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Templo de Jerusalém. Agosto, ano 70 d.C.
«(…)
Depressa!, incitou-o. Os alicerces
dos muros não resistirão por muito tempo. Correram através do pátio,
esquivando-se das diversas cabeças espalhadas pelo chão, flechas zunindo ao
redor. No final do percurso, escalaram os quinze degraus até chegar ao Portão
de Nicanor e atravessaram um segundo local aberto onde multidões de kohenim
faziam sacrifícios no grande Altar dos Holocaustos, com os trajes cobertos de
fuligem, e as vozes de lamentação, abafadas pela fúria da batalha: oh, Deus,
que nos rejeitaste e quebrastes as nossas defesas com a Tua ira, defende-nos! Tu,
que fizeste a terra tremer, tu que a rasgaste, repara as suas fendas, pois ela
vacila!
Eles atravessaram mais esse pátio e
subiram os doze degraus que conduziam ao Pórtico do Mishkan, cuja fachada
maciça se erguia acima deles como uma falésia, com cem cúbitos de altura e
ornamentado com uma magnífica vinha trabalhada com o mais puro ouro. Aí, Eleazar
parou, virou-se para o rapaz, agachando-se a ponto de seus olhos permanecerem
na mesma altura. Não posso prosseguir. Somente os kohenim e o Sumo Sacerdote podem entrar no santuário. E quanto a
mim? A voz do rapaz soava vacilante. A tua entrada foi autorizada neste momento
de extrema gravidade. Foi o Matias quem o disse. O Senhor compreenderá. Colocou
as mãos nos ombros do rapaz e apertou com força. Não tema, David, o seu coração
é puro. Nenhum mal lhe sucederá. Olhou fixamente nos olhos do rapaz e então,
levantando-se, empurrou-o em direcção à entrada, com os seus dois pilares de
prata e cortina bordada de seda nas cores vermelho, azul e roxo. Vai… E que Deus
te acompanhe!
O rapaz voltou os olhos para ele, uma
enorme silhueta diante do flamejante céu e, então, prosseguiu. Afastando a
cortina: caminhou pela sala sustentada por pilares cuja pavimentação era de
mármore polido, e o tecto, tão alto que se perdia nas sombras. O local era
agradável e silencioso, com uma doce e inebriante fragrância no ar. A batalha
parecia retroceder e desaparecer, como se estivesse ocorrendo num outro mundo. Shema
Yisrael, adonai elohenu, adonai ehud… sussurrou ele. Ouve, Ó Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único
Senhor. Ele parou por um momento, atemorizado, e depois, vagarosamente,
recomeçou a caminhar em direcção ao final da sala, os seus pés tocando
silenciosamente o mármore branco. Logo adiante, encontravam-se os objectos
sagrados do Templo, a mesa do Pão da Proposição, o altar do incenso, revestido
de ouro, a magnífica menorá de sete braços, e, mais à frente, um tremulante e
diáfano véu de seda, a entrada para o debir, o Santo dos Santos, onde nenhum homem
poderia pisar, salvo o Sumo Sacerdote, sozinho, e ele o fazia apenas uma vez
por ano, no Dia da Expiação.
Seja bem-vindo, David, disse uma voz.
Estava à tua espera. Matias, o Sumo Sacerdote, aproximou-se, saindo das
sombras, à esquerda do rapaz. Trajava uma veste azul-celeste presa com um
avental tecido em ouro e púrpura; uma fina tiara adornava-lhe a cabeça, e no
seu tórax encontrava-se o Ephod, o peitoral sagrado, com as suas doze
pedras preciosas, cada uma representando uma das doze tribos de Israel. O seu
rosto tinha muitas rugas, e a sua barba era branca. Enfim, encontramo-nos, filho
de Judá, disse ele com mansidão, aproximando-se do rapaz para olhá-lo
fixamente, acompanhado pelo suave tilintar dos doze minúsculos sinos costurados ao redor da bainha da túnica. O Eleazar,
o ourives, falou-me muito de ti e disse-me que eras o mais destemido entre
todos que defendem os lugares sagrados. E o mais valente. E o mais digno de
confiança. Como se o David de outrora tivesse regressado… Foi o que ele disse».
In Paul Sussman, O Último Segredo do Templo,
2005, Bertrand Editora, 2016, ISBN 978-972-253-056-9.
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