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Aspectos
da Vida Bizantina. Povos e Línguas
«Todos os impérios exerceram o seu
governo sobre uma diversidade de povos e, a este respeito, o Império Bizantino também
não fora excepção. Tivesse a sua população sido fundida de modo sensato, tivesse
ela sitdo unida na aceitação comum da civilização bizantina enquanto civilização
dominante do Império, talvez nem fosse necessário dedicar um capítulo a esta matéria.
Contudo, a verdade é que até ao momento anterior ao Período Inicial bizantino, nomeadamente,
quando a grande construção de Roma começou a mostrar os primeiros hiatos na aproximação
do século II d.C., as várias nações dominadas por Roma tenderam a separar-se e a
reclamar a sua individualidade. O crescimento da religião cristã, longe de vir colmatar
este hiato, através da introdução de uma aliança universal, apenas o acentuou. Devemos,
portanto, começar pela questão: quem foram os Bizantinos? Numa tentativa de responder,
devemos percorrer rapidamente todo o Império, reparando como seguimos as populações
das várias províncias e as línguas por elas faladas. A época escolhida situa-se
cerca do ano 560 d.C.. pouco tempo após a recuperação, pelo imperador Justiniano,
de grandes áreas da Itália e do Norte de África, e várias décadas antes das maiores
alterações etnográficas, que iriam acompanhar a desintegração do Estado bizantino
do Período Inicial.
Teria sido suficiente para o nosso
viajante imaginário, desde que não se afastasse das cidades, saber duas
línguas, nomeadamente, o grego e o latim. As fronteiras da sua respectiva
difusão não foram bem definidas em todos os lugares. No entanto, pode dizer-se,
como um cálculo aproximado, que a fronteira linguística percorre a península Balcânica
ao longo de uma orientação no sentido este-oeste, nomeadamente, de Odessos (Varna),
no mar Negro, até Dirráquio (Dürres) no Adriático; enquanto a sul do Mediterrâneo,
a fronteira separava a Líbia da Tripolitânia. Com excepção das terras balcânicas,
onde existia uma união razoável, a metade ocidental do Império era
substancialmente latina e a metade oriental fundamentalmente grega, na medida
em que foram estas as línguas da administração e da cultura.
Quase todas as pessoas instruídas
do Oriente sabiam falar grego, assim como todas as pessoas instruídas do Ocidente
sabiam falar latim. Porém, uma grande parte da população comum não sabia falar nenhuma
dessas línguas. O nosso viajante teria tido uma grande dificuldade em conseguir
um roteiro actualizado. Poderia ter deitado a mão a um simples catálogo de províncias
e cidades chamadas Synecdemus de Hiérocles, tal como alguns itinerários
mais antigos que informavam as distâncias entre as albergarias que poderia
encontrar ao longo das estradas principais. Poderia ter retirado informação útil,
embora antiquada, a partir de um pequeno livro conhecido por nós pelo nome de Expositio
totius mundi e gentium, que foi composto em meaclos do século IV. Mas se quisesse
um guia mais sistemático, combinando geografia e etnografia, teria de trazer na
mala um exemplar da Geografia de Estrabão. Se tivesse conseguido encontrar o guia
geográfico (agora perdido) da autoria do mercador alexandrino Cosmas Indicopleustes,
provavelmente teria tirado dele poucas vantagens a nível prático. Imaginemos
que o nosso viajante estava satisfeito com tal imperfeita documentação e que, partindo
de Constantinopla, tinha intenção de viajar por toda a Europa, na direcção dos ponteiros
do relógio». In Cyril Mango, Bizâncio, O Império da Nova Roma, 1980, Edições 70,
2008, ISBN 978-972-441-492-8.
Cortesia de E70/JDACT