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Maçonaria, Rosacrucianismo e Templarismo
«(…) Para Pessoa, embora sejam vias distintas, existe uma perfeita
articulação de complementaridade entre o Rosacrucianismo, o Templarismo e a Maçonaria:
a Ordem Templária da Escócia havia
criado a M. (Maçonaria) como Ordem Mística. Os Rosicrúcios recrearam-na como
ordem Mágica. À Ordem de Cristo competiu o fazer que houvesse nela uma Ordem Alquímica.
Podemos dizer, na mesma linguagem maçónica, que a Maçonaria foi entrada pela Ordem
do Templo, passada pelos rosicrúcios, erguida pela Ordem de Cristo. Desde que cumpriu
a sua missão o emissário português, ficaram na Ordem Maçónica os elementos espirituais
e transmutação. Quem quiser e souber buscá-los, os encontrará. A M. (doravante,
Maçonaria) continuou, na sua aparência secreta, sempre a mesma; mas um novo espírito
havia penetrado nela desde que Ramsay falara; um espírito ainda mais alto se despertara
nela desde que ela falou o emissário do Ocidente. Está claro que esta afirmação
é mais do que uma constatação histórica (pois a Ordem de Cristo existiu como sucessora
da Ordem do Templo, é um verdadeiro programa iniciático no qual Pessoa parece
estar empenhado e determinado a contribuir para o seu êxito. Neste sentido vale
a pena referir o resto deste fragmento do espólio do Poeta: doravante referir-me-ei
no termo Ordem do Templo à Ordem Templária da Escócia, para que não confunda com
a ordem maçónica que tem este último nome; no termo Ordem de Cristo à Ordem
Templária de Portugal, que é a parte interior da outra, hoje extinta. Fernando Pessoa
refere-se aqui à tradição do templarismo esotérico, segundo a qual a Ordem do
Templo teria um núcleo central, secreto, detentor de uma doutrina espiritual
oculta, de natureza gnóstica. Parece ter a ver com isso a frase do Poeta; ...
veio a formar-se, com certos fins místicos e secretos, dentro do seio visível da
Igreja de Roma, uma Ordem que foi designada por Ordem Militar do Templo de Salomão.
Os seus servos, iniciados ou não, são os que designamos pela abreviação de
Templários. A esta Ordem Mística foram confiados os segredos e a tradição da Igreja
Gnóstica (...) possuidora das chaves dos íntimos mistérios; foi a ela a que mais
tarde se haveria de chamar, na linguagem dos Rosicrúcios, a Igreja Mística.
É interessante constatar duas notas que Pessoa dá sobre a Ordem
de Cristo e ambas referentes ao século XIX: uma, do começo do século, que podemos
encontrar em Miguel António Dias (1853), Anais e Código da Franco-maçonaria em Portugal,
sobre um tal Nunes, português, ao que parece pouco recomendável, que foi a França
vender o sonho de uma Ordem de Cristo ressurgida numa perspectiva iniciática (Nunes
quis fundar uma O.C. dentro da M.. Isso estava de antemão condenado...; a outra,
bastante enigmática e que levanta algumas dúvidas sobre a sua autenticidade, as
provas da O.C. sob elas ficou esmagado Antero de Quental, que nunca passou de escudeiro.
(A sua associação com elementos maçónicos e semelhantes, em parte contribuiu para
sua derrota astral). Registe-se a tradição de que, em meados do século XIX, haveria
uma corrente dentro da M. portuguesa que desejava que esta fosse a continuadora
da Ordem de Cristo e à qual não seria estranha a figura do grão-mestre Costa
Cabral, conde de Tomar, que comprou parte do Convento de Cristo para sua residência
(e não sabemos se para outros fins...); testemunhos indirectos dessa corrente vêm
pela mão dos seus críticos, como por exemplo, Borges Grainha (in História da Franco-Maçonaria
em Portugal).
Rosacrucianismo
Vejamos, entretanto, a definição que Pessoa dá de Rosacruciano:
podemos dizer Rosicruciano um indivíduo pertencente à chamada Fraternidade da
Rósea Cruz (não da Rosa-Cuz) (...) alguém que pertença à Ordem Rosicruciana,
ou, até, a qualquer das Ordens dela derivadas, o que tal pretendam, a G:, D:, A:,
A:, e outras (...). A Ordem Rosicruciana, a Ordem-mãe, apareceu (ao que parece)
no século XVII), não se sabe bem onde nem como, desenvolveu-se quantitativa e ritualmente,
no século XVIII, em que se tornou maçónica, isto é, pôs como condição de
admissão o ser-se Mestre Maçon, sob qualquer obediência regular, e subsiste hoje,
com certas rectificações, e de novo (outra vez) sem a condição maçónica. Na sua
primeira fase criou ou transformou a M., a Ordem Externa como estes Rosicrucianos
lhe chamam». In
José Manuel Anes, Fernando Pessoa e os Mundos Esotéricos, Ésquilo 2008, ISBN
978-989-8092-27-4.
Cortesia de Ésquilo/JDACT