quarta-feira, 22 de abril de 2015

Escritos Políticos. M. S. «Foi, porém, a partir de 1945 que a sua acção política mais se fez sentir, através de uma intervenção pública permanente e exercida nas mais difíceis condições. Companheiro do querido e inesquecível Bento Caraça…»

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Um exemplo
«A morte do professor Mário Azevedo Gomes vem abrir um vazio imenso na sociedade portuguesa. Com os seus oitenta anos, que por poucos dias não chegou a completar, o nosso professor (como sempre lhe chamávamos, desde 1945!) estava no pleno vigor das suas excepcionais faculdades, com a mesma energia, o mesmo idealismo, a mesma capacidade de entusiasmo e de indignação que sempre lhe conhecemos. Podemos dizer, com respeito, que morreu um lutador, e que morreu em combate! Um lutador que pela sua persistência, lucidez e coragem foi um verdadeiro herói cívico, lídimo representante e verdadeiro chefe moral daquela Oposição que ele próprio classificou (porque a frase pertence-lhe!) de provadamente indomada e indomável (esta frase, depois muito repetida e glosada, apareceu, pela primeira, vez, no manifesto à nação do general Norton de Matos, como candidato à presidência da república, de Julho de 1948. Completa, é assim: Trata-se evidentemente de um candidato de oposição ao regime actual. Mas de um candidato que exprime uma forte corrente, provadamente indomada e indomável).
É cedo para traçar, ainda que em esboço rápido, as linhas mestras que melhor caracterizam a grande figura nacional ontem desaparecida. Filho de um pai que deixou um nome na marinha portuguesa e que, no seu amor pela República, foi companheiro dilecto de Cândido Reis, Mário Azevedo Gomes pertenceu à geração académica que fez a greve de 1907, na qual participou, como representante da Academia de Lisboa, ao lado de Pulido Valente, de Fidelino Figueiredo e de alguns outros. Professor de Silvicultura do Instituto Superior de Agronomia, agrónomo dos mais distintos e mestre de silvicultores, Mário Azevedo Gomes foi, acima de tudo, um professor, em todos os aspectos da sua múltipla actividade e, nomeadamente, na política. Não foi nunca um homem de partido ou um desses políticos por vocação que se comprazem no jogo subtil das dosagens de ambições e de influências. Foi um doutrinador. Vindo para a política activa por imperativos de ordem cívica, avesso por temperamento a todas as formas de demagogia, a sua acção inicia-se na Seara Nova, a cujo corpo directivo pertenceu, desde 1924, ao lado de homens da estirpe de Raul Proença, António Sérgio, Jaime Cortesão e Câmara Reys, mantendo-se fiel, pelos anos fora, às concepções dominantes daquele grupo, apostado sobretudo na reforma da mentalidade nacional segundo o princípio, inscrito desde o primeiro número da revista, de que em democracia quem mente ao Povo é réu de alta traição. Republicano desde o berço, democrata e socialista, Azevedo Gomes participou no ministério de renovação de Álvaro Castro, em 1924, como representante da Seara Nova, sobraçando a pasta da Agricultura, onde realizou obra apreciável conforme se vê da leitura do seu livro Dois, meses no Ministério da Agricultura.
Foi, porém, a partir de 1945 que a sua acção política mais se fez sentir, através de uma intervenção pública permanente e exercida nas mais difíceis condições. Companheiro do querido e inesquecível Bento Caraça, a cuja individualidade política prestou sempre a mais rasgada das homenagens, amigo dilecto de António Sérgio, a quem nunca deixou de reconhecer autoridade intelectual, o sentido de uma escrupulosa objectividade, feita à custa do apagamento propositado da sua pessoa, levou Azevedo Gomes, não por falsa modéstia ou por medo das responsabilidades, mas por um entendimento superior do seu dever de militante, a ceder sempre, nas campanhas políticas em que se empenhou, o primeiro lugar, para que tantos dos seus amigos tão contínua e justamente o empurravam. Foi assim com Norton Matos, em 1949; e foi assim, mais tarde, com Jaime Cortesão, após o seu regresso do Brasil, após o seu regresso do Brasil, em 1952. De resto, a íntima colaboração destes dois homens, Cortesão e Azevedo Gomes, ambos mestres de cidadania, unidos por amizade exemplar, por mútuo respeito e por mútua admiração, foi uma das lições mais fecundas e exaltantes que nos legaram». In M. S. Escritos Políticos, Edição do Editor, Lisboa, Editorial Inquérito, 1969, Arquivo Nacional da Torre do Tombo.

Cortesia ANTT/JDACT