Portugal e a nova relação de forças no Atlântico. Um plano estratégico
naval conjunto, Portugal e Marrocos?
«(…) No caso das colónias portuguesas, os Britânicos (ao contrário dos Alemães)
não estavam muito interessados em ver estas divididas, já que a Grã-Bretanha tinha
grande influência no Império colonial português, sem que para isso tivesse que
reparti-lo. Uma das formas de exercer essa influência era pela aquisição do
direito de preferência, segundo o qual a Inglaterra tinha, acima de qualquer
nação, o direito sobre determinados territórios no caso de repartição destes.
Assim, os Britânicos, conduzidos por Salisbury, tudo farão para impedir um empréstimo
anglo-alemão a Portugal. As negociações com os credores externos arrastar-se-ão
até, 1902, quando finalmente se
acorda que o pagamento da dívida portuguesa será garantido exclusivamente pelos
rendimentos das alfândegas de Portugal continental. A política inglesa, no
entanto, caracterizar-se-á sempre por uma grande ambiguidade, sendo ainda de
salientar as divergências de opinião no Gabinete inglês sobre a política
externa. O pedido alemão de 1898,
tem de ser visto no contexto do perigo que para a Grã- Bretanha seria a
Alemanha apoiar o Transvaal e na aproximação França / Alemanha durante a crise
de Fachoda. Um ofício de Bülow, então secretário de Estado do Auswärtiges
Amt (Ministério dos Negócios Estrangeiros alemães) ao embaixador em Londres,
Hatzfeldt, de 8 de Junho de 1898,
pouco depois de Soveral ter sido enviado a Londres para pedir um
empréstimo, revela bem que a prioridade dos dirigentes alemães é negociar com
os Ingleses a aquisição de bases estratégicas navais, mais do que obter
extensos territórios africanos: (...) Das
notas do Kaiser ao relatório n.º 440 de S. E. poderá S. E. deduzir que, segundo
a suprema vontade de S. M., os nossos objectos de compensações para uma eventual
expansão territorial britânica em África não têm que ser necessariamente em
África.
Aliás, Bülow precisava bem na folha anexa, o que queria que Hatzfeldt pedisse
aos Britânicos como compensação, entre outros referia: Na África ocidental:
l. Uma estação naval nas Canárias ou
nas ilhas de Cabo Verde; 2. Fernando
Pó; 3. Como fronteira entre o Togo e
a colónia da Costa de Ouro, do Volta até à foz; 4. Angola, nomeadamente as partes do sul de Mossamedes e Benguela; 5. Walfisch Bay. A Madeira ou os Açores
não aparecem ainda aqui referidas, mas os relatórios da Marinha alemã, de 1901, demonstram já um grande interesse
pela ilha da Madeira. Bülow referia ainda outras possibilidades de compensações
na África oriental, no Timor português, nas ilhas de Samoa e nas Filipinas. Parece-nos
provável que as negociações anglo-alemãs sobre as colónias portuguesas tivessem
como objectivo prioritário levar a Inglaterra a ceder bases marítimas, sendo de
importância mais secundária a obtenção de grandes extensões de territórios coloniais
portugueses em Africa, já que Bülow salientava que as compensações alemãs não
tinham que ser necessariamente em África. Obtidas bases navais no Atlântico e
no Pacífico, a Alemanha poderia, então, erigir um vasto império colonial. Do
lado alemão, o Acordo sobre as Colónias Portuguesas seria utilizado, em 1899
e 1900, sobretudo como meio de pressão sobre os Ingleses. Isso pode deduzir-se
do que Hatzfeldt conversara com Salisbury sobre Marrocos. Tal não significa, no
entanto, que os Alemães não estariam interessados nas colónias portuguesas, mas
nestas, era fundamental, o domínio ou influência nos portos ou baías
portuguesas em África, já que as colónias alemãs não tinham bons embarcadouros.
Na realidade, em 1900, os Alemães
demonstravam um vivo interesse na Baía dos Tigres, no sul de Angola, já que
pretendiam explorar as minas de cobre de Otávi, e transportá-lo por caminho de
ferro até à Baía dos Tigres. Quando, anos antes, Londres reconhecera o direito
de cedência à Alemanha de toda a costa atlântica entre o Orange e a fronteira
do sul de Angola, oferecera um presente envenenado. Os únicos bons
portos naturais desta área geográfica eram Walfisch Bay, dominado pelo
Cabo, e a Baía dos Tigres, no sul de Angola, sob domínio dos Portugueses.
Um telegrama de Pindela a Veiga Beirão, ministro dos Negócios Estrangeiros, de
Julho de 1900, explicita bem as dificuldades
das relações luso-alemãs desse tempo: (...).A
dificuldade das nossas relações com a Alemanha está em não termos interesses
comuns e em possuirmos pontos na África, como a Baía dos Tigres, de que a
Alemanha carece». In Gisela Medina Guevara, As Relações Luso-Alemãs
antes da I Guerra Mundial, A Questão da Concessão dos Sanatórios da ilha da
Madeira, Faculdade de Letras de Lisboa, Edições Colibri, Lisboa, 1997, ISBN
972-8288-70-0.
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