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Metida no Mosteiro de Santa Domingo de Toledo
«(…) Convém não esquecer que, até ao Concílio de Trento (1545-1463),
este tipo de instituições religiosas foram muitas vezes refúgios onde iam parar
mulheres de altíssima linhagem por causas que pouco tinham que ver com a
religião. Era o caso das duas citadas prioresas e era agora o de Joana.
A qual, como todas as infantas, teria recebido, a partir dos cinco anos,
diversas normas sobre a boa conduta, certos padrões superficiais de comportamento,
e alguma breve oração, mas que, ao entrar em Santo Domingo el Real de Toledo,
já com seis anos e meio, começaria a receber uma formação mais regrada, baseada
em matérias como gramática e escrita (em castelhano), cálculo, música (provavelmente
sacra) e, sobretudo, doutrina cristã. A monja Catalina de Castilla não só
gozava de fama de mulher culta, como também possuía uma aguda consciência de
pertencer à anterior dinastia real de Castela, a Casa de Borgonha, ainda que
por bastardia. O facto de a mãe do seu ilustre avô ter sido a infanta Maria de
Portugal, filha de Afonso IV, convertia a mestra de Joana em prima afastada da
sua aluna, algo de que a religiosa estaria provavelmente muito orgulhosa e que certamente
utilizaria para ganhar posições no convento. No segundo dia de Outubro de 1445, a rainha María de Aragão escreveu
uma carta a um dos filhos do prior do Crato que acompanhara a rainha Leonor a
Castela, informando-o de que dera novas instruções ao seu embaixador para tratar
com o rei de Castela os assuntos respeitantes a Joana. Uma infanta, Joana,
que não parece ter-se sentido nada deprimida pela clausura mas sim preocupada
com o futuro dos antigos servidores da mãe. É pelo menos isso que se deduz de
uma carta da sua tia, a rainha María, datada de vinte dias mais tarde, dirigida
à ilustre dona Johana, infanta de Portugal
e do Algarve, nossa muito cara e muito amada sobrinha, na qual a rainha
aragonesa confirmava à criança que recebera a sua carta e lhe respondia que não
podia dar mais ajuda sobre los que nos
escribisteis de los portogalesos que com vos son.
Alguns dias mais tarde, María de Aragão reconsiderou o pedido dessa
criança de seis anos e meio e decidiu ajudar os servidores portugueses que o
regente Pedro não queria aceitar de volta a Portugal, interessando-se pela
sorte de alguns desses portogalesos e
dando-lhes o dinheiro necessário para que pudessem viajar para Itália para servir
o seu marido. Se bem que com grande parcimónia, uma vez que mandou descontar a
despesa das viagens dos quinhentos florins que a infanta recebera como
pagamento das rendas dos domínios da sua mãe em Alcolea de Cinca. Mas a rainha
aragonesa tratou ao mesmo tempo de recomendar esses servidores aos funcionários
italianos do seu magnânimo marido. Como demonstra uma carta de meados de Novembro
de 1445, dirigida às autoridades
marítimas do reino de Nápoles, em favor de Cide Sousa, o antigo escudeiro da
rainha Leonor, que também fizera parte do grupo de fiéis servidores que
acompanhara a mãe de Joana e que, anos mais tarde, seria o membro mais
importante da casa castelhana da rainha Joana. Por meio dessa missiva, María
ordenava aos oficiais do seu marido que entregassem setenta florins a Cide, para
que este pudesse dirigir-se à Sicília, em cuja antiquíssima marinha, de raízes
bizantinas, ia prestar serviço, por disposição do rei de Aragão. Uma tarefa que,
sem dúvida, seria preciosa para esse jovem que anos mais tarde realizaria
expedições marítimas em territórios africanos ao serviço de Afonso V de
Portugal.
No dia de Reis de 1446, a
rainha de Aragão mandou entregar oitenta florins, descontados da renda de
Joana, aos filhos do prior do Crato, dois monges cavaleiros da linhagem de
Góis, para que pudessem deixar Toledo e viajar até Nápoles. Dois dias depois,
constatando que não podia fazer tudo o que lhe pedira a sobrinha, movida pela
angúsda e pela compaixão, María assinou um memorando dirigido aos seus embaixadores
em Castela para que eles intercedessem perante o seu irmão de modo a que este
escrevesse de novo ao regente de Portugal e lhe solicitasse permissão para o
regresso dos restantes servidores de Leonor à sua pátria, com a devolução dos
bens expropriados. Por posteriores registos da chancelaria portuguesa, sabemos
que o regente concederia essa possibilidade a muito poucos, e a maioria haveria
de esperar até à morte daquele governante para regressar a Portugal. Passados os
três primeiros meses da estada de Joana em Santo Domingo el Real de
Toledo, as negociações do matrimónio da sua prima, a filha do infante João de
Portugal, encetadas com rapidez, tornaram-se mais lentas, ou porque tivesse
havido desacordo entre as partes a respeito do dote ou porque tivesse havido
falta de convicção do noivo para casar com uma mulher que não considerava à
altura do seu prestígio. O seu verdadeiro desejo era fazê-lo com uma filha do
rei de França e não com a de um infante não primogénito que, além disso, os
portugueses queriam que renunciasse à riquíssima herança da avó materna, filha
única do condestável Nuno Álvares Pereira, herói de Aljubarrota». In In A
Rainha Adúltera, Joana de Portugal e o Enigma da Excelente Senhora, Crónica de
uma difamação anunciada, Marsilio Cassotti, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2012,
ISBN 978-989-626-405-5.
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