quinta-feira, 23 de julho de 2015

Uivo. Cadernos de Poesia. Allen Ginsberg. «… a sua própria insanidade e as mãos vazias e um júri parcial. A cdu, que num protesto com humor e boa clareza derrubaram e voltaram de pernas para o ar as políticas actuais»

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Uivo
[…]
Que caíram de joelhos em catedrais sem esperança
orando pela salvação de cada um dos outros, e
pela luz e pelos seios, até que o cabelo da alma
se iluminou por um segundo,
que na cadeia abriram um caminho à força através
dos seus espíritos aguardando criminosos impossíveis
com cabeças douradas e o encanto
da realidade nos seus corações que cantavam
doces blues em glória de Alcatraz,
que se retiraram, reformados, para o México, para
aí cultivarem o vício, ou para as Montanhas Rochosas
para adorarem Buda, ou para Tânger
por causa dos rapazes ou para o South Pacific
por causa da locomotiva negra da antiga companhia
South Pacific ou para Harvard por narcisismo,
ou para Woodlawn por causa da sepultura,
que exigiram inquéritos à sua própria sanidade
mental acusando a rádio de hipnotismo e no fim
ficaram com a sua própria insanidade e as mãos
vazias e um júri parcial.

Que atiraram salada de batata na Universidade de
New York aos conferencistas sobre dadaísmo e
posteriormente se apresentaram nos degraus de
granito do manicómio com as cabeças rapadas e
falando arlequinisticamente de suicídio, exigindo
uma lobotomia imediata,
e a quem, em lugar disso, deram o vazio concreto,
insulina metrasol electricidade hidroterapia psicoterapia
terapia ocupacional pingue-pongue de
amnésia,
que num protesto sem qualquer sentido de humor
derrubaram e voltaram de pernas para o ar
apenas uma mesa de pingue-pongue simbólica,
descansando momentaneamente num estado catatónico,
regressando anos depois verdadeiramente calvos;
isto é com uma cabeleira de sangue, e lágrimas
e dedos, para o visível destino do louco, os pátios
das cidades dos loucos do Este,
os vestíbulos fétidos dos manicómios de Pilgrim
State, de Rockland e de Greystone, discutindo
com os ecos da alma, no rock-and-roll dos reinos
dos loucos solitários da meia-idade do amor, em
que o sonho da vida é um pesadelo, corpos tornados
pedra tão pesada quanto a lua.

Com a mãe finalmente..., e o último livro fantástico
lançado pela janela do cubículo, e a última
porta fechada às quatro horas da manhã e o
último telefone violentamente desligado sem
ninguém responder e o último quarto alugado
mobilado agora vazio sem qualquer peça de
mobiliário mental, uma rosa de papel amarelo
torcida no cabide de arame dentro do armário,
e até mesmo ela não passando da mais pura
imaginação, nada, nada excepto um esperançoso
tudo nada de alucinação;
ah, Karl Pedro, enquanto tu não estiveres em segurança
também eu não o estarei, e tu agora estás mesmo
atolado no nevoeiro completamente animal do
tempo,
e que portanto correram pelas ruas geladas obcecados
por um súbito relâmpago da alquimia do
uso da elipse do catálogo do metro e do plano
vibratório,
que sonharam e abriram brechas que encarnaram
no Tempo e no Espaço por meio de imagens
justapostas, e encurralaram o arcanjo da alma
entre duas imagens visuais e juntaram os verbos
elementares e puseram o nome e a tomada de
consciência juntos a saltarem com a sensação
para recriar a sintaxe e a medida da pobre prosa
humana e ficar diante de vós calado e inteligente
e a tremer de vergonha, rejeitado contudo confessando
a sua alma, em voz alta para se conformar ao ritmo
do pensamento dentro da sua
cabeça nua e infinita.
[…]
Poema de Allen Ginsberg, in ‘Uivo

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