Tempos de Boa Memória (1383-1433)
Avanço do mundo
mercantil
«João I estabeleceu o imposto da sisa,
tornando-o obrigatório para o comprador e o vendedor, fosse fidalgo ou clérigo.
Democratizava assim o imposto e a vida pública. Fernão Lopes contabiliza o rendimento
do rei em oitenta e dois contos de reais. Os direitos do reino contribuíam com vinte
e um milhões, ao passo que o rendimento das sisas subia a sessenta milhões de
reais, ou seja, a três quartos. O mundo mercantil ganhava um papel crescente.
Uma companhia de mercadores, formada
pelo italiano Persifal e por Rui Garcia Lisboa e Martim Afonso Dinis e Lourenço
de Sousa, do Porto, emprestaram ao rei 25 000 coroas de ouro para o casamento
da sua filha Beatriz. O reembolso atingirá a soma de 11 535 000 libras. Em
1432 o dote de Isabel de Portugal, duquesa de Borgonha, subirá para 154 000 coroas
de ouro, pagas por Pedro Eanes, feitor do rei e mercador português na Flandres.
Vasco Anes, tesoureiro-mor, recebeu
do rei em usofruto pelo menos quatro naus e duas barcas. Podia fretar, pôr mestres,
escrivães. mercadores, marinheiros, receber o dinheiro dos fretes, os ganhos e empregá-los
em mercadorias, tomar contas aos mestres e dar-lhes quitações, sem que lhe
peçam contas. Grande depositante na Comuna de Florença, o rei João tornava-se
grande armador e encarregava do negócio o seu feitor Vasco Anes. O mundo novo ganhava
outro fôlego.
Uma carta régia de 1426 determinava
que qualquer pessoa de Lisboa ou de outro lugar que compre pão na Beira, em Entre
Douro e Minho ou em Trás-os-Montes, uma vez que não seja pão da cidade do Porto
ou do seu termo, pode carregá-lo do Porto para Lisboa, porquanto nós temos ordenado
que todos os mantimentos se corram de umas partes para outras por todos os nossos
reinos.
A estabilidade pública dependia
do preço e da abundância do pão. Na década de setenta do século XIV, os preços
do alqueire de trigo aumentaram e continuaram em ascensão até 1384. Baixaram, com
algumas excepções. até ao final do século XV. A fome consumiu os lisboetas durante
o cerco castelhano de 1384. Houve escassez de pão em 1391 e em 1394. Em 1399, a
vereação de Lisboa contratou com os mercadores estrangeiros a troca de sal por pão.
Nos anos de 1401 e 1411 muitos castelhanos
atravessaram a fronteira em busca de alimento. Nuno Álvares Pereira socorreu-os
com o trigo dos seus celeiros. No ano de 1418 perderam-se as colheitas. E em 1422
e 1427 Lisboa e o seu termo recolheram o ouro necessário para mandar vir trigo de
fora do reino». In António Borges Coelho, Largada das Naus, História de Portugal,
1385-1500, Editorial Caminho, 2011, ISBN 978-972-212-464-5.
Cortesia de ECaminho/JDACT
JDACT, António Borges Coelho, Ceuta, Cultura e Conhecimento, História, Descobrimentos,