Resumo
Que mudanças ocorreram no
jornalismo? É a pergunta que procuramos responder. Para tanto, pretendemos
realizar uma análise sobre o desenvolvimento do jornalismo. A nossa análise
parte do século XIX, pois foi um período de expansão da imprensa portuguesa, um
legado rico, marcado por um carácter idealista e doutrinário que serviu para o
estabelecimento das coordenadas ideológicas de toda uma memória colectiva até
chegar ao jornalismo on-line,
que proporciona rapidez para informar, mas também para desinformar.
A ascensão de uma profissão
«Ao longo do século XIX, numa época em que só a imprensa
escrita existia como meio de comunicação de massa, os jornais desempenharam um
papel revolucionário na vida social. Em Portugal, um artigo da Revista
Universal Lisbonense registava a seguinte observação: A imprensa cinge o mundo. Dantes reinava a
espada – hoje governa a pena (…) A antiga civilização estava nas guerras, a
nova está na imprensa, que chama a atenção para o poder da imprensa
enquanto difusora de ideias que suscita a discussão. Nesse contexto
oitocentista, marcado pela exigência de uma consciência social, cabe a
interrogação: qual era o conceito de
jornalismo? No mundo europeu industrializado, a melhoria dos
transportes, o alargamento da vida escolar e a evolução das técnicas gráficas
foram determinantes para fazer do jornalismo uma actividade sustentável. A inserção
da acção jornalística como factor de produção cultural na vida moderna logo se
fez reflectir em Portugal: O jornalismo desempenhava na difusão das atitudes
inovadoras papel de relevo, condicionado embora pelo analfabetismo generalizado
e pelo baixo poder de compra dos possíveis leitores. Mas a imprensa de então é,
apesar de tudo, uma realidade cultural de peso (…) só de 1869 a 1871 surgiram em todo o país, 45 novas tentativas. São,
sobretudo, folhas políticas, literárias, de anúncios, religiosas, humorísticas,
pedagógicas. De facto, o jornalismo oitocentista conferiu à vida do
espírito uma presença social mais intensa, e marcou a mentalidade nacional de
toda uma geração como um espaço de formação da opinião e da consciência do
cidadão.
Nesse espaço, os literatos ocuparam, desde sempre, um lugar de
destaque:
Os jornais eram, à época, importantes centros sociais. Era
ali – e Eça recordá-lo-á em várias obras – que se faziam amigos, se discutia
política, se ficava a par das intrigas do dia. Um periódico oitocentista era o
centro do mundo. (Mónica, 2001,p.33) Ao longo dessa fase da chamada
“imprensa de opinião”, as empresas jornalísticas contaram com a participação de
grandes nomes da literatura e caracterizaram-se por manter, em termos de
recursos humanos, uma estrutura centralizada:
O chefe da redacção era o verdadeiro espírito e a alma da
publicação. O jornal, geralmente, era um homem, mais até do que um partido. (…)
Era o redactor responsável com a sua personalidade, quem, dentro das
coordenadas gerais, imprimia ao jornal uma vida própria. Ideologicamente,
devemos lembrar que a imprensa da época
é, em primeiro lugar política, em segundo lugar, literária e só acidentalmente
noticiosa dos acontecimentos da vida quotidiana. No que diz respeito à
circulação da informação, uma característica importante desta fase é assinalada
por Tengarrinha: Em voz alta
liam-se (…) os editoriais dos jornais mais importantes: de tal maneira, assim,
a Imprensa e a oratória andavam intimamente ligadas. Entre os múltiplos
escritores que emprestaram a sua pena a imprensa, destacamos o crítico
alentejano Fialho Almeida que, conforme o espírito da época, entendia o
jornalismo como uma missão pedagógica de intervenção e, sobretudo, como um meio
para a circulação de ideias. Daí afirmar: Da
imprensa deriva toda a espécie de incentivo e de energia fecunda e
transformável que vai depois propulsar em todos os distritos gerais da actividade,
moral e ciência, indústria e arte, política e religião. Na sequência
deste pensamento, Fialho defende o interesse da esfera pública, o
chamado espírito público – É a imprensa que reforça e purifica a voz da
opinião.
Outro grande escritor oitocentista, Eça de Queirós, concebia
um jornalismo de projecção para o futuro, onde era necessário relacionar os
factos para melhor compreender e fazer entender. Vejamos, logo no primeiro
número de O Distrito de Évora, que fora posto a circular no dia 6 de
Janeiro de 1867, o que Queirós
afirma:
O jornalismo na sua justa e verdadeira atitude, seria a
intervenção permanente do país na sua própria vida política, moral, religiosa,
literária e industrial. […] É o grande dever do jornalismo fazer conhecer o
estado das coisas públicas, ensinar ao povo os seus direitos e as garantias da
sua segurança, estar atento às atitudes que toma a política estrangeira,
protestar com justa violência contra os actos culposos, frouxos, nocivos, velar
pelo poder interior da pátria, pela grandeza moral, intelectual e material em
presença das outras nações, pelo progresso que fazem os espíritos, pela
conservação da justiça, pelo direito, da família, do trabalho, pelo
melhoramento das classes infelizes.
Ora, tais ideias compõem uma verdadeira teoria do jornalismo, na
medida em que evidenciam as principais funções da imprensa: informar;
interpretar; actuar e intervir. Por outro lado, cabe assinalar o
surgimento de novos processos comunicacionais que deram origem à chamada fase
da imprensa industrial. De facto, segundo José Tengarrinha, só entre 1865 e 1885 é que se estabeleceram em Portugal as condições
propícias à transformação industrial da imprensa, o que deu ênfase à
informação como preocupação e objectivo». In Adriana
Mello Guimarães e Nuno R. Fernandes, O jornalismo em Evolução, Trabalho
apresentado no III Seminário de I&DT, organizado pelo Centro
Interdisciplinar de Investigação e Inovação do Instituto Politécnico de
Portalegre, Dezembro, 2012.
Cortesia do IPP/JDACT