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Os Filhos da Luz. Baviera,
1787
«(…) O assassino deixou alguma pista?, quebrou finalmente o silêncio
Steiner. Quer dizer, cabelos, um botão, um pedaço de roupa... Absolutamente
nada, respondeu o médico. Quase..., quase dá a impressão de que se preocupou em
apagar qualquer pista depois de matar e sodomizar o rapaz. Ou então era um
fantasma... Ora, vamos!, protestou o juiz quando ouviu as últimas palavras.
Tudo isso já é bastante complicado em si para que o senhor se dedique a brincar
com as palavras. Um fantasma, repetiu mentalmente Steiner. Definitivamente,
nada daquilo iria agradar a Koch.
Baviera, 1787
Mais de uma vez, mais de
duas, mais de uma centena, Koch tinha-se perguntado por que Lebendig e,
principalmente, a casa de Lebendig não lhe provocavam nenhuma sensação de
mal-estar. E isso apesar de que, sem nenhuma espécie de dúvida, nunca tinha
conhecido ninguém tão desorganizado quanto ele. Não, nem antes nem depois que
cruzara o seu caminho ele tinha tido a oportunidade de ver alguém semelhante.
Era curioso mas, para dizer a verdade, as suas vidas nunca teriam se cruzado se
não fosse por aquele padre bêbado. Sim, bendito padre bêbado. Tinha chegado
numa manhã, fazia nove anos, sufocado e furioso, afirmando que desejava
recuperar alguns papéis pessoais que andavam em poder de um tal Lebendig.
Durante alguns minutos, o polícia que o atendia o ouvira com enorme interesse,
quase com devoção, se fosse possível usar essa expressão de uma forma que não
soasse imprópria, mas não tinha demorado a perceber que aquele homem dizia
apenas incoerências e que nada indicava que tivesse sido objecto de algum acto punido
pela lei. Foi nesse momento que, alegando que o caso que lhe expunha requeria uma
pessoa mais importante, tinham-no encaminhado para ele.
Koch tinha precisado
apenas de dois minutos para compreender que o clérigo em questão se sentia
enormemente ofendido e que transpirava desejos de vingança por cada poro da
pele. O máximo que podia se perceber, no entanto, era que um sujeito chamado
Lebendig tinha dado dinheiro ao padre em troca de que escrevesse em alguns papéis.
Pensou imediatamente que devia se tratar de um analfabeto necessitado de um copista.
Havia-os, tanto uns quanto outros, aos montes em Ingolstadt.
Tratava-se de alguma
carta para a noiva ou a mãe?, perguntou Koch ao ébrio sacerdote. Não, respondeu
acalorado. Não, não, não. Ora essa! Ele me fazia escrever..., só isso. Ah, sim,
disse Koch respirando fundo, mas isso, padre, se me permite dizer, não é um
crime. O sacerdote passou os dedos pelo rosto como se quisesse arrancar alguma
coisa muito grave que tivesse ficado agarrada à sua pele. Calma, calma, é
que... Bem, primeiro, ele me fez escrever. Nada em especial. O que eu quisesse.
E eu escrevi. Eu escrevi! Modéstia à parte, posso dizer que desde meus tempos
de seminário poucas pessoas tiveram uma letra melhor do que a minha. E assim
era. Não ficaria bem eu negar isso... Koch concordou com a cabeça, enquanto se
perguntava mentalmente quanto tempo seria capaz de suportar aquela história.
Então ele me manteve escrevendo um tempinho. Não muito. Um tempinho. Um
tempinho, repetiu Koch, procurando lhe dar segurança. Mas depois começou a me
dar bebida, continuou o padre com uma mistura de arrependimento e raiva na voz.
À força?, perguntou Koch, embora tivesse consciência de que a pergunta era
totalmente desnecessária. À força? Bem, não..., não acho que se possa dizer que
ele tenha me forçado. Não, na verdade ele não fez isso mas...» In
César Vidal, O Crime dos Illuminati, 1958, tradução de António Borges, Relume
Dumará, Ediouro Publicações S.A., 2006, ISBN 857-316-6491-3.
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