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O que
se sabe sobre Bernardim Ribeiro
«Não
existe nenhum documento de interesse biográfico sobre Berrnardim Ribeiro.
Crê-se que nasceu na vila do Torrão,
no Alentejo, por uma alusão que assim pode ser interpretada numa das suas
éclogas. É certo que frequentou a corte onde foi poeta conhecido, pois figura
entre os colaboradores do Cancioneiro
Geral, de Garcia Resende (a menos que esse Bernardim Ribeiro não fosse o
mesmo que escreveu a Menina e Moça…), e Sá Miranda
refere-se-lhe em obras suas como amigo e companheiro de letras e, com as suas
éclogas, introdutor do bucolismo em Portugal. A partir da data da publicação do
Cancioneiro Geral, 1516, pode conjecturar-se que nasceu na última ou penúltima
década do século anterior. Quanto à data da sua morte, se a cópia da Menina e
Moça contida no manuscrito conhecido como de Eugenio Asensio é de facto anterior a 1543, como ele supõe, e
atendendo à quase certeza que se pode deduzir do estado do texto e da adenda
que ele traz, de que o autor morrera alguns anos antes, deverá situar-se
próxima de 1540, ou até 1536.
É
tudo. A viagem a Itália com Sá Miranda é duvidosa, como duvidosa é a identificação
deste Bernardim Ribeiro com contemporâneos seus desse nome, de quem há
referências. Provadas como falsas estão todas as invenções que se têm escrito
sobre a identidade, ocupações, amores e doenças. As datas em que foram escritas
as suas obras são igualmente desconhecidas. As 12 poesias que lhe são
atribuídas no Cancioneiro Geral, anteriores a 1516, e a Écloga III, aparecida
em folha volante com a data de 1536, são provavelmente as únicas cuja
publicação se fez antes de o poeta morrer. A Menina e Moça é seguramente dos
últimos anos da sua vida. A inexistência de mais dados sobre o autor dum
conjunto de obras que tiveram indubitavelmente reconhecimento público (três
edições no espaço de seis anos, cerca de quinze anos após a sua morte, numa época
em que a impressão de obras portuguesas não era frequente) não se explica
facilmente: A) doze poesias menores
incluídas no Cancioneiro Geral sob o nome de Bernardim Ribeiro; B) Menina e Moça, em prosa, incluindo
três composições em verso, o vilancete Pera tudo houve remédio, a cantiga à maneira de solau Pensando-vos
estou, filha e o romance de
Avalor; C) cinco Éclogas; D) sextina
Ontem pôs-se o sol e a noute; E)
romance Ao longo de üa ribeira;
F) duas cantigas e outras composições curtas incluídas na edição de
Ferrara.
Todas
estas obras, com excepção das incluídas no Cancioneiro Geral e do romance Ao
longo de üa ribeira, apareceram publicadas com indicação expressa de
autoria na edição de Ferrara, em 1554, a cargo de Abraão Usque, na edição de
Évora (com excepção das mencionadas em último lugar) em 1557, a cargo de de
André Burgos, na edição de Colónia, cópia da de Ferrara, em 1559, a cargo de A.
Birckmann. O romance Ao longo de üa ribeira, única composição portuguesa
inserida no cancioneiro castelhano de 1550 (segundo Carolina Michaelis), só
apareceu com as obras completas do poeta na edição de 1645. […]
Não tendo
nunca conseguido dissolver a sensação de estranheza que me causa a Menina e
Moça e escapar ao sentimento de um certo fracasso na tentativa de a perceber,
não me é possível propor uma leitura no sentido de interpretação globalizante,
capaz de integrar todos os elementos da novela e capaz de a integrar num quadro
cultural definido. Se esta reacção corresponde a uma situação de facto, é
possível que nunca venha a ser alterada, isto é, que a novela de Bernardim
esteja destinada a permanecer misteriosa e a originar periodicamente
apaixonadas e mais ou menos convincentes tentativas de interpretação. Mas admito
que a investigação de manuscritos e edições progrida e que o conhecimento da
época de Bernardim se alargue ao ponto de permitir chegar conclusões mais
fundamentadas e cabais. O que tenho a apresentar são algimas notas de leitura
e, por minha vez, algumas hipóteses. […]» In Teresa Amado, Introdução a Bernardim
Ribeiro (excerto), Menina e Moça de Bernardim Ribeiro, colecção Textos
Literários (Maria Alzira Aleixo, Lisboa, Editorial Comunicação, 1984, Fundação
Calouste Gulbenkian, Halp 13, 2000.
Cortesia
da FCGulbenkian/JDACT