quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Carla Alferes Pinto: A Infanta dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma Princesa Renascentista. «… em contrariar as ambições da Infante: ao propor o filho-segundo deserdado ou o herdeiro dum pequeno principado como noivo para a sobrinha, anulava as pretensões da princesa portuguesa…»

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A “Sempre-Noiva”. Política matrimonial e Diplomacia paralela
«(…) É-nos mais fácil entender, dentro de uma perspectiva de Estado, os seus evidentes ganhos nesta união, até porque muitas das questões não resolvidas com Carlos V poderiam agora ser discutidas com outro soberano e com uma rainha de sangue português, vantagem que se perdera com a morte de D. Isabel em 1539. O interesse da Infante numa união com Fernando da Alemanha é inquestionável, e é neste contexto que devemos entender e encomenda das doze tapeçarias em Bruxelas com o relato dos feitos do vice-rei João de Castro. Carlos V não recusa a ideia, mas informa Lourenço Pires Távora de estar certo que o irmão tinha pouca intenção de casar, pelo que se devia insistir no arquiduque fazer iguais diligências junto da corte de Sabóia para apurar das vantagens de um casamento com Emanuel Felisberto. Na carta de Lourenço Pires Távora para o rei João III, datada de 16 de Janeiro de 1557, há indicações para que a Infanta não fosse avisada. Julgamos que a razão se encontra no propósito de Carlos V em contrariar as ambições da Infante: ao propor o filho-segundo deserdado ou o herdeiro dum pequeno principado como noivo para a sobrinha, anulava as pretensões da princesa portuguesa manifestadas nas negociações com o poderoso imperador alemão e, ao mesmo tempo, ia criando elementos de diversão que poderiam delongá-las, nomeadamente, voltando a falar num possível casamento de Maria com o seu filho Filipe.
O Távora foi depois dar conta das propostas às rainhas viúvas e à princesa D. Joana que se encontrava em Castela. Segundo frei Pacheco, a nova exposição dos casamentos fez-se sobretudo junto de D. Maria da Hungria e de D. Joana, porque a mãe da Infanta seria mais sensível ao assunto. Julgamos, todavia, que a razão seria outra: D. Maria da Hungria conhecia bem o seu irmão Fernando e terá, muito provavelmente, servido de interlocutora numa espécie de contactos paralelos que a Infanta então desenvolveu. A resposta de João III não se fez esperar, confidenciando ao seu embaixador que: sempre dezeiei caza com os maiores cazamentos da Christandade, e por conseguir este meu dezeio apontei no de El Rey dos Romanos, [...] toda via vendo que o do Archiduque lhe he [a Carlos V] tam conveniente e que cederia, reduzindo as suas opções a Fernando e a Emanuel Felisberto.
Segundo a carta de Fevereiro, a resposta de D. Maria da Hungria à proposta de casamento da Infanta com o seu irmão Fernando não foi muito favorável, tendo repetido os argumentos de Carlos; quanto ao arquiduque, este confidenciara já à tia que não desejava casar e que se o fizesse seria dentro dos interesses da Casa da Boémia, junto à qual se encontravam as poucas terras que tinha; e, por fim, quanto ao duque de Sabóia, sabia que o seu pai negociava uma união com uma filha do rei dos Romanos, pelo que não seria bem acolhida qualquer outra proposta. Pelo tom da carta parece-nos que a ideia que então prevalecia era a de levar a Infanta para Castela a qualquer custo, pois acaba tratando dos assuntos relacionados com essa jornada e dando a nova de que o imperador finalmente entrara no mosteiro a 3 de Fevereiro de 1557. Filipe também é consulado sobre a ida da Infanta para a corte castelhana, desaconselhando-a através do seu enviado especial Rui Gomes Silva, o conde de Melito». In Carla Alferes Pinto, A Infanta Dona Maria de Portugal, o Mecenato de uma Princesa Renascentista, Fundação Oriente, 1998, ISBN 972-9440-90-5.