Os Fenícios: suas deusas impuras, que
afinal eram os órgãos sexuais da mulher
«(…) Nas festas de Astarte, era
enorme a multidão aglomerada nos templos, multidão que não se compunha só de
fenícios, mas também de estrangeiros, porque o obsceno culto da deusa
lisonjeava as paixões de todos os povos. A deusa Astarte de Tiro e Sídon encontrava
facilmente adeptos por toda a parte para onde era levada. Os adoradores de Milita,
Anaítis, Urânia, Mirta, ou de qualquer outra divindade propícia aos extravios
da sensualidade, não podiam mostrar-se adversos à boa deusa fenícia, tão
condescendente para todas as fraquezas, tão propensa a favorecer o vício! Sob a
tenda sagrada onde as mulheres fenícias, casadas ou solteiras, e as escravas
dos mercadores esperavam as carícias dos romeiros, havia lugar amplo para
todos, e o estrangeiro, o hóspede, era recebido até com uma notável
predilecção. Eram para ele as mulheres mais formosas e as provocações mais
lascivas, e quando o sacerdote fazia ressoar o pandeiro religioso, os braços
voluptuosos das sacerdotisas de Astarte abriam-se para quem queria, num
abandono prometedor das mais requintadas delícias. Mais tarde, nestas cerimónias
lúbricas, o pandeiro sagrado foi substituído por instrumentos mais
aperfeiçoados e a lira, a flauta e o saltério dos orientais vieram estimular a
libertinagem dos actores, juntando o seu encanto voluptuoso à música dos ósculos
ardentes daquelas mulheres sensuais. Às festas de Astarte associavam-se também
as festas de Adónis. Depois dos sacrifícios a Posídon, o deus marinho protector
dos navegantes, Adónis, a personificação divina da natureza máscula, recebia
também as homenagens dos fenícios. Em honra deste deus caçador devorado por um
javali, e continuamente chorado por Vénus, celebravam-se as festas fúnebres e
as festas da alegria. As festas fúnebres constavam de lamentações e, durante
elas, a imensa multidão cosmopolita vagueava em torno do templo, onde as
mulheres iam sacrificar ao deus o seu pudor e os seus cabelos. Ao coro de
lamentações sucediam-se bem depressa as fustigações. As mulheres batiam-se
mutuamente com as mãos, e às vezes com varas. Sob o pórtico estava, nesses
dias, a estátua falófora do deus ressuscitado e, apenas o simulacro aparecia,
casadas e solteiras eram obrigadas a ceder os cabelos ao altar ou o corpo à
prostituição. Quando se obstinavam em conservar as tranças, dirigiam-se a uma
espécie de mercado, onde desta vez só os estrangeiros podiam ter acesso. Conta
Luciano que essas pobres mulheres estavam ali à venda um dia inteiro,
entregando-se ao tráfico desonesto todas as vezes que eram solicitadas e
retribuídas. Depois das festas patéticas, seguiam-se as festas da alegria e, por
essa ocasião, praticavam-se no recinto do templo espantosas monstruosidades. Os
Fenícios chamavam a Astarte a mãe dos deuses. Instalando-se nas costas
meridionais da Espanha, este povo não tardou a corromper os costumes primitivos
dos indígenas, que seduziam com o seu comércio e com os seus costumes
dissolutos. Até ao promontório sacro, hoje cabo de São Vicente, o litoral do
Algarve foi logo povoado de feitorias fenícias e, por toda a parte, o culto
depravado de Astarte encontrou milhares de prosélitos». In Alfredo Amorim Pessoa, Os bons
velhos tempos da prostituição em Portugal, Antologia, 1887, Anotações, 1976,
Antígona_Frenesi, 2006, Lisboa, ISBN 972-608-175-0.
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