Enquadramento Político, Económico e Social da Ditadura Militar
«(…) A primeira destas clarificações termina em 17/6/1926 com o afastamento do comandante José Mendes
Cabeçadas Júnior, chefe militar do movimento de Maio em Lisboa, pelo general
Manuel Oliveira Gomes da Costa. Com efeito, após ter exigido a nomeação de um
governo de carácter extra-partidário, constituído por republicanos que
merecessem a confiança do País, Mendes Cabeçadas afasta o Partido Radical,
encerra o Congresso da República e o Senado e, no dia 12 de Junho, recebe a
carta de Bernardino Machado na qual o Presidente da República afirma não lhe
ser possível continuar no exercício da
suprema Magistratura da Nação. Demasiado comprometido com os partidos
da República, Mendes Cabeçadas revela-se incapaz de congregar as várias facções
republicanas e, após ter recusado aceitar o programa apresentado ao Governo pela
direita político-militar no dia 14 desse mês, de autoria de Trindade Coelho, é
arredado do poder quatro dias depois.
Estava assim afastada qualquer aparência de legitimidade constitucional
do poder político. No dia 19 Gomes da Costa é nomeado Presidente do Ministério,
e interino do Interior, amparado por personalidades afectas ao bloco conservador,
liderado por Sinel Cordes, ao Integralismo Lusitano (IL) e à direita radical. Será, também neste caso, a sua
incapacidade para gerir o equilíbrio entre as forças apoiantes o móbil para que
uma representação de direita, composta por Sinel Cordes, Raul Esteves, Schiappa
Azevedo, Mouzinho Albuquerque e Luís Domingues, exija a sua demissão (7/7/1926). Como bem afirma Oliveira
Salazar, convidado por ambos os políticos, Cabeçadas e Gomes da Costa, para
tutelar a pasta das Finanças, as
hesitações do momento político não [davam] a qualquer esforço a menor garantia
de êxito.
Defraudadas as aspirações reformistas do liberalismo republicano,
arredadas as pretensões da direita radical, o general Óscar Carmona,
representante do bloco militar conservador, chefia o 3.º Ministério da Ditadura
Militar com Sinel Cordes à frente das Finanças (9/7/1926). Pareciam, finalmente, reunidas as condições de sólida governação para
enfrentar os difíceis problemas administrativos, económicos e sociais em que o
país se encontrava mergulhado. No entanto, o campo republicano ligado aos
velhos partidos divide-se e protagoniza uma nova fase de clarificações
políticas. Por um lado, a esquerda e a direita republicanas, partidárias
respectivamente de uma via revolucionária contra a ditadura e de uma solução
regeneradora por via legalista; por outro, a direita radical e fascizante,
defensora da ruptura com o sistema liberal e apostada numa ortodoxia radical de
construção de um Estado nacionalista
baseado no corporativismo integral.
Sem nunca ter definido um programa, proposto uma táctica clara ou designado
uma liderança, foi o sector republicano-conservador da ditadura quem deteve o
poder, quer no governo quer nas Forças Armadas, entre Julho de 1926 e
Janeiro de 1930. Mas em meados de Setembro de 1926 têm lugar as duas primeiras tentativas de rebelião contra a
Ditadura Militar, prontamente dominadas pelas forças leais ao Governo: o
capitão Alfredo Chaves, reviralhista, tenta sublevar o Regimento de
Infantaria 19 em Chaves, e o integralista João Almeida, em Lisboa, perpetra
uma tentativa de golpe de Estado que visava
arrastar a situação mais para a direita. E se a investidura a título
interino, do general Carmona na função de Chefe de Estado indiciava a tão
desejada unidade, não deixa de ser evidente a constituição de um bloco anti-ditatorial
grandemente favorecido pelo agudizar dos mecanismos de controlo e de repressão.
E, ainda em Dezembro, a organização de um Comité Revolucionário liderado pelo
general Adalberto Gastão Sousa Dias anuncia os intentos de revirar a
situação». In Cristina Faria, As Lutas Estudantis Contra a Ditadura Militar,
1926-1932, Edições Colibri, Lisboa, 2000, ISBN 972-772-201-6.
Cortesia de E. Colibri/JDACT