Na morte do João Lopes
«Quando a vida que tu amavas tanto
começava a sorrir-te docemente,
a morte, velha audaz, furtivamente,
roubou-te da existência o terno encanto.
Alma de justo, coração de santo,
fosse esta dor amarga, dor pungente
que nos fere, elixir divino, ardente,
que te erguesse do fúnebre quebranto...
Mas já que tudo é vão, querido amigo,
adeus, adeus e até à eternidade.
deplorar tua infausta e negra sorte
Me resta, e gritar, mísero castigo,
das leis da vida à crua falsidade:
maldita sejas, vezes mil, ó morte!»
A lenda da maça
«Homem errante e triste e desgraçado
que fazes na miséria o teu caminho
e que entre multidões anda sozinho
à dor do teu viver acorrentado.
Segue na treva teu escuro norte,
que a paz dourada, incerta, apetecida,
que na luta cruel buscas da vida,
os vermes ta darão na paz da morte.
E nem maldigas, homem desvairado,
do velho Adão o trágico atentado
contra as sagradas normas de Jeová.
A lei que te condena, a lei tirana,
é tua pobre condição humana,
é ingénua lenda o furto da maçã...»
Sonetos de Acácio
Matias, in ‘Fora de Moda, Ponte de
Lima 1949’