A fina-flor do reino de Dinis I
«(…) Filho de dona Grácia Anes, mulher
de qualidade, natural de Torres Vedras, senhora da Ribeira de Sacavém, que
era proprietária de umas casas a par da Sé de Lisboa, onde seu filho veio a
fundar um hospital, e de duas tendas à Porta de Ferro, doadas pelo monarca Dinis
I, Pedro Afonso foi beneficiado pelo rei seu pai com grandes e valiosas doações, a primeira das quais ocorreu em 1289. Entre esse ano e o de 1306, recebeu bens em Estremoz, Évora-Monte,
Sintra e Tavira, bem como a terra de Gestaçô. E, em 1307, foi nomeado mordomo da infanta dona Beatriz, sua cunhada. Já
então Pedro I estaria viúvo de dona Branca Pires (ou Peres) Portel, com quem
terá casado no último ano do século XII ou no primeiro do século seguinte.
Herdeira de uma das maiores fortunas senhoriais daquele tempo, dona Branca deu
à luz um filho que sobreviveu o tempo suficiente para seu pai [o dito Pedro
Afonso] herdar a parte da casa de Sousa possuída por sua mãe. Em 1308, o primogénito de Dinis Ivoltou a
casar, desta feita com Maria Ximenez Coronel, uma das damas que viera de Aragão
com a rainha Santa e que esta se empenhou em unir ao bastardo do marido,
requerendo a seu irmão, o rei Jaime II, que consentisse naquela união por amor de nós e para nos fazerdes prazer.
Em 1314, Pedro Afonso foi feito
conde de Barcelos, sucedendo ao 2.º conde, Martim Gil, seu parente por
afinidade, a quem também sucedeu no posto de alferes-mor, que conservou até morrer.
Quando, na guerra contra Dinis I, tomou o partido do infante Afonso,
seu meio-irmão, houveram os outros irmãos
deles mui grande escândalo e buscaram-lhe mal com el-rei seu pai, como o
próprio conde há-de escrever na sua Crónica de Espanha de 1344. E tanto foi
crescendo este escândalo que houveram dom Afonso Sanches e seu irmão [João
Afonso] de ajuntar todos seus vassalos e amigos e ainda grande parte dos
d'el-rei por seu consentimento e enviaram todo este poder com João Afonso que
fosse fazer mal e desonra a seu irmão, o conde Pedro., Desafiado, o conde de
Barcelos, que era muito amado dos filhos
d'algo, reuniu tantos vassalos e
amigos que foram mãos que os outros. E esperou pelo ataque em Pinheiro de Ázere,
próximo de Santa Comba Dão. Mas o combate não se travou porque o infante Afonso
veio de Lisboa por partir a contenda.
Depois disso, porém, ordenou Afonso Sanches com el-rei que tolhesse a
terra ao conde Pedro e ele foi-se para Castela, e andou lá quatro anos e meio,
entre 1317 e 1322. Durante esses anos, agravou-se o conflito entre o
monarca Dinis e o seu filho legítimo, que, instigado por mentirosas palavras de intriguistas, não desistia de abater o poder
e a influência que no pai tinha Afonso Sanches, em quem o monarca depositara
toda a sua complacência.
O bastardo muito amado do rei
Trovador (o qual, reconhece o conde de Barcelos, fazia muito do que ele
queria) era filho de dona Aldonça Rodrigues Talha. Nascido talvez em 1286, mas, em qualquer caso, antes de 1289, Afonso Sanches tivera por tutores
Pedro Afonso Ribeiro e, mais tarde, a própria rainha Santa, sua madrasta (por
carta passada na Guarda, a 21 de Junho de 1298). Já então tinha recebido várias doações de seu pai, que o
casou, antes de 1307, com dona
Teresa Martins Telo, filha do 2.º conde de Barcelos, e que, em 1312, o nomeou seu mordomo-mor. Afonso
Sanches conservaria essas altas funções até 1322. Perdeu-as porque foi essa uma das condições impostas pelo
infante Afonso para firmar tréguas com o pai nesse ano de 1322. Mas essas tréguas não puseram definitivo termo à guerra
civil. E só a 26 de Fevereiro de 1324,
em Santarém, é que as pazes foram finalmente estabelecidas, depois dos esforços
nesse sentido desenvolvidos pela rainha Santa Isabel, boa advogada de causas barulhentas e perniciosas, e também pelo
conde de Barcelos, entretanto regressado de Castela. Com essas pazes, o
infante, obtendo a solene garantia da sucessão do trono, alcançava também que
Afonso Sanches fosse afastado da corte, a troco de dez mil libras que lhe foram
dadas como compensação. O bastardo refugiou-se em Castela. Mas Afonso não o
esqueceu nem lhe perdoou». In Isabel Lencastre, Bastardos Reais, Os
Filhos Ilegítimos dos Reis de Portugal, Oficina do Livro, 2012, ISBN 978-989-555-845-2.
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