A renitente autorização do pai
«(…) Em Agosto, o duque Ernesto
escrevera ao irmão Fernando Jorge sobre os projectos de Vitória para o seu
filho mais velho, carta que revela que já nesta altura o duque Fernando estava
ao corrente do que se passava. O irmão mais velho diz-lhe que entende a sua
surpresa e que precisam de falar pessoalmente, por ser matéria demasiado
complicada para ser tratada por carta. Pede-lhe que se reúnam em Toplitz.
Adianta logo que a questão é tão honrosa para o sobrinho e para toda a família
que não pode ser ignorada, que de facto a família já foi alvo de inveja e de
ressentimento, mas que quando Deus quer agraciar, não pode ser estorvado.
Espera, pois, e com ansiedade, a sua resposta. Três dias depois volta a escrever-lhe,
enviando a carta por Carlowitz, seu ministro. Diz-lhe agora que já deve ter lido
a sua missiva anterior e tem a certeza de que aceitará a posição brilhante e
honrosa que oferecem ao seu filho, mas há que conhecer as condições que lhe
serão dadas. Gostaria também de saber o que pensa o sobrinho, acrescentando que
nada receia, pois apesar da sua juventude tem bom discernimento. Depois de
Fernando Jorge ter tomado aquilo que ele, Ernesto, considera a boa decisão, que
o informe de tudo para poder ajudar. E acalma os receios do irmão perante uma
provável oposição de Metternich, até porque as condições do acordo seguirão
pela embaixada da Inglaterra. Insiste num encontro. Se não em Toplitz, não
poderá pelo menos deslocar-se a Praga? Ou enviar os filhos mais velhos a
Toplitz, onde ele estará, assim como a czarina da Rússia2? Ou seja, o duque de
Coburgo faz uma pressão cerrada para demover o irmão de todos as suas dúvidas e
receios, manipulando tanto quanto pode.
A carta que Ernesto escreve a 8
de Setembro revela-nos que, de facto, o duque Fernando viajara pela Hungria,
respondera a Ernesto a 28 de Agosto, de Ebenthal, e ainda não tinha lido a
carta que Vitória lhe enviara juntamente com a de Lavradio, a quem deixara até
então sem resposta. Mas agora, diz-lhe Ernesto, que já está bem inteirado do
que se passa, o melhor é encontrarem-se os dois e o sobrinho para se tratar do
assunto e negociá-lo como questão que respeita à família, o que lhe poupará
muitos dissabores. Isto é, o duque reinante em Coburgo-Gotha procurava retirar
margem de manobra ao governo imperial da Áustria. Nesse mesmo dia 8 de Setembro,
vimos que Fernando Jorge respondeu a Lavradio, uma resposta que o não era, como
comentou Palmerston. Escreveu também ao irmão. Debatia-se entre sentimentos
contraditórios, entre eles a dor de se separar para sempre do filho e herdeiro,
o que nunca fizera parte dos seus planos. Ernesto respondeu-lhe de imediato,
pressionando e manipulando mais do que nunca. Embora entendendo o que o irmão
sente diz, avisa-o de que se recusar irá lamentar a sua decisão, será acusado
de ter despojado o filho de um futuro excelente que lhe oferecem, o que é uma felicidade
rara, um sinal da Providência divina que não se pode ignorar e que se deve
seguir com confiança. Que deixe Lavradio vir a Coburgo e aí negociarão, o que
terá de ser feito com muito cuidado, mas que não adie mais a questão, sob pena
de a ver posta de lado, pois foi com horror que soube que a carta de Lavradio
esteve quase dois meses sem resposta. O duque reinante dominava-se, mas estava
furioso com o irmão, Insiste numa reunião e que ele vá com os filhos e a mulher
para Coburgo. Por fim, que considere ir a Bruxelas conferenciar com Leopoldo
porque o assunto é muito sério.
O
convite a toda a família tinha, sem dúvida, por intuito afastá-la das intrigas
políticas de Viena e do alcance de Metternich. Seria questão familiar tratada
na capital do ducado independente com o chefe de família. O duque tinha razão,
porque o chanceler austríaco tentaria impedir o casamento, como Lavradio
testemunha: Outra, porém, era a guerra
que se me deparava na Alemanha, guerra do partido absolutista, habilmente
conduzida pelo príncipe de Metternich, que, por diversos princípios, fazia a
máxima oposição possível à conclusão do casamento. A situação de Fernando
Jorge Coburgo era muito delicada. Criar um conflito com Metternich podia
comprometer o seu futuro e o dos outros filhos e é a essa luz que se pode
compreender a sua atitude». In Maria Antónia Lopes, D. Fernando II, Um
Rei Avesso à Política, Círculo de Leitores, 2013, ISBN 978-972-42-4894-3.
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