quarta-feira, 17 de outubro de 2018

O Porto contra os Corsários. Amândio M. Barros. «… o Mediterrâneo, “O Levante” como genericamente o designam os documentos do século XV, desde cedo esteve nos seus horizontes, apesar de aí lhes caber apenas um papel de actores secundários»

Cortesia de wikipedia e jdact

[Nos finais da Idade Media o comércio marítimo tornara-se essencial para o desenvolvimento económico da cidade do Porto. Nesse tempo, a sua frota consolidara já uma série de rotas internacionais e os seus mercadores eram presença assídua em diversos portos europeus. Um dos problemas perturbadores desta actividade era o corso exercido sabre as suas embarcações levado a cabo por ingleses, franceses e castelhanos. Com base num documento de 1469, surpreendemos dinâmicas mercantis e, acima de tudo, a forma como as autoridades da cidade providenciavam a defesa da sua navegação contra os assaltos perpetrados por esses corsários].

«(…) Num esquema comercial baseado no intercâmbio de mercadorias, onde o frete de retorno desempenha um papel decisivo, importa insistir naquilo que os nossos mercadores tinham para oferecer: sob a designação genérica de aver-de-peso, os produtos tradicionais do sector primário português o sal o peixe, os couros e, também, de algum modo, o vinho. Serão estes artigos a garantir receitas essenciais para as compras no estrangeiro. O sal será objecto de procura desde muito cedo e tem venda certa nos mercados externos. Quanto ao vinho português, embora não possa concorrer com os grandes vinhos franceses, não deixa de ser exportado. Se bem que todos estes artigos tenham mercado garantido, eles são de baixo valor acrescentado. Por isso, os armadores foram obrigados a encontrar soluções dentro desta realidade, que lhes permitissem sobreviver em meios tão competitivos. Desde longa data começam a empenhar-se vigorosamente numa actividade transportadora que justifica e rentabiliza a existência, crescente, de navios. Vemo-los a fretar as suas naus, caravelas e barinéis em portos da Flandres ou da Galiza, a levar sal, pescado, têxteis ou armamento para diferentes paragens e a retornar com artigos para outros clientes. É em grande medida em função do transporte que os armadores do Porto vão alicerçar contactos que se revelarão extremamente frutuosos no futuro e envolver-se no mundo da finança e dos seguros, essencial para o desenvolvimento deste sector.
E, com isso, os portuenses acabam por conhecer e familiarizar-se com ambientes diversificados. Com o dinamismo do Noroeste europeu, fornecedor de matérias-primas, cereais, armas e manufacturas, abundantes nos portos e mercados hanseaticos e flamengos. A frequência com que para ai navegam e o volume de negócios que aí desenvolvem justifica a existência de uma feitoria em Bruges, ponto de apoio essencial para todos os mercadores do reino. No Sul, só mais tarde surgira um estabelecimento do género na Andaluzia. Por seu turno, o Mediterrâneo, O Levante como genericamente o designam os documentos do século XV, desde cedo esteve nos seus horizontes, apesar de aí lhes caber apenas um papel de actores secundários.
São todas estas circunstâncias a determinar a feição marítima da cidade. No século XV esta perfeitamente definido o seu modo de actuação onde a componente transportadora, ao frete, ganha particular relevância. Para isso era necessária uma frota mercante. Os documentos dizem-nos que ela era constituída por barcas (sobretudo no século XIV mas também na centúria seguinte), barinéis, caravelas e naus. Mas não nos dizem quantas unidades a compunham. De acordo com os números que pudemos determinar para os séculos XV e XVI é provável que não excedesse os vinte e cinco navios». In Amândio M. Barros, O Porto contra os Corsários, bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Revista da Faculdade de Letras, História, Porto, III Serie, 2000».

Cortesia da RevistadeLetras/JDACT