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«(…) Memória sobre a praça de Campo Maior com o jornal do sítio que principiou em 20de Maio de 1801 e terminou em 6 de Junho do mesmo ano (escrita por um oficial da guarnição)
Para dar uma ideia circunstanciada
do Sítio que sofreu a Praça de Campo Maior, é necessário começar por descrever a
influência militar da sua situação topográfica, o estado em que se achavam as suas
fortificações, e as disposições que se haviam tomado para a sua defesa. Lançando
os olhos sobre a carta da Província do Alentejo, se divisa Campo Maior ao
Nordeste de Elvas, e ao Norte de Badajoz, formando entre si estas três Praças, um
triângulo, aproximadamente equilátero, em que pode estimar-se cada um dos seus lados
de três léguas horárias de extensão: Albuquerque lhe fica na distância de mais
outra légua, para a parte do Nascente; e sendo as alheias Praças de que falamos,
as mais próximas da nossa raia, aonde já se não encontra a ramificação das Serras,
que desde Castelo de Vide vão terminar em Tagarrais; é de esperar que os nossos
vizinhos sempre que projectarem a invasão desta Província e recearem forçar as
montanhas, que ficam aquém do rio Sever, para se encostarem à margem meridional
do Tejo, não deixarão de escolher aqueles dois pontos fortes, para reunião das suas
Tropas, a fim de transporem os limites do seu País, por um terreno muito mais aberto
e unido, que lhe facilita as incursões da sua Cavalaria.
Nesta hipótese, devendo
considerar se Campo Maior, como um antemural da populosa Elvas, não deixará de ser
acometida nas primeiras hostilidades da Campanha, porque os inimigos na sua
conquista vêm a ganhar um grande apoio, de fácil comunicação com as ditas
Praças, que lhe assegura o seu estabelecimento no estranho território, e lhe pode
cobrir as operações do ataque contra a única Fortaleza que protege toda a Província.
Ora enquanto nós sustentarmos este primeiro posto, o seu auxílio não só poderá ser
muito útil ao nosso Exército, quando este se achar em força capaz de descer às
planícies, a disputar a devastação daqueles Povos, mas também favorecerá as
diversões ofensivas sobre a melhor parte da Estremadura Espanhola, logo que a Fortuna
desamparar as Armas inimigas, ou estas variarem o antigo plano de nos fazer a guerra.
Estas razões, que fazem sensível a
importância da nossa Praça, deram motivo a cuidar-se da sua reparação. O Oficial
engenheiro que depois interinamente a governou, e defendeu foi encarregado em Abril
de 1797 de remediar provisionalmente os danos, que o tempo havia causado no material
do seu recinto, adicionando-lhe aquelas correcções que julgasse necessárias, a fim
de o pôr ao abrigo de um golpe de mão. Infelizmente as circunstâncias
particulares do local em que está levantada esta Fortificação, e os erros
grosseiros do seu primitivo traçado, assaz restringem as vantagens que havemos
apontado, relativas à topografia geral daquela Província. Talvez porque esta
Praça conservava ainda em pé as suas muralhas, e havia resistido em 1712 a um sítio
informe e mal dirigido, durante o qual foi por três vezes socorrida, se julgava
muito maior a sua intrínseca força, porém a simples descrição dos seus defeitos
fará avaliar precisamente, a máxima resistência de que ela seria capaz.
Parece que só um engenho destituído
de todos os princípios da Arte, poderia escolher uma posição cercada por toda a
parte de um terreno montuoso, e sobranceiro, para erigir uma Praça bastante irregular,
composta de dez baluartes, um castelo e apenas cinco revelins por obras exteriores,
sem que alguma destas obras, se referisse as irregularidades da Campanha circunvizinha:
com efeito no ano de 1797 se não encontrava um só ponto sobre o terrapleno da linha
magistral, que não pudesse ser ferido do exterior, assim de frente, como de
enfiada, ou de revés: porque o parapeito dos baluartes, apesar de conservar em
alguns o ordinário perfil, não encobria o plano do reparo, dominado pelos
montes de mais alto novel, e o das cortinas (à excepção de três) simplesmente
era formado de um frágil muro de dois palmos e meio de grossura e quatro de
alto, que mal poderia cobrir em tempo de Sítio as Tropas que a guarneciam ou
por ali transitassem». In António Ventura, O Cerco de Campo Maior
em 1801, Edições Colibri, Centro de Estudos Documentais do Alentejo, 2001, ISBN
972-772-270-9.
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