Pelo sonho é que vamos
«Pelo sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos, não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.
Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia a dia.
Chegamos? Não chegamos?
Partimos. Vamos. Somos».
Os que vinham
da dor
«Os que vinham da Dor tinham nos olhos
estampadas verdades crudelíssimas.
Tudo que era difícil era fácil
aos que vinham da Dor diretamente.
A flor só era bela na raiz,
o Mar só era belo nos naufrágios,
as mãos só eram belas se enrugadas,
aos olhos sabedores e vividos
dos que vinham da Dor diretamente.
Os que vinham da Dor diretamente
eram nobres de mais pra desprezar-vos,
Mar azul!, mãos de lírio!, lírios puros!
Mas nos seus olhos graves só cabiam
as verdades humanas crudelíssimas
que traziam da Dor diretamente».
Somos de barro
«Somos de barro. Iguais aos mais.
Ó alegria de sabê-lo!
(Correi, felizes lágrimas,
por sobre o seu cabelo!)
Depois de mais aquela confissão,
impuros nos achamos;
nos descobrimos
frutos do mesmo chão.
Pecado, Amor? Pecado fôra apenas
não fazer do pecado
a força que nos ligue e nos obrigue
a lutar lado a lado.
O meu orgulho assim é que nos quer.
Há de ser sempre nosso o pão, ser nossa a água.
Mas vencidas os ganham, vencedores,
nossa vergonha e nossa mágoa.
O nosso Amor, que história sem beleza,
se não fôra ascensão e queda e teimosia,
conquista... (E novamente queda e novamente
luta, ascensão... ) Ó meu amor, tão fria,
se nascêramos puros, nossa história!
Chora sobre o meu ombro. Confessamos.
E mais certos de nós, mais um do outro,
mais impuros, mais puros, nós ficamos».
Poemas de Sebastião
da Gama, in ‘Antologia’
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