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Canto 2: carta de Mamude
aos senhores das cidades portuárias indianas.
Canto Segundo
[...]
Sendo chegado o tempo de mostrar-se
Aquele desamor que está escondido,
O grão sultão mandou embaixadores
Aos príncipes e reis que ali possuem
Marítimas cidades, onde havia
Fortalezas cristãs, e a todos
quantos
Ao lusitano rei pagam tributo.
Mandou ao Idalcão e ao Bramaluco;
Mandou também aos reis que a grande
costa
Do Malavar habitam; e as palavras
Das cartas assi deziam:
A vós, que mandava reis poderosos
do Oriente,
Mamude paz, amor e bem deseja.
Bem vedes quão sujeitos somos todos
A estes portugueses fementidos;
Bem vedes quantos danos e
desgostos,
Quantos roubos e mortes, quanto males,
Estes duros imigos vão fazendo
Cada momento mais por nossas terras,
Oprimindo, avexando a gente fraca;
Bem vedes que, por força, se fizeram
Absolutos senhores do Oriente.
Se se isto não atalha e se
castiga,
Cedo nos deitarão de nossos
reinos,
Por força, desonrados e abatidos.
Restauremos as terras quasi postas
Em jugo e vencimento. Com armada
E belicosa gente persigamos
Estes cruéis tiranos e imigos.
Como a nova vos for que já de todo
São quebrados os pactos e a paz rota,
Que por nós foi guardada injustamente,
Todos acudireis com tai socorro
Que para livres ser é necessário.
Uma liga façamos todos juntos,
E assi conquistaremos esta gente
Enganosa e soberba, tiraremos
Os
nossos naturais de ser cativos,
Vingaremos aquela grande afronta
Que até este ponto a todos nos é feita,
Tributos e pensões sempre pagando,
Fazendo-nos sujeitos, sendo 1ivres.
[…]
In Jerónimo Corte-Real, colecção
Tesouros da Literatura e da História, Obras de Jerónimo Corte-Real, HALP, FCG, Lello
& Irmãos Editores, Porto, 1979.
Cortesia de LelloeI/HALP/JDACT