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Digo-te já, Alonso, que talvez tenhamos sorte, respondeu Manuel, que era
ligeiramente mais alto, dando uma palmada no ombro do amigo. Espero bem que
sim. Foi uma desgraça completa em Jarandilla. Passámos semanas a fio sem uma
mulher. Tens razão, não havia lá nada para fazer. Só gente feia. Mas estas aqui
não estão nada mal. O problema é que cheiram mal. Tu também cheirarias se
tivesses de dormir com os animais durante o Inverno, seu idiota! Nós temos muita
sorte, sabes? Dormimos em cima do feno. Elas têm de dormir na palha, ao pé de
bosta de vaca e das cabras. Pelo menos é o que parece pelo cheiro. Então não
deve haver problema, desde que seja ao ar livre, não achas, Manuel? É mesmo
isso! Prenderam as túnicas de linho grosseiro dentro das calças castanhas, mal
cortadas mas resistentes, apertaram os cintos, ajeitaram os casacos de lã,
tapando com um capuz o cabelo penteado com os dedos. Por fim, cuspiram na
biqueira dos coturnos de couro e limparam-nos na parte de trás das pernas. Que tal? Estamos apresentáveis? Bom, vamos lá!
Alonso foi à frente, passando pelos enormes portões de madeira, escancarados em
sinal de boas-vindas, e atravessando o chão de gravilha para se juntarem a um
grupo de rapazes que também se estava a preparar. Meu Deus! Sentiste isto,
Alonso? Parece que alguém abriu uma porta e passou uma corrente de ar gelada! Não,
não senti nada. Estarás a chocar alguma coisa? Já, vais aquecer, quando
estiveres no meio de umas coxas bem macias!
Tereis
de desculpar estes tão fervorosos rapazes. Ao que parece, têm muito poucos
prazeres na vida. Espero que a nossa presença não lhes tenha arrefecido o
ardor. Bem-vindos a Yuste, este esplendoroso mosteiro de São Jerónimo. Não poderia
haver lugar mais tranquilo. Pois bem, estais aqui para saber o mais possível
sobre Carlos, o homem que, até há pouco tempo, ostentava as coroas do Sacro
Império Romano e de Espanha. Como tão bem dissestes, toda a gente já ouviu
falar do imperador e rei, mas o que se sabe realmente sobre o homem? Farei todo
o possível por ajudar-vos. Serei o vosso guia, levando-vos, como observadores invisíveis,
à presença do rei; espreitando pelos corações e pelas mentes de todas as
pessoas que iremos conhecer. Espero também ser fonte de informações úteis. Estais
de acordo em nunca fazer perguntas, nem escolher outros caminhos, e a confiar
sempre no meu julgamento? Ainda bem! Então podemos dar início a uma experiência
que, prometo, será muito interessante. Mas, primeiro, uma ou duas palavras
acerca de Yuste. Há mais de um século que a Ordem dos Jerónimos aqui está
instalada e é, hoje uma comunidade abastada, proprietária de vastos hectares de
terra fértil ao longo do vale, e de muitos pomares, olivais e florestas nas
montanhas vizinhas. Não há muito tempo, construíram aquele magnífico segundo
claustro do lado esquerdo e acolhedores aposentos para o rei, o seu pequeno
palácio, graciosamente acrescentado do lado direito, o mosteiro tornou-se uma
verdadeira jóia, incrustada num mar verde-esmeralda de carvalhos e castanheiros.
E, ao fundo, à esquerda, há uma outra extensão necessária, as cavalariças;
através do arco, vê-se parte do pátio». In Linda Carlino, Uma Questão de Orgulho,
2008, Editorial Presença, Lisboa, 2012, ISBN 978-972-234-705-1.
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