Cortesia
de wikipedia
«Em
Agosto de 2014 deixou-nos Jean Favier (JF), membro do Institut de France /
Académie des inscriptions et belles-lettres (AIBL) e professor emérito da
Universidade de Paris-Sorbonne (Paris IV). Natural de Paris, JF cursou a École
des Chartes (1952 ss.), obtendo em 1956 o diploma de archiviste paléographe, após defesa de uma tese sobre Enguerran
de Marigny. Nos dois anos subsequentes foi aluno da École Française de Rome, ao
que se seguiu um período como conservateur
aux Archives Nationales. Em 1961 obteve a agrégation d'histoire e no ano lectivo subsequente ensinou no
liceu de Orléans. Seguir-se-ão dois anos como attaché de recherches no Centre National de la Recherche
Scientifique (CNRS), e em 1964 iniciará o seu percurso propriamente universitário,
como maître de conférences nas
U’s de Rennes (1964-1966) e de Rouen (1966-1969). Em 1965 é eleito Directeur d’études d’histoire administrative
et financière du Moyen Âge occidental na École pratique des Hautes
Études (IVe section: sciences historiques et philologiques), cargo de que será
titular até à jubilação (1997).
O
ano anterior ao Maio francês assistirá ao seu doctorat d'État em Paris, enquanto
que o subsequente verá a sua
eleição como professor da então ainda indivisa Sorbonne. No big-bang universitário da viragem da
década, será um dos fundadores de Paris IV (Paris-Sorbonne); Favier aqui viria
a ensinar até 1975, assumindo o ensino de uma nova cadeira de História Económica (elle fit mon
bonheur) e de Paleografia e
presidindo ao Institut d’Histoire a partir de 1970; entre os seus colegas de
então menciona especialmente Alphonse Dupront (1905-1990, também fundador e
primeiro presidente de Paris IV) e Michel Meslin (1926-2010).
1975,
inauguraria, entretanto a fase gestionária
do percurso de JF: na presidência de Valéry Giscard d’Estaing (1974-1981), e na
primeira passagem de Jacques Chirac pela chefia do Executivo (1974-1976), foi
nomeado Directeur général des Archives
de France, cargo que desempenharia até 1994; neste ano passaria para a
presidência da Bibliothèque nationale de France (até 1997); e seria, por
último, Presidente da Commision
française pour l'Unesco (1997 ss.). Neste interim, ficou en
congé da sua cadeira em Paris IV, mas manteve até 1997 o ensino da Paleografia. Foi ainda membro do
Institut / AIBL (1985 ss., presidente da AIBL em 1995); director da Revue
Historique (1973-1997); vice-presidente (1984-1988) e presidente
(1988-1992) do Conseil international
des archives; presidente do Conseil
d'administration da École normale supérieure (1989-1997); membro
residente (e presidente, 1993) da Société
nationale des antiquaires de France; membro do Comité des travaux historiques et scientifiques; membro do
conselho executivo do Instituto Francesco Datini (Prato); e conservador do château de Langeais (1995-2012).
Que
balanço para uma obra extensa e polimorfa? Na École des Chartes e na formação post-graduada,
JF teve mestres (lato sensu) como Robert Fawtier (1885-1966), Alain de
Boüard (1882-1955), Clovis Brunel (1884-1971), André Piganiol (1883-1968),
Pierre Renouvin (1893-1974), Yves Renouard (1908-1965), Robert Boutruche
(1904-1975) e Michel Mollat. De todos reteve algo. Por outro lado, nos
seminários de Boutruche e Mollat que frequentou em Paris nas décadas de 50 e de
60, cruzou-se com Guy Fourquin (1925-1988), Bernard Guenée (1927-2010), Pierre
Toubert, Philippe Contamine, Charles de la Roncière, Bronislaw Geremek
(1932-2008), André Vauchez, Henri Dubois (1923-2012) e Jacques Le Goff
(1924-2014). Tais mestres e colegas, bem como a conjuntura historiográfica de
meados da década de 50, atraíram-no, ao projectar a tese final do período chartiste,
para a época de Filipe IV, o Belo e para a problemática dos seus homens
de leis. Depois de pensar nas figuras de Guillaume de Nogaret e de Guillaume de
Plaisians, aconselhou-se com Charles-Edmond Perrin (1887-1974) e depois com R.
Fawtier, assentando em Enguerran de Marigny. A esta personagem dedicou a tese
(ainda hoje de bem profícua consulta) e uma edição de fontes; e deixou-nos um
sólido dossier historiográfico sobre os légistes philippinos.
O
tempo passado na École Française de Rome levou-o a conceber como tese doutoral
a apresentar à Sorbonne um extenso projecto sobre as finanças pontificais ao
tempo do Grande Cisma. O orientador seria Yves Renouard; mas a
morte prematura deste em 1965 levou à indigitação de Michel Mollat; prestou
provas em 1967, como se disse. JF virá a salientar que diversos
desenvolvimentos da sua obra derivarão da formação diplomática (e do seu
ulterior ensino nesta área) e do interesse precoce pela História dos poderes,
pela edição ou problematização das fontes, pela abordagem biográfica, pela
História administrativa, financeira e fiscal, bem como por algumas grandes
sínteses ou pelo produtivo interesse pela História de Paris; enquanto que,
ainda que com raízes já na pesquisa doutoral, o seu ensino de História
económica frutificará em alguns outros volumes de largo fôlego, sobre ouro,
especiarias ou comércio fluvial.
No
fundo, JF realizou as sínteses possíveis da sua formação, do seu percurso
universitário, do seu ensino e do seu desempenho consecutivo de cargos
académicos, de gestão científica ou de altas Funções Públicas (normalmente
designado por Executivos da família
gaullista) ao longo de mais de três décadas. Alguém a ser recordado mais pela carreira do que pela obra, como ouvi comentar em Paris no
final dos anos 90? Parece-me excessivo; malgré
tout… Alguém, afinal, que eu também teria gostado de conhecer…» In Armando
Luís Carvalho Homem, Jean Favier (1932 2014), Universidade do Porto, Faculdade
de Letras, Departamento de História e de Estudos Políticos e Internacionais, Centro
de Estudos da População, Economia e Sociedade, Porto, Revista Medievalista, Nº
20, Julho-Dezembro de 2016, ISSN 1646-740X.
Cortesia da
RMedievalista/FLetras/Porto/JDACT