quinta-feira, 8 de junho de 2017

Bizâncio. O Império da Nova Roma. Cyril Mango. «Quase todas as pessoas instruídas do Oriente sabiam falar grego, assim como todas as pessoas instruídas do Ocidente sabiam falar latim»

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Aspectos da Vida Bizantina. Povos e Línguas
«Todos os impérios exerceram o seu governo sobre uma diversidade de povos e, a este respeito, o Império Bizantino também não fora excepção. Tivesse a sua população sido fundida de modo sensato, tivesse ela sitdo unida na aceitação comum da civilização bizantina enquanto civilização dominante do Império, talvez nem fosse necessário dedicar um capítulo a esta matéria. Contudo, a verdade é que até ao momento anterior ao Período Inicial bizantino, nomeadamente, quando a grande construção de Roma começou a mostrar os primeiros hiatos na aproximação do século II d.C., as várias nações dominadas por Roma tenderam a separar-se e a reclamar a sua individualidade. O crescimento da religião cristã, longe de vir colmatar este hiato, através da introdução de uma aliança universal, apenas o acentuou. Devemos, portanto, começar pela questão: quem foram os Bizantinos? Numa tentativa de responder, devemos percorrer rapidamente todo o Império, reparando como seguimos as populações das várias províncias e as línguas por elas faladas. A época escolhida situa-se cerca do ano 560 d.C.. pouco tempo após a recuperação, pelo imperador Justiniano, de grandes áreas da Itália e do Norte de África, e várias décadas antes das maiores alterações etnográficas, que iriam acompanhar a desintegração do Estado bizantino do Período Inicial.
Teria sido suficiente para o nosso viajante imaginário, desde que não se afastasse das cidades, saber duas línguas, nomeadamente, o grego e o latim. As fronteiras da sua respectiva difusão não foram bem definidas em todos os lugares. No entanto, pode dizer-se, como um cálculo aproximado, que a fronteira linguística percorre a península Balcânica ao longo de uma orientação no sentido este-oeste, nomeadamente, de Odessos (Varna), no mar Negro, até Dirráquio (Dürres) no Adriático; enquanto a sul do Mediterrâneo, a fronteira separava a Líbia da Tripolitânia. Com excepção das terras balcânicas, onde existia uma união razoável, a metade ocidental do Império era substancialmente latina e a metade oriental fundamentalmente grega, na medida em que foram estas as línguas da administração e da cultura.
Quase todas as pessoas instruídas do Oriente sabiam falar grego, assim como todas as pessoas instruídas do Ocidente sabiam falar latim. Porém, uma grande parte da população comum não sabia falar nenhuma dessas línguas. O nosso viajante teria tido uma grande dificuldade em conseguir um roteiro actualizado. Poderia ter deitado a mão a um simples catálogo de províncias e cidades chamadas Synecdemus de Hiérocles, tal como alguns itinerários mais antigos que informavam as distâncias entre as albergarias que poderia encontrar ao longo das estradas principais. Poderia ter retirado informação útil, embora antiquada, a partir de um pequeno livro conhecido por nós pelo nome de Expositio totius mundi e gentium, que foi composto em meaclos do século IV. Mas se quisesse um guia mais sistemático, combinando geografia e etnografia, teria de trazer na mala um exemplar da Geografia de Estrabão. Se tivesse conseguido encontrar o guia geográfico (agora perdido) da autoria do mercador alexandrino Cosmas Indicopleustes, provavelmente teria tirado dele poucas vantagens a nível prático. Imaginemos que o nosso viajante estava satisfeito com tal imperfeita documentação e que, partindo de Constantinopla, tinha intenção de viajar por toda a Europa, na direcção dos ponteiros do relógio». In Cyril Mango, Bizâncio, O Império da Nova Roma, 1980, Edições 70, 2008, ISBN 978-972-441-492-8.

Cortesia de E70/JDACT