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«(…) Mas além desta fragmentação
transversal, os geógrafos têm assinalado uma outra, também evidente: é a que separa
a orla atlântica, Minho litoral, Beira Litoral, Estremadura, estuários do Tejo e
do Sado, do país interior, para lá dos montes, que inclui o Alentejo, separado do
mar por altas falésias. No seu estudo sobre Os Arados Portugueses, Jorge
Dias apresentou um mapa de distribuição dos tipos de arado que em seu parecer distingue
áreas culturais muito antigas. Toda a zona interior até ao Tejo, parte da Galiza
e de Leão, Alto Minho, Trás-os-Montes, Beira Alta e Beira Baixa foi arada com o
arado radial, que é o mais primitivo e o mais simples. O dente que
fura a terra, e a rabiça, por onde pega o lavrador, formam uma peça só:
uma simples pernada de árvore, com uma curvatura apropriada e um bico aparado,
pode servir ao efeito; acrescenta-se-lhe um pau comprido, o temão, para puxar
o instrumento. Este arado, leve e portátil, especialmente adaptado à cultura do
centeio. que é a das terras altas, já era conhecido dos Romanos e também de tribos
do Atlas marroquino. Jorge Dias chama-lhe o arado lusitano, admitindo que
o seu foco de irradiação seria a zona actualmente portuguesa da Lusitânia romana.
Diferentemente, em toda a zona ao
sul do Tejo, predomina o arado de garganta, muito mais complicado, pois supõe
a justaposição de várias peças. O dente é fixado, com cravos e argolas de ferro,
a um pau curvo, a garganta, que se prolonga na rabiça; na garganta fixa-se
a vara do temão. Este arado, difundido em várias regiões mediterrânicas, teria
vingado, antes das invasões romanas, na civilização ibérica, altamente evoluída,
de Tartessos, que teve o seu foco na Andaluzia e se espalhou por toda a Península,
excepto nalgumas zonas montanhosas na fronteira actual portuguesa ao norte do Tejo,
e nos Pirenéus. É o arado do trigo.
Finalmente, na zona litoral, de
Lisboa à Galiza, para cá dos montes, predomina o arado quadrangular, que
é o mais complicado. Ao pau do dente fixam-se peças a que se prende o temão, que
está também fixado à rabiça, ou ao par de rabiças (dispostas como o guiador de uma
bicicleta), formando o conjunto um paralelogramo; ao pau da rabiça fixam-se também
largas asas de madeira, as aivecas, para revirar a leiva da terra. Em alguns
casos funciona com rodas. É preciso para a cultura do milho, e chama-se-lhe o arado
suevo, porque se supõe que foi trazido com as invasões do Centro e do Norte
da Europa. Essa suposição não condiz com o que geralmente se sabe do papel dos
dos Germanos invasores, que constituíram normalmente uma casta militar, vivendo
das armas e da rapina das populações locais, nem em especial dos Suevos, povo de
guerreiros, caçadores e pastores, cujo breve domínio foi assinalado por constantes
guerras entre a população galega e os seus subjugadores. Este mapa, possivelmente
ainda sujeito a correcções, mostra, em primeiro lugar, que existiu um arado ibérico
tecnicamente superior ao dos Romanos e cronologicamente anterior à invasão destes,
mas que tal arado não chegou a implantar-se na zona montanhosa do Portugal
actual, onde existia um outro, mais arcaico, semelhante ao dos Romanos». In António
José Saraiva, A Cultura em Portugal, Teoria e História, Gradiva Publicações,
1994, 2007, ISBN 978-972-662-372-4.
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