O Pai
de dona Leonor em Castela
«(…) Dona Maria, filha de Afonso IV
de Portugal, celebrou as suas bodas de casamento com Afonso XI, rei de Castela,
em Alfaiates, no ano de 1328, e em 1333, na cidade de Burgos, o casal foi coroado.
O consórcio não terá sido feliz, pois o monarca, dois anos depois de casar, não
conseguindo que Maria engravidasse, iniciou uma relação amorosa com uma fidalga,
Leonor Nunes Gusmão, de quem veio a ter muitos filhos. Esta relação manteve-se até
ao final da vida de Afonso, apesar dos esforços dos seus vassalos e do seu
sogro para que findasse. Leonor era a sua conselheira e exercia sobre ele e sobre
o reino o verdadeiro poder. Reza a crónica que era em casa dela que Afonso XI reunia
o seu Conselho e desembargava os assuntos do reino. Leonor estava rodeada dos melhores
prelados e ricos-homens do reino, que lhe beijavam a mão e a tratavam como se ela
fosse rainha de Castela. Quando o monarca partia em campanhas contra os mouros ou
estava fora por outras razões, os oficiais de justiça e de chancelaria ficavam
com ela.
Mas dona Maria acabou por engravidar
e Leonor de Gusmão temeu que a rainha desse a Afonso o desejado filho legítimo,
facto que impediria que um dos seus ascendesse à Coroa. Para evitar tal episódio,
Leonor de Gusmão encomendou um feitiço a uma moura capaz de matar dona Maria e o
seu rebento. No entanto, depois de dez dias e oito horas de parto agonizante, a
rainha foi socorrida por um físico e astrólogo judeu que o monarca mandara chamar
e que foi capaz de quebrar o encantamento. O infante Pedro, futuro Pedro I de
Castela, o Cruel, nascia, pois, a 21
de Agosto de 1333. Apesar da
alegria com que Afonso XI acolheu este acontecimento, a relação com a concubina
manteve-se até ao final da sua vida. A rainha era preterida, recebendo Leonor Gusmão
muitas das terras que tradicionalmente costumavam ser entregues às consortes legítimas
dos monarcas de Castela.
Os melhores oficiais da rainha dona
Maria foram-lhe retirados pelo próprio marido e alguns foram entregues aos filhos
de Leonor Gusmão. A crónica fez menção de que um dos que saiu foi Rodrigo Álvares
Astúrias, mordomo-mor de dona Maria, mas não indicou se foi servir os bastardos
do rei. Ora, para nós, é importante registar que, por volta de 1333, a rainha ficou sem o seu mordomo-mor,
já que sabemos que Martim Afonso Telo, pai de dona Leonor Teles, veio a ocupar este
cargo, talvez logo nesta ocasião, ou apenas em 1340, conforme aventou Monteiro Machado. Este estudioso propôs esta
data baseando-se na hipótese de que a formosíssima
dona Maria, rainha de Castela, teria recrutado para seu mordomo-mor o dito Martim
Afonso Telo ao vir a Évora pedir ao pai com
grande humildade e muitas lágrimas auxílio militar na batalha (a dita Batalha
do Salado) que o marido iria travar contra os reis de Marrocos e de Granada. Anselmo
Braamcamp Freire acrescentou, por seu lado, que Martim Afonso Telo se veio a tornar
amante da rainha de Castela, a infeliz dona Maria de Portugal.
Assim, tem sido relativamente consensual
na historiografia portuguesa aceitar que os pais de dona Leonor Teles viveram
em Castela, entre 1340 e 1356, (ano em que Martim Afonso Telo foi assassinado) e que
os seus filhos terão lá vivido e talvez até nascido. A nossa investigação, porém,
propõe-nos datas e convicções diferentes. Primeiro: lendo com atenção a crónica
do rei Pedro, de Pero López Ayala, e não possuindo outras fontes, julgamos que Martim
Afonso Telo passou a estar ao serviço da rainha dona Maria, em 1354, que morreu, de facto, em 1356, e que, durante este período, é provável
que os dois tenham sido amantes. Segundo: consideramos muito possível que
dona Leonor Teles tenha nascido em Portugal, possivelmente em Trás-os-Montes, como
Fernando afiançou». In Isabel Pina Baleiras, Uma Rainha Inesperada, Leonor Teles, Temas e
Debates, Círculo de Leitores, 2013, ISBN 978-989-644-230-9.