra as praças-fortes do litoral norte-africano
e para a qual a Coroa contava reunir um total de 14 000 efectivos: 3500 homens
de armas, 500 besteiros de cavalo e 2500 besteiros de pé, 7000 peões e 500 auxiliares.
Como comenta Luís Miguel Duarte, tratava-se de um exército quase ideal, bem proporcionado. E sendo Álvaro Vaz o titular do
cargo de capitão-mor da frota, não espanta que tenha também integrado essa
campanha, cujos preparativos se encontravam já praticamente concluídos em
inícios de Agosto de 1437, com
homens, mantimentos e navios, nomeadamente os seus, a concentrar-se em Lisboa,
a partir de onde rumam em direcção ao Norte de África. Contudo, no dia 27 de
Agosto, durante o alardo que teve lugar imediatamente após a chegada a Ceuta,
onde a frota fez uma primeira escala e onde Álvaro Vaz se reencontrou com Pedro
Meneses, foram contabilizados apenas 2000 homens de armas, 1000 besteiros e
3000 peões, ou seja, menos de metade do que inicialmente se esperava e uma
cifra que poderia colocar em xeque o sucesso da campanha. Em boa medida, isso
devia-se ao facto de não terem sido mobilizadas todas as embarcações
inicialmente previstas, circunstância que levou a que só uma parte do exército
rumasse para sul, mas que não foi considerada determinante para levar ao
adiamento da campanha». In Miguel Gomes Martins, Guerreiros
Medievais Portugueses, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2013, ISBN
978-989-626-486-4.
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