Enigma Ómega 1941
Uma
janela no crânio
«(…) Os pedreiros, o coveiro, já
lá estariam? Desmontar o túmulo, trasladar para a igreja de São Pedro as pesadas
lápides, a do brasão, a que é encimada pela cabeça de Damião, não ía ser fácil.
Não estava o amigo incumbido da trasladação pela Direcção-Geral.
Meu caro doutor, providenciei
tudo.
Alcobaça? Alenquer? Mistério!...
E esse papel, esse papel... ou papéis, que ainda conservava na mão? Talvez o
diário a que ele próprio se referia no processo...
Talvez…
Os inquisidores fizeram-no surnir.
Não me admiraria nada.
E, não estava ele preso na
Batalha? A sentença dos inquisidores condenara-o a cárcere penitencial perpétuo
em lugar que Sua Alteza designaria...
O rei Sebastião ou o cardeal
Henrique?
Luciano estava em crer que havia
sido o inquisidor-geral, o cardeal, a indicar o mosteiro da Batalha. O superior
de Santa Maria da Vitória, frei Francisco Pereira, frei António Nogueira e
outros dominicanos receberam o preso das mãos de Rui Fernandes, solicitador do Santo
Ofício (maldito), a dezasseis de
Dezembro de mil e quinhentos e setenta e dois, e do acto lavraram certidão.
Como havia aparecido então ali, no caminho ou em casa? Quem teria a coragem de,
em tempos de tanto medo e perigo, se abalançar a soltar o condenado? O superior
e os frades do mosteiro? Não, certamente. Cairiam nas garras do Santo Ofício (maldito) e isso
constaria...
Então quem?
Oficialmente ninguém. Seria desacreditar
tão feroz poder. Mas oficiosamente… Mesmo assim...
Mesmo assim, só quem tivesse
poder para isso, o inquisidor-geral em pessoa. O rei era jovem e visionário.
Dava lá a atenção a isso... Há quem admita ainda a comutação da pena...
Não pode ser. Estaria no processo
e, que eu saiba... e Hipólito fazia menção de folhear de novo os papéis.
Também lhe parecia a Luciano.
Dessem então por certo que Damião havia falecido na sua casa de Alenquer.
Porque não supor que aí estivesse sob custódia?
Por mor de quê?
Se o amigo atentasse mais uma vez
no texto do processo, acharia que, quando os inquisidores lavraram o acórdão de
condenação a cárcere perpétuo, tiveram o cuidado de estabelecer que não fosse
recebido à reconciliação e união da Igreja-ern público, mas somente na Mesa diante
dos inquisidores, vista a qualidade da pessoa do réu». In Fernando Campos, A Sala das
Perguntas, Difel 82, 1998, ISBN 972-290-437-X.
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