«(…) Osios e Weistaler entraram sem
cerimónias e colocaram-se em frente do padre. A casa estava na penumbra, mas conseguia-se
ver o chão de mármore coberto com tapetes valiosos. Nas paredes da entrada,
avistavam-se quadros que representavam padres e cardeais. Vista-se!, ordenou Osios.
Você vem connosco! Quem são vocês?, perguntou o padre atemorizado. Amigos, respondeu
Weistaler. Depois, acrescentou: faça aquilo que lhe dizemos e ninguém lhe fará
mal. O homem não se mexeu nem um centímetro, paralisado pelo medo. Parecia prestes
a ter uma crise respiratória. Tinha sido um estúpido ao abrir a porta, mesmo que
fosse só para espreitar.
Weistaler cruzou o olhar com Osios.
O grego retirou uma Luger, calibre .9 de fabrico jugoslavo, e apontou-a ao padre.
Dou-vos tudo o que quiserem, disse gaguejando, totalmente a leste sobre o motivo
da presença daqueles estranhos na sua casa. Não me façam mal. Pronunciou aquelas
palavras, sufocando um soluço. Osios aproximou-se dele e agarrou-o pelo braço. Venha
connosco e não lhe acontecerá nada de mal. O pânico fê-lo reagir de uma forma
intempestiva e o padre começou a mexer-se e a torcer-se. Deu safanões contra Weistaler,
porém, e apesar dos esforços, não se conseguiu libertar. Assim que percebeu que
não havia escapatória, fez aquilo que qualquer um, na sua situação, teria
feito: começou a gritar.
O barulho, em condições normais,
poderia ter produzido os efeitos esperados, fazendo acorrer algum vizinho, mas naquela
noite o edifício estava semideserto devido às festividades do fim de ano. Os
gritos não foram demasiado ruidosos nem demasiado insistentes. Cessaram quando
Weistaler colocou na boca do presidente da comissão um pano embebido numa
substância à base de clorofórmio. O padre perdeu os sentidos quase de imediato.
Osios e Weistaler agarraram-no e arrastaram-no pelas escadas abaixo. APiazza de
San Giovanni estava iluminada com a luz amarelada dos candeeiros, o que dava à neve,
que ainda caía, uma estranha cor de fotografia sépia.
Os dois atravessaram-na rapidamente
até aos degraus da catedral. A um observador inocente, a cena poderia parecer quase
normal: um bêbedo levado por duas pessoas. O facto estranho era, porém, a roupa
do bêbedo. Em vez de vestir um fato adequado a uma noite fria, sapatos e uma gabardina,
estava apenas vestido com um robe, um pijama e um par de pantufas.
A porta da catedral já tinha sido
aberta por Osios antes da chegada do colega. Depois de ter desactivado o
sistema de alarme, o grego deixou algumas ferramentas e um grande contentor de
alumínio junto à nave. Depois, encostou o batente para que, quando chegassem,
não fossem obrigados a perder tempo com a fechadura. Entraram pela escuridão a dentro
ajudados pelos dois visores de infravermelhos. A catedral de Turim era uma igreja
despojada. Weistaler já lá tinha ido várias vezes e a impressão com que ficara
era de uma sensação de pobreza. Estava a anos-luz do esplendor da catedral de Roma.
A nave central estava repleta de um
sem-fim de bancos em madeira enquanto as únicas obras de arte, se assim se podiam
chamar, eram algumas estátuas, posicionadas nas duas naves laterais, e catorze
pequenos quadros que representam as capelas da via-sacra. Weistaler e Osios
arrastaram o padre ao longo da nave central com a ajuda dos visores de infravermelhos.
Ao fundo, atrás do altar, entrevia-se o enorme mural da capela do Guarini, a primeira
casa do Sudário, ainda em restauro depois do último incêndio de 1997.
O Santo Sudário estava agora guardado
atrás de um vidro com dois dedos de espessura à esquerda da nave. A capela, com
as suas cortinas vermelhas, colunas e varandins de talha dourada que chegavam até
à abóbada, era a parte mais sumptuosa de toda a igreja». In GL Barone, Conspiração no
Vaticano, 2013, Casa das Letras, 2013, ISBN 978-972-462-197-5.
Cortesia de CdasLetras/JDACT